segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

SOBRE O CONCEITO DE “VANGUARDA”


Galvano Della Volpe - Professor universitário e filósofo italiano (1895 – 1968). Seu trabalho foi visto por muitos como uma alternativa ao marxismo gramsciano



Creio que o conceito (e o nome) de vanguarda, ou seja, de poética de vanguarda, não nos sirva a nós marxistas e não possa criar senão mal-entendidos e confusões, uma vez que se trata de um termo muito comprometido historicamente.



O que significa, efetivamente, poética vanguardista? Todas as vanguardas — nos seus programas ou manifestos -- tiveram em comum a atitude antiacadêmica, isto é, urna recusa de formas e técnicas artísticas tradicionais (fossem elas figurativas, musicais ou literárias) e portanto dos respectivos conteúdos retóricos: e até aqui temos o lado historicamente fecundo e positivo das vanguardas (daí os originais êxitos artísticos, especialmente nas artes figurativas: de Manet a Van Gogh, a Braque, a Picasso, etc.), mas o que aconteceu foi que a mutação dos conteúdos em relação à mutação das formas se transformou depois, aos poucos, em indiferença e abstração do conteúdo em geral, do objeto ou realidade, até chegar ao formalismo exasperado do informalismo (ou negação de todas as formas tradicionais): até às manchas pictóricas dos Pollock etc.

A razão está no fato de a verdadeira alma do vanguardismo ser a idolatria da forma-como-sensualidade-pura, que o conduziu, por fim, ao culto da matéria dos informalistas e tachistas: razão pela qual vanguardismo acabou por significar formalismo por excelência.

Compreende-se que isto comporta a intenção programática de jogar, por assim dizer, a sorte da arte unicamente no terreno (idealista) da subjetividade criadora e do individualismo exasperado: ou seja, da forma-fantasia (sensualidade). Não creio, por isso, que a vanguarda, mesmo nos seus aspectos melhores, se oponha à civilização capitalista (como sustenta De Micheli em Contemporâneo, de outubro-novembro de 1959), pois que, sendo estas em todas as suas manifestações exasperadamente individualista, a vanguarda é um legítimo produto dela, com o seu aspecto bom e o seu aspecto mau (este último bem confessado no grito de Picasso, de se ter reduzido, ele e os outros, a pintar apenas monstros, o que acentua a desumanidade do formalismo na medida em que ele tende exatamente a abstrair o mais possível dos conteúdos e portanto também dos valores humanos, sociais).

Em outros termos, as antíteses representadas pela vanguarda são sempre internas à cultura e civilização capitalista, individualista: familiar se não típica a costumeira entre o conformista-tradicionalista e o boêmio ou artista-anarquista. E o que há de mais romantica-mente individualista que a rebelião-evasão (exótica) de um Gauguin? O que há de mais historicamente burguês do que estas atitudes? Mas a pintura de Gauguin permanece, tal como a de Van Gogh e assim por diante, e permanecem ainda para serem utilizadas numa nova poética figurativa, realista, algumas de suas conquistas técnicas.

O sentido anti-renascentista do espaço pictórico; como já o apontam as obras do Picasso comunista, de Léger e do primeiro Pignon e de Guttuso. Mas -- concluindo -- a nós materialistas marxistas o termo e conceito de vanguarda já não nos pode mais servir em virtude dos muitos sentidos históricos e consequentes equívocos atuais que ele comporta (não sem razão Lukács chamou a atenção para as estreitas relações entre decadentismo e vanguardas: uma advertência que talvez De Micheli não tenha levado suficientemente em conta): e temos de substituí-lo -- na nossa luta por uma nova poética -- pelo de realismo socialista, ou seja, por uma poética que por princípio (já transparente na sua própria denominação) tem em mira evitar o formalismo e todos os desequilíbrios de forma e conteúdo, e portanto restaurar a plena humanidade da arte (que é sentido e razão), a plenitude da própria arte, e encorajar, por fim, a vocação para o clássico que é própria da obra de arte autêntica.

Assim, para fecharmos com a literatura, já nos damos conta da plenitude clássica de certa poesia democrática e socialista de Maiakovski e de Brecht, ilustrativa da poética do realismo socialista, surgida contra as vanguardas literárias (burguesas) que foram o naturalismo ou verismo, o simbolismo, o expressionismo, o surrealis-mo e o hermetismo.
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OBS. Frank Svensson: Válido também para a arquitetura?

Um comentário:

  1. Jag har ändrat så att man kan lägga in komentarer utan att var inloggad med Gmail.
    Kramar Roddan.

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