domingo, 31 de março de 2013

A TOTALIDADE


Edmilson Carvalho - Arquiteto de formação, trabalhou sempre em planejamento econômico, área em que se especializou na CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina). Teve destacada atuação na SUDENE, em Recife (1962 a 1973) e na Secretaria de Planejamento da Bahia. Professor de Economia Política e Teoria Política. Há cerca de 20 anos participa da Oposição Operária (Opop), grupo que edita a revista Germinal. De sua autoria neste blog: “Gramsci e a produção das categorias do conhecimento”, e “A cidade do capital”.


Uma das categorias mais fundamentais no processo de produção dialética do conhecimento é a totalidade. Num escrito elaborado na década de 1940, Lukács (1967, p. 240) assim a definia:

 A categoria de totalidade significa  ..., de um lado, que a realidade objetiva é um todo coerente em que cada elemento está, de uma maneira ou de outra, em relação com cada elemento e, de outro lado, que essas relações formam, na própria realidade objetiva, correlações concretas, conjuntos, unidades, ligados entre si de maneiras completamente diversas, mas sempre determinadas.1

A propósito, lembrava o próprio Lukács que Marx se referia a essa mesma categoria quando afirmou que as condições de produção de toda sociedade formam um todo. Apesar do desuso — cada vez maior, mais sistemático e crescentemente condicionado por motivos ideológicos — que filósofos, sociólogos, antropólogos, historiadores e até artistas fazem dessa categoria, mais cabalmente nos atuais tempos de descostura e dos pós-modernismos, nunca é demais lembrar e confirmar o estatuto ontognosiológico e o valor lógico intrínseco dessa importante categoria, sem a qual qualquer interpretação teórica do mundo fica reduzida a um amontoado incoerente, amorfo e desarticulado de fragmentos, do que não pode resultar qualquer processo de efetiva produção do conhecimento (LUKÁCS, 1967).2

Contudo, a categoria totalidade não pode ser compreendida, construída ou empregada sem que se tomem alguns cuidados filosóficos especiais, sob pena de não ser possível obter a apropriação, no decurso da análise, de nada mais do que uma aparência, dentre todas as demais, quando então, ao invés de contribuir para revelar o âmago concreto e explicativo da realidade, a categoria venha a se colocar como um obstáculo intransponível ao alcance do verdadeiro conhecimento dessa mesma realidade.3

Com efeito, para que a totalidade seja uma categoria dialética, para que possa estar em condições de oferecer a máxima eficácia científica que lhe é inerente, sua constituição passa, durante cada efetivo exercício da análise, por alguns procedimentos filosóficos que se apresentam como pressupostos imprescindíveis para o alcance do seu pleno e rico significado. Isto significa dizer que o todo pode não passar de mera aparência se for utilizado sem determinado trajeto filosófico de constituição. Este trajeto teórico (dialético) é o único procedimento capaz de proporcionar estatuto rigorosamente científico à referida categoria.

De início pode ser adiantado que, se determinado fato é um todo composto de partes, leis e relações conectadas entre si e em movimento, resulta que a desarticulação e a fragmentação desse todo operam nele uma amputação e eliminam a possibilidade de conhecê-lo como tal. O conhecimento de uma região do todo não é, ainda, conhecimento do todo, porque o conhecimento de partes isoladas do conjunto não é conhecimento nem das partes nem do conjunto. Em outras palavras, numa totalidade o conhecimento das partes e do todo pressupõe uma reciprocidade. Isto porque o que confere significado tanto ao todo quanto às diversas partes que o formam são determinações, dispostas em relações, que perpassam e completam a transversalidade do todo, de modo que não pode haver conhecimento de um todo ou de partes dele se, amputada a totalidade, isolados os seus elementos entre si e em relação com a totalidade e desconhecidas suas leis, não for possível captar a amplitude de determinações ontológicas das partes e da totalidade -- determinações que só podem ser apreendidas se a análise percorre a transversalidade essencial do todo.

Ademais, toda totalidade é formada de categorias e relações simples, entre as quais algumas mais fundamentais, que devem ser conhecidas e descortinadas para exatamente dar passagem à reconstituição abstrata do todo; o todo é, portanto, estruturado4  e hierarquizado e, sem que se tenha percorrido essa estrutura e essa hierarquia, no ato de sua constituição, a partir do que ela possui de essencial, a categoria permanece indeterminada e, por isso mesmo, indefinida -- o que conduziria a uma forma empirista de encarar (e apenas descrever) a realidade concreta (deve ficar claro que a estruturação teórica -- dialética -- da totalidade não é um atributo só do discurso, mas a representação conceituai que parte de uma objetivação que antecede o discurso porque já está na totalidade como real concreto). Como resultado, não se teria conhecimento, mas ideologia.

Para se conhecer a transversalidade conectiva do todo não se faz necessário -- nem é possível -- percorrer, como uma listagem, todas as inumeráveis partes, elementos, momentos e relações do todo, pois de que se trata é de conhecer a lógica que preside a sua conexão. Com efeito, a apreensão da conexão dialética essencial de uma totalidade pode ser descoberta mesmo antes de se ter alcançado o grau máximo de concretude da totalidade. É, com efeito, o que ocorre quando se procede à análise de uma dada totalidade por necessárias aproximações, de degrau em degrau, cobrindo, revelando e completando cada conceito, cada relação, cada conexão e cada categoria desde sua apreensão mais abstrata (e mais simples) à mais concreta (e mais complexa), no curso da qual análise a lógica essencial que preside a conexão do todo pode ser captada em algum estágio intermediário. O próprio Marx dá inúmeros exemplos da justeza dessa assertiva, que revela uma questão de método, e é esse o procedimento que ele emprega, em O Capital, na construção do próprio conceito de capital.5

Com efeito, o conceito de capital (entre outros) construído no Livro I de O Capital só serve para elucidar toda a análise teórica intermediária e que, num crescendo, vai atingir sua concretude máxima no Livro III, quando aquele conceito inicial deve dar lugar ao conceito de capital finalmente entendido no âmbito das determinações mais concretas -- de modo que os dois primeiros tornos não ultrapassam a análise do 'capital em geral', enquanto o terceiro supera esse limite, fazendo a passagem para a análise da 'pluralidade de capitais' e de suas inter-relações, ou seja, do capital que existe 'na realidade' (ROSDOLSKY, 2001, p. 69, grifo do autor).

Assim, nesse caso, que evidencia uma necessidade imanente do método (em Marx), a revelação parcial do conceito, de acordo com cada degrau alcançado, nunca é tomada como um conceito acabado e definitivo, senão no final da análise, quando a totalidade foi teórica e completamente alcançada. Aqui, sim, a totalidade e cada parte estão completadas e a exigência ontognosiológica se impõe: o conhecimento concreto das partes e do todo se pressupõem e aparecem em seu grau conectivo máximo. Porém, e isto deve ser destacado, o alcance da plenitude conectiva da totalidade, que se faz, no plano teórico, por aproximações dos aspectos mais simples e unilaterais aos mais concretos e completos, já revela, em determinados estágios da aproximação, o essencial do todo, de maneira que, a partir de certo ponto, as conexões internas do todo já podem ser percebidas. Isto também significa, corno já foi afirmado mais atrás, que o alcance da compreensão da lógica do todo não implica a consideração e o conhecimento extensivo de todos os seus fatos, momentos e relações, mas a compreensão da sua estrutura dialética, vale dizer, aquela essencialidade que, alcançada a meio caminho do conceito acabado, já caracteriza o todo. Para recorrer ao mesmo exemplo sugerido antes, o conceito de capital (que só se completa no Livro III, quando o capital em geral é situado na pluralidade dos capitais, portanto no âmbito da concorrência, etc.) já está essencialmente formulado quando, no Livro I, sua gênese já está compreendida: a valorização do valor mediante a reconversão da mais-valia.

Outra questão na análise da totalidade é a que se refere ao papel fundante e decisivo da contradição nas conexões da totalidade. É óbvio que nem todas as conexões que se espalham através de toda a transversalidade de uma dada totalidade são conexões de forças que se colocam em relação de contradição; mas, por outro lado, as conexões que implicam contradições ou antagonismos são as mais decisivas na definição do caráter e na eclosão de momentos de unidade e ruptura das totalidades em geral. É por demais sabido que o próprio modo de produção capitalista conecta, em um momento para o seu desenvolvimento, em outro, para a sua ruptura, duas categorias fundamentais: trabalho e capital no plano objetivo, proletariado e burguesia no plano de suas respectivas subjetividades. Essa contradição, presente no topo da totalidade abrangente modo de produção, também está presente na outra ponta - a da categoria mais simples (molecular), a mercadoria - desse modo de produção.

Também a mercadoria é uma totalidade e, como tal, encerra, em sua objetivação, por meio da produção capitalista, conexões de outras categorias que se revelam como relações de oposição, tais como: valor de uso e valor de troca, trabalho concreto e trabalho abstrato, salário e mais-valia, visibilidade e fetiche, etc. No caso da totalidade modo de produção capitalista, são incontáveis as conexões que encerram também incontáveis contradições, que se estendem e se multiplicam desde a imediata produção da mercadoria, passando por todos os processos (e totalidades) intermediários (troca, circulação simples, circulação do capital, etc.), até o momento mais amplo da concorrência e das crises do sistema. Tais contradições combinam-se para assegurar o desenvolvimento do capital; mas, em épocas de crise, quando explodem rompendo as respectivas unidades (combinação do salário com a mais-valia para a valorização do valor, etc.), podem-se manifestar revelando, tanto na teoria quanto na prática, o desacordo interno e imanente desse modo de produção, potência que se coloca como pressuposto objetivo da possibilidade de sua ruptura.

Em adendo, é exatamente a apreensão da lógica que preside as conexões da totalidade -- que constitui, portanto, a sua essência, sua lei --, e que está presente em toda a transversalidade conectiva do todo, que permite a possibilidade de conhecimento, portanto, também, de uma relativa predição do movimento do todo. Essa lógica, essa essência, perpassa o passado, o presente e também o futuro da totalidade em movi-mento. Ao lado do núcleo essencial de um todo, daquilo que constitui o seu leito remoto, encontra-se uma infinidade de acidentes, contingências e circunstâncias que também participam da totalidade e do seu movimento. Aqui existem duas ordens e dois ritmos de movimento: o do leito remoto e o dos acidentes -- o primeiro, lento, o segundo, muito mais rápido. A essência do movimento do todo é o que o unifica e que, portanto, articula as contingências, as circunstâncias e os acidentes ao todo. Enquanto o leito remoto do todo, aquilo que constitui a sua lei, sua lógica, sua necessidade, sua estrutura, permanece por um tempo maior, as circunstâncias, os acidentes e as contingências mudam, aparecem e desaparecem, muito rapidamente.

É exatamente esse leito remoto - que antecede e que sucede o estágio presente do movimento do todo - que confere a possibilidade do conhecimento e do reconhecimento do todo na sua constituição pretérita e de uma relativa possibilidade de conhecimento dos desdobramentos futuros (portanto também de predição) da totalidade. Quando uma crise cíclica do sistema do capital acontece, a sua constituição não se dá por força de elementos acidentais ou circunstanciais de uma dada conjuntura, mas por efeito de uma lei - a lei da queda tendencial da taxa de lucro, etc., etc. É pelo reconhecimento e pelo conhecimento dessa lei que se podem prever certos desdobramentos - sempre em certa medida -- essenciais da ordem do capital em crise. Fenômenos acidentais, circunstanciais, contingenciais podem até precipitar, num momento dado, um processo de crise de superprodução, mas jamais dar origem a esse tipo de crise. A análise da lei da crise garante previsões aproximadas de sua duração cíclica, da possibilidade de uma depressão ou de um crash, de uma certa dimensão do desemprego, da ruína e sucateamento de certos segmentos de capitais, etc. O grau de acerto em tal tipo de predição .vai depender da capacidade de apropriação do máximo de mediações existentes nas relações entre a lei e as circunstâncias presentes no processo de crise. 6

De todo o exposto, o problema consiste, pois, em saber quais são, em cada caso, as categorias e relações centrais que constituem a essência de uma totalidade (uma realidade concreta e complexa). Era exatamente o que Marx (1973, p. 20-21) tinha em mente quando escreveu estas palavras nos Grundrisse:

Quando consideramos um pais dado do ponto de vista econômico-político, começamos por sua população, a divisão desta em classes, a cidade, o campo, o mar, os diferentes ramos da produção, a exportação e a importação, a produção e o consumo anuais, os preços das mercadorias, etc. Parece justo começar pelo real e o concreto, pela verdadeira suposição; assim, por exemplo, na economia, pela população, que é a base e o sujeito do ato social da produção em seu conjunto. Contudo, se se examina com maior atenção, isto se revela [como 1 falso. A população é uma abstração se deixo de lado, por exemplo, as classes de que se compõe. Estas classes são, por sua vez, uma palavra oca se desconheço os elementos sobre os quais repousam, p. ex., o trabalho assalariado, o capital, etc. Estes últimos supõem a troca, a divisão do trabalho, os preços, etc. O capital, por exemplo, não é nada sem trabalho assalariado, sem valor, dinheiro, preços, etc. Se começasse, pois, pela população, teria uma representação caótica do conjunto e, precisando cada vez mais, chegaria analiticamente a conceitos cada vez mas simples.  Tendo chegado a este ponto, haveria que fazer a viagem de retomo, até chegar de novo à população, porém desta vez não teria uma representação caótica de um conjunto, senão uma rica totalidade com múltiplas determinações e relações.

Colocando a questão nos termos mais gerais dedutíveis do texto, pode-se dizer que Marx se refere, como ele próprio enuncia, à abordagem de um país dado do ponto de vista econômico-político; por outro lado, é óbvio que o procedimento se enquadra perfeitamente na conceituação do modo de produção capitalista, que é, de resto, o que ele de fato tinha em mente quando tentava, com essas notas (o método da economia política), encontrar caminhos de acesso a tal conceituação. O autor levaria tal empreendimento a efeito na obra O Capital, para cuja elaboração os Grundrisse constituíram parte essencial dos estudos preliminares.

Num caso, o teórico -- conceituação de modo de produção capitalista --, ou no outro, o empírico -- o estudo de um determinado pais, etc. --, não é pela população que a investigação deve começar, mas pelas determinações mais simples, constitutivas e fundantes dessa totalidade. Marx argumenta que não se pode ceder à tentação, como de fato acontecia com a economia política nascente, de começar pela população, porque começar a análise por tal ponto de partida levaria o analista a incorrer no erro de tomá-la por um todo homogêneo, indiferenciado, não-estruturado, ilógico, procedimento que o conduziria a erros cumulativos em toda a investigação subsequente. É óbvio que se poderia aduzir que a divisão da população em classes poderia ser feita depois; todavia, Marx argumenta com perspicácia que o correto e fecundo para a análise -- do dado país ou do modo de produção capitalista, que são duas totalidades em si mesmas -- seria tomar a população tal como de fato ela é, vale dizer, em sua estrutura não apenas natural, mas em suas determinações sociais; em suma, na sua constituição em classes sociais.

Se a questão deve ser posta nesses termos, uma tentativa de caracterizar a população -- e agora não mais tão-somente a população, mas a própria formação social capitalista como um todo -- passa por um estágio que deve anteceder à sua abordagem especifica e direta, e a questão passa a ser exatamente o problema posto em seus termos mais ge-rais: o de saber por quais categorias simples e fundantes se deve começar para alcançar uma dada realidade (totalidade) concreta. Assim, muito antes de se chegar à população ou ao conceito de modo de produção (o capitalista, no caso), o itinerário está cheio de paradas obrigatórias que vão desaguar não só na população (dividida e formada por classes sociais) como na totalidade que a contém e a reproduz em sua especificidade histórica. Trata-se, portanto, de cindir (não, obviamente, como se faz com o método cartesiano) o objeto até chegar a seus elementos mais simples e centrais -- noções, conceitos, categorias, leis e relações. Por exemplo: a mercadoria e, dentro dela, trabalho, valor, mais-valia, etc., são os elementos simples decisivos, sem os quais, todavia, sem viagem de retomo jamais o analista lograria caracterizar o todo (população, sociedade, etc.) como uma síntese verdadeiramente dialética. Só desta maneira a categoria totalidade estará pronta e apta para uso científico e, naturalmente, para as exigências da práxis social,7  porque só desta forma pode-se evitar uma visão caótica do todo, o que só é possível se se descobre as relações, leis e categorias-chave -- e, como pressuposto, uma hierarquia de determinações, em processo, entre elas -- capazes de dar acesso científico ao entendimento da população e do todo social como uma totalidade una e articulada, embora contraditória em sua essência. De resto, esta articulação, que se desencadeia por todo o edifício social numa movimentação que não é funcional, linear, mecânica, natural, mas dialética, tem em alguns pon-tos nodais suas principais determinações.

Quando a totalidade está assim posta ou reposta, ficam devidamente ressaltados alguns de seus traços constitutivos universais: em primeiro lugar, ela aparece como uma rede de relações, as fundantes e as demais, a partir de uma determinada centralidade; em segundo, ela simultaneamente aparece como uma unidade concreta das contradições que se chocam no seu interior e que exatamente expressam seu conteúdo e seu movimento; em terceiro, fica evidenciado o fato de que qualquer totalidade contém totalidades a ela subordinadas -- totalidades internas e inferiores -- e está contida em totalidades mais abrangentes, mais complexas e situadas numa escala superior; em quarto, e por último, fica também evidenciado o caráter histórico, portanto transitório, da totalidade, de qualquer totalidade dada. Nisso reside, finalmente, a categoria totalidade do ponto de vista da dialética materialista. É essa categoria que o método de Marx revela: uma totalidade jamais idealizada, porque esse método não finge que constrói o conhecimento, como fazem as grandes formulações idealistas, por meio de um seriado de associações de ideias total ou parcialmente arbitrárias -- porque descoladas dos aspectos decisivos do real concreto, em cuja transformação o sujeito que a pensa age direta e ativamente.

Mas, por onde se deve abordar analiticamente determinada totalidade? Esta é uma questão da maior importância para todos os que realizam investigações de caráter científico, mormente quando se trata da análise de totalidades sociais. No que se refere à questão, Karel Kosik (1976, p. 31) tem a seguinte opinião:

Aquilo de onde a ciência inicia a própria exposição já é resultado de uma investigação e de uma apropriação crítico-científica da matéria. O início da exposição já é um início mediato, que contém em embrião a estrutura de toda a obra. Todavia, aquilo que pode, ou melhor, deve constituir o início da exposição, isto é, do desenvolvimento científico (exegese) da problemática ainda não é conhecido, no início da investigação. O início da exposição e o início da investigação são coisas diferentes. O início da investigação é casual e arbitrário, ao passo que o início da exposição é necessário.

E, mais adiante, na mesma obra, ele conclui:

O Capital, de Marx, começa ... com a análise da mercadoria. Mas, como a mercadoria é uma célula da sociedade capitalista, como é o início abstrato cujo desenvolvimento reproduz a estrutura interna da sociedade capitalista, tal início da interpretação do resultado de uma investigação, o resultado da apropriação científica da matéria. Para a sociedade capitalista a mercadoria é a realidade absoluta, visto que ela é a unidade de todas as determinações, o embrião de todas as contradições .... Todas as determinações ulteriores constituem mais ricas definições ou concretizações deste ‘absoluto’ da sociedade capitalista .... Na investigação o início é arbitrário... (KOSIK, 1976, p. 31)

Já da afirmação feita pelo mesmo Kosik (1976), de que a mercadoria é a realidade absoluta da sociedade capitalista, e, complementarmente, de que todas as determinações ulteriores constituem mais ricas definições ou concretizações deste 'absoluto' da sociedade capitalista, pode-se deduzir que a assertiva de Kosik acerca da casualidade da investigação científica de uma totalidade deve ser relativizada.

Toda totalidade tem suas categorias-resumo, suas unidades de todas as determinações, categorias mais densas e que, por isso mesmo, devem ser colocadas como chaves da própria investigação e não só da exposição. Em tese, toda absoluta primeira investigação tem, de fato, algo de arbitrário, mas é preciso dar-se conta de que toda verdadeira investigação científica não constitui nem um ato nem um inicio isolado e absoluto: antes é também um processo social e histórico de produção do conhecimento, ou seja, quase nunca é uma investigação totalmente nova e sem antecedentes que legaram patamares e pontos de partida criticamente abordáveis -- com continuidades e rupturas. Assim, à medida que a própria investigação avança -- e que, portanto, as descobertas de categorias sucessivas vão sendo feitas --, as categorias-chave vão aparecendo, revelando as suas potencialidades no sentido atrás apontado e vão dando ordem à investigação à medida que vão revelando o caráter totalizante que possuem, de tal maneira que, depois de certo desenvolvimento da própria investigação, a casualidade vai sendo substituída pela necessidade no mesmo passo em que vão avançando, sucessivamente, as novas conexões entre categorias. -- Tal fato, se é verdadeiro para a continuidade de uma mesma investigação, passa a ser mais verdadeiro ainda para investigações futuras iniciais, nas quais aquelas categorias tomam-se pontos de partida necessários para os novos esforços e seus respectivos avanços.

Seria, de fato, um contrassenso e uma concessão ao empirismo manter uma investigação em eterno compasso de casualidade e arbitrariedade, não só depois da descoberta das categorias-chave dentro de um mesmo processo de investigação como entre vários e sucessivos processos de investigação posteriormente iniciados, nos quais aquelas mesmas categorias podem e devem ocupar destaque gnosiológico e lógico -- da mesma forma como seria um contrassenso (uma atitude dogmática) não considerar tais categorias passíveis de crítica e, portanto, de possíveis revisões de alcance variável.
A considerar como legítima a assertiva absoluta de Kosik de que todo processo de investigação é necessariamente casual - e não só, como pensamos, apenas os processos absolutamente pioneiros e iniciais de investigação e, assim mesmo, não de maneira absoluta --, imputa-se à investigação, vista como um processo que une esforços de várias procedências e, inclusive, de várias gerações, uma circularidade que se estaria reproduzindo quase sempre do mesmo ponto de partida. No conjunto do processo histórico geral de produção do conhecimento, esses inícios absolutos das investigações constituem a exceção, não a regra. Cada todo exposto constitui, a nosso ver, uma sequência de categorias dispostas que deve ser tomada como um ponto de partida necessário a cada nova investigação. E nem é por mero acaso que Marx, no texto que temos diante de nossa vista, insiste em dois métodos de estudo, não só de exposição, da economia política: aquele que ele atribui à nascente economia (que, a seu juízo, constitui o método falso), e o outro que ele reivindica como o certo, o que parte das categorias simples que constituem chave para o êxito do processo de totalização teórica.

A longo prazo, no plano do desenvolvimento histórico de toda e qualquer ordem de investigação rigorosamente científica, toda investigação tende a coincidir numa mesma ordem categorial, até mesmo quando a análise revela a necessidade de ultrapassagem, parcial ou total, desta ou daquela categoria ou mesmo de eventuais conjuntos de categorias. Destarte, podemos concluir que toda totalidade possui suas categorias-chave e que, no processo de investigação de cada uma delas, devem-se tomar categorias já comprovadamente eficazes para resultados rigorosamente científicos ou, em se tratando da primeira vez e do primeiro esforço de teorização/investigação, devem-se pinçar as categorias-chave à testa da análise tão logo sejam descobertas e identificadas como tais.

 Desta forma, o empirismo vai sendo ultrapassado no próprio curso da investigação, à medida que a necessidade vai ultrapassando, nela e com ela, a casualidade aludida. Deve-se notar, de resto, que, no texto aqui analisado, Marx já está definitivamente rompido, distante e diferenciado de Hegel, no que diz respeito às relações entre o ser e o pensamento: o pensamento agora não sai em busca de ideias em si mesmas, mas de ideias (noções, categorias, conceitos, leis, etc.) que são capazes de expressar o mecanismo central de constituição e articulação do real concreto, a essência desse real concreto. Já as duas buscas mais fundamentais estão aqui combinadas numa mesma perspectiva, num mesmo movimento: a dos elementos simples e decisivos do concreto e a do uso abstrato do conceito, dois dos pilares centrais do método dialético de Marx. Cai por terra o princípio hegeliano de que é na ideia que reside esse mecanismo e seu impulso primário. A inversão gnosiológica -- que está inteiramente montada sobre rigorosos fundamentos ontológicos -- está definitivamente feita (HEGEL, 1968).            O método dialético e materialista já está posto e, embora não totalmente desenvolvido, na sua idade maior -- e, para concluir, já está colocada, no plano teórico, a questão proposta, a do início da abordagem analítica de determinada totalidade.


N o t a s :

1 - Mais adiante será visto por que a afirmação de Lukács de que as relações objetivas são sempre determinadas não implica - ou não expressa - um determinismo objetivo (absoluto) no qual o elemento subjetivo não esteja presente com sua eficácia específica.

2 - A propósito do impacto altamente negativo causado pelo abandono dessa categoria dialética nos domínios de importantes segmentos da historiografia contemporânea, consultar a obra de François Dosse (1994).

3 - Alguns autores e algumas concepções, notadamente no âmbito da sociologia e fora da esfera teórica do marxismo, empregam o conceito de todo ou totalidade sem a observância dos pressupostos de que se fala mais acima, A propósito, escreve Kosik:  ... a categoria da totalidade atingiu no século XX uma ressonância e notoriedade, mas ao mesmo tempo se viu continuamente exposta ao perigo de ser entendida unilateralmente ou de se transformar no seu oposto, isto é, de deixar de ser um conceito dialético. O sentido principal das modificações introduzidas no conceito de totalidade durante os últimos decênios foi a sua redução a uma exigência metodológica e a uma regra metodológica na investigação da realidade. Esta degeneração do conceito resultava em duas banalidades: que tudo está em conexão com tudo, e que o todo é mais do que as partes. (KOS1K, 1976, p. 34)

4 - Corno se verá em todo este escrito, o termo estrutura não comporta qualquer identificação com o significado que recebe em tendências ou escolas que, ao atribuir uma conotação de determinismo absoluto ou da mais completa ausência da ação social ao conceito, na verdade não fazem mais do que proceder a uma inaceitável hipóstase deste.

5 - A esse respeito, o leitor pode consultar o excelente livro de Roman Rosdolsky (2001), Gênese e estrutura de O Capital de Karl Marx, nomeadamente o Apêndice II.

6 - A dificuldade de captar todo um conjunto representativo de mediações num dado processo social sempre foi um grande obstáculo às predições de movimentos, ora para mais, ora para menos, mesmo por parte de leitores de conjunturas em perspectiva do porte de Marx, Engels, Lenin e Trotski. A análise desse tipo de dificuldade a saber: a questão do tratamento que deve ser dado às mediações nas análises e predições, pelo método marxista, das análises de conjunturas — será abordada em capítulo próprio neste mesmo estudo.

7 - Esta afirmação não supõe, como já foi visto em capítulo anterior, que a elaboração dessas categorias seja um ato que anteceda ou que esteja acima ou fora da práxis social, como uma postura meramente contemplativa — no estilo platônico, por exemplo — da produção do conhecimento, mas, ao contrário, simultaneamente nela e com ela. Nos termos de marxismo não existe coisa mais estranha ou inútil do que um pensamento que elabora distante de uma inserção prática no ato de transformação da realidade que é, simultaneamente, compreendida para ser transformada e transformada para ser continuamente compreendida. 

sábado, 30 de março de 2013

PARA ARQUITETOS DÁ O QUE PENSAR ...


Síria




Pelo menos 12 estudantes morreram e outros ficaram feridos nesta quinta-feira (28) devido a explosões de várias bombas contra a sede da Faculdade de Arquitetura em Damasco, informou a agência de notícias oficial síria Sana. As forças do governo atribuíram o ataque a grupos "terroristas", termo com o qual se refere às forças de oposição financiadas por países ocidentais e monarquias árabes, que ocupam parte do país e lutam para derrubar o regime do presidente Bashar al Assad e submeter a Síria ao imperialismo e ao sionismo.

Segundo a agência, dois projéteis caíram sobre a cafeteria do edifício, causando também grandes danos materiais. Nenhum grupo assumiu a autoria do ataque, que ocorreu dois dias depois dos rebeldes terem lançado uma barragem de morteiros contra Damasco, que terminou com a morte de pelo menos três pessoas e feriu dezenas.

A emissora estatal Al-Ikhbariya mostrou imagens de mesas e cadeiras plásticas reviradas, vidro quebrado e livros e canetas espalhados pelo chão. Poças de sangue eram vistas no chão da cantina, além de um grande buraco no teto que cobria a cafeteria.

A Sana acrescentou que outros dois homens foram mortos por disparos de terroristas a um microônibus que passava em frente a um complexo residencial da polícia na região de Yaidat Artuz, situada na periferia da capital.

O grupo Observatório Sírio pelos Direitos Humanos, sediado em Londres e financiado por países ocidentais, confirmou o ataque e informou que vários dos feridos estão em estado grave.

Pelo menos 70 mil pessoas morreram nos dois anos de agressão à Síria, de acordo com o mais recente boletim da ONU - que nada faz para impedir a presença de mercenários estrangeiros financiados pelos EUA, Israel, Inglaterra, Qatar e Arábia Saudita. Os mercenários terroristas, por sua vez, começam a entrar em confronto com forças do governo nas regiões Leste e Sul da capital.

I

quinta-feira, 28 de março de 2013

ROMANTISMO E REALISMO.



Gunnar Gunnnrsson. (1889 – 1975) Pensador marxista sueco. Entre suas principais obras encontram-se Os grandes utopistas; A Comuna de Paris; Gyõrgy Lukács; De Machiavelli a Mao; O ideário da social-democracia; Estética marxista. e História do fascismo.

Tradução: Frank Svensson


Se não te sentes suficienterninte forte para fundir, na chama da tua genialidade, as duas formas de criar, tens de te posicionar abertamente em favor de uma delas para alcançar aquela unidade que a vida impõe como condição.
Honoré de Balzac

A época da poesia burguesa é ... a época do "fetichismo da mercadoria" ou "da arte pela arte", dada a falsa situação do poeta burguês como produtor para um mercado, uma situação imposta pelo desenvolvimento da sociedade burguesa.
Cristopher Caldwell


O que é o romantismo?

O realismo, em sua fase moderna, burguesa, surgiu e desenvolveu-se em contradição com o grande movimento romântico do inicio do século passado. Qual o papel do romantismo nesse processo? Foi negativa a sua função? Ou conteve elementos positivos? A resposta a essas perguntas pressupõe uma análise do romantismo em sua totalidade, uma análise tanto mais difícil pelo fato de o romantismo -- esse movimento cultural extremamente diversificado, amplamente ramificado e cheio de duplo sentido -- estar no centro tanto do debate teórico-literário como do debate estético, desempenhando, ainda, um importante papel na práxis dos escritores modernos. O romantismo ainda é capaz de despertar apaixonados engajamentos e apaixonados distanciamentos. No campo do marxismo, tanto clássicos -- como Marx e Engels -- corno seguidores seus, Mehring, Plekbanov, Lukács, Rue e outros, puseram o romantismo em debate. 1

A posição dos mesmos é predominantemente critica. Encontram-se em concordância com a critica burguesa do romantismo surgida na França, na Itália e nos países anglo-saxônicos e apresentada por pensadores tão dispares como o neo-tomista Jacques Maritain e o liberal Benedetto Croce, e que do outro lado do Atlântico tiveram defensores em Babbit e P. E. Moore.2

Uma critica de caráter principalmente ideológica, em parte urna crítica de direita e, da parte de marxistas, uma critica de esquerda. Às vezes por demais unilateral, mas com o método materialista do marxismo, é possível obter uma avaliação mais variada. Tentaremos, a seguir, indicar as principais linhas segundo as quais, no nosso entender, a crítica do romantismo deve ser desenvolvida. O meio do qual emerge o romantismo é caracterizado pelas grandes mudanças econômicas e sociais que se seguiram à revolução francesa e às guerras napoleônicas, tanto na própria França corno na Europa Central e na Inglaterra, como resultado da guerra civil e da gloriosa revolução. O desenvolvimento capitalista entrava em sua fase de alta industrialização. Confirmava-se, como havia dito Hegel, o domínio da prosa.3

O romantismo é um protesto contra o enfeamento provocado pelo capitalismo industrial, contra a mecanização e banalização da vida. Os irmãos Échnond e Jules Goncourt registram em seu diário urna curioso desabafo que Théophile Gautier, por ocasião da inauguração de uma ferrovia na Argélia, indignado com a civilização e seus engenheiros que estragam a paisagem com a sua técnica, fez a Claudin:
 
Você é quem gosta disso ... você é quem é civilizado. Mas nós, nós três, com mais uns quatro, cinco outros, nós somos uns doentios, decadentes ... não, antes uns primitivos, não outra vez não, nós somos simplesmente umas pessoas comuns, esquisitas, indefinidas, algo excitadas. Claudin, há momentos em que desejaria trucidar tudo o que há: os guardas-civis, os equivocados intelectuais, os guardiães de toda ordem, enfim toda a pocilga ... Tu entendes, eu falo sem ironia, eu te invejo, tu é quem estás no caminho certo. Isso depende exclusivamente do fato de tu não teres o gosto pelo exótico, ao contrário de nós outros. Tens alguma sensibilidade para com o exótico? Não, não vês ... Nós não somos franceses, nós pertencemos a outras raças. Nós desejamos ardentemente outras direções. E quando ao desejo de terra estranha se acrescenta o desejo de outro tempo, como por exemplo o século XVI ... como o meu desejo pela Veneza de Casanova, com uma esticada ate Chipre, atinjo o auge, a medida se ... Venha visitar-me uma noite. Falaremos mais a fundo longamente. Sentar-nos-emos os três, um após outro, qual .16 no monte de estrume entre seus amigos ... 4

Trata-se de um testemunho quanto ao romântico sentido de vida, tardio, mas com seus ingredientes essenciais. Aí está o exotismo que levou Chateaubriand a transferir o cenário das novelas de Atala para a Florida e para as montanhas de Alleghenies. Prosper Mérimée a levar os seus leitores a tempos pretéritos e lugares longínquos -- à França das guerras religiosas em A noite de São Bartolomeu, à Córsega em Matteo Falcone e em Colomba, à Espanha em Carmen -- e Novalis, em Heinrich von Ofterdingen, a buscar o auge do romântico em terras do Oriente. Aí está essa nebulosa nostalgia, esse desejo ardente pelo irreal que, na literatura romântica, aparece mais nitidamente talvez no primeiro romance de Achim von Armin, Holins Liebeleben, que fez Novalis condenar o Willhelm Meister de Goethe pelo fato de ele só tratar de coisas humanas comuns, não considerando a natureza e o misticismo, e que o motivou a declarar:

Romancear implica em atribuir um elevado sentido às coisas corriqueiras, em dar uma aparência misteriosa ao comum, em tomar conhecida a dignidade do indigno, a finita aparência do infinito,5

Existe também uma atração pelo passado, pelo histórico, que fez principalmente os românticos alemães sonharem com a Idade Média e garantirem ao romance histórico e ao drama histórico uma posição central na literatura romântica.

O escritor romântico protesta contra a prosa fugindo à realidade. Foge no espaço: da sociedade burguesa para países e povos exóticos, primitivos, subdesenvolvidos; e no tempo: do presente para o passado. O interesse por grupos étnicos estranhos e por épocas pretéritas não precisa ser, em si, algo reacionário. A fuga do real, por parte do romântico, não produz só frutos amargos. Sem dúvida o posicionamento romântico face à vida abriu caminho ao desejo de conhecer povos estranhos. O estimulo maior nesse sentido foram os empreendimentos de colonização dos estados capitalistas no além-mar. Mas a função ideológica essencial da alienação resultante do exotismo romântico situava-se noutro plano. Em seu artigo O cristianismo ou a Europa, Friedrich Novalis procura integrar o Oriente na construção da História Universal. Curiosamente, ele descobre então que os povos longínquos conseguiram uma feliz síntese de todas as contradições que estraçalhavam a Europa. Na índia, as contradições de nossa despedaçada civilização teriam, assim, formado uma unidade harmônica.6

Não é difícil perceber que Novalis transfere uma problemática típica do capitalismo europeu-ocidental -- que emerge da contradição para ele atual entre o classicismo e o romantismo -- para um ambiente estranho aos motivos econômicos, sociais e culturais dessa problemática. O exotismo oriental serve para não se dar conta das crescentes contradições internas da sociedade burguesa, às quais fogem na prática os românticos.

O sentido histórico do romantismo é muito superestimado. O mais típico escritor romântico, Raumer, que através da sua obra sobre os Hohenstafers, exerceu uma influência pouco feliz sobre a literatura, é um expoente típico da previsão apologética da história, que atravessa corno uma linha vermelha a moderna maneira burguesa de escrever história.7

Karl Friedrich, amigo de Marx, observou que Raumer representa uma forma de apologética do estabelecido que poderia ser chamada de objetividade aparente. Consiste em colocar fora de jogo a dialética característica do desenvolvimento histórico, ou seja, a dinâmica de contradições que impulsiona o desenvolvimento:

Raumer é avesso a contradições, nada deve ser ou frio ou quente, ou peixe ou carne, ou branco ou preto. Se fosse ele o criador do mundo o teria pintado de cinza para ser plenamente neutro e para não fazer injustiça a ninguém, o teria povoado com anfíbios ou ermafroditas.8

A formula do pensamento de Raumer é a de tanto -- quanto:

Nada é tão grande ou tão pequeno, tão antigo ou tão novo que não possa ser dividido ou acrescentado com essa faca de dois gumes: se bem que -- no entanto, em todo caso -- assim como, por um lado -- por outro lado. É evidente que desse jeito qualquer opinião histórica torna-se inviável.9

O historicismo romântico implicou num retrocesso em relação a Hegel. Seu país de origem é a Alemanha, e sua função ideológica foi a de constituir um freio às ideias da revolução francesa. Na realidade foi uma pedra de tropeço à grande revolução burguesa, com cuja ajuda se pode distinguir entre os seus aspectos positivos e negativos. Para alguns, o romantismo significou a restauração dos ideais da Idade Média -- ligando-se socialmente à hierarquia de classes, com igreja, nobres e cavalaria, e artisticamente ao gótico.

Homens como Friedrich Schlegel e Johan Joseph von Gõrres defendiam um embelezamento da reacionária Santa-Aliança, que após a queda de Napoleão dominou a Europa (na velhice, Schlegel se tornou tão exageradamente papal que até o seu escritor preferido, Dante, lhe parecia por demais gobelino). O irmão Wilhelm via a Idade Média de forma mais sensata, enquanto que Tieck a considerava antes de tudo a idade poética. Com relação ao renascimento gótico, o livro de Wackenroder As confidências de uni irmão de claustro teve um papel importante.10

Wackenroder quis reabilitar a arte gótica em relação à renascentista. Uma reabilitação é sob muitos aspectos, justificada e ocorreu em tempos modernos sobre bases mais sólidas, mas os pontos de partida ideológicos de Wackenroder não servem para uma reabilitação objetiva. A função que procura atribuir a Albrecht Dürer é no mínimo duvidosa. Wackenroder homenageia Dürer como o criador de uma arte nacional própria da Alemanha, mas, curiosamente, iguala-o também a Rafael.11

Em seu empenho pelo gótico, Wackenroder procura excluir os traços renascentistas da arte de Dürer que motivaram posteriores pesquisadores de enfoque nacionalista a falarem do italianismo de Dürer e opô-lo polemicamente a Mathias Grünewald como o verdadeiro artista alemão. O romantismo foi capaz, ainda, de incluir algo inverso da reação de roupagem gótica. O protesto polêmico do romantismo ao capitalismo industrial não se expressou somente em O rei de Tule e sua policia mas também no democratismo revolucionário inspirado na revolução francesa. O desenvolvimento capitalista especializou os tesouros espirituais dos homens e dissolveu as relações orgânicas entre eles. Rompeu-se a harmonia entre razão e sentimento Psique, que advinhar deseja o mistério de tudo não e mais a Psique que tudo fruia, canta Atterbo.12

E é certo. A Psique que queria advinhar o mistério de tudo, que principalmente queria saber e não sentir, não e mais a Psique da fruição despreocupada. O sonho da pessoa harmônica do renascimento e do neoclassicismo é brutalmente despedaçado pelo capitalismo. Entrementes, começa a crescer, porém, a autoconsciência do proletariado e, com o surgimento dos primeiros sistemas socialistas utópicos -- Saint-Simon, Owens e Fourier --, a possibilidade de na realidade prática superar o capitalismo e suas niveladoras consequências. É por isso que o tédio social do romantismo não só é visto como um anseio reacionário de voltar ao passado, ao patriarcalismo, a formas moralmente mais válidas de vida, mas também como algo mais ou menos revolucionariamente utópico. É contra tal pano de fundo do contexto social que tem de ser visto o romantismo. Em que medida ele viria a ganhar um caráter mais reacionário ou mais revolucionário, dependeria das condições do desenvolvimento de cada pais.

Na Alemanha, onde o capitalismo, ainda no inicio dos anos 1800, era pouco desenvolvido e onde a Prússia, entre os muitos principados territoriais absolutistas e tirânicos, após a queda de Napoleão começou a tocar o primeiro-violino, o romantismo ganhou o caráter de urna reação cristã-feudal, militarmente sustentada contra as idéias da revolução francesa. Os alemães fizeram a sua revolução no mundo das idéias -- Kant, Hegel, Lessing, Goethe, Schiller, Hôlderlin --, mas recuaram ante a real revolução. A guerra de libertação teve, na expressão de Marx, o caráter de urna regeneração equiparável com reação.13

Sob a pressão das guerras napoleônicas os românticos alemães se desenvolveram num sentido mais reacionário. Uma parte dos românticos aprovaram desde o início a revolução francesa, mas fizeram-se depois interpretes da vontade do povo alemão de se libertar de Napoleão. Como não havia uma classe burguesa alemã fortemente autoconsciente, o sentimento nacional alemão desde o inicio esteve poluído de elementos reacionários. Achim von Arnim, que veementemente polemizou contra a revolução francesa e seus ideais, reunia consciência de classe apoiada em militarismo com anti-semitismo.

O principal representante da visão de mundo romântica, Adam Müller, combateu decisivamente todas as reformas sociais liberais e comportava-se como o defensor par preférence da economia feudal prussiana. O jornal Die Abendblâtter -- porta-voz de Müller, Arnim e Kleist -- era o órgão dos militares prussianos contra o chanceler Hardenberg fortemente influenciado pelas ideias da revolução e de Adam Smith. A falta de perspectiva baseada na miséria alemã era o motivo último por que a apatia para com o reinante não levou a outra coisa senão a encobrir os trapos da miséria com os cortinados góticos, católico-místicos e irracionalistas. Nem mesmo a poesia e a música romântica tiveram outra função.

Liebe denkt in süssen Tõnen, Denn Gedanken stelien zu fern, Num in Tõnen mag sie gern Alies was sie will verschõnen, 14

anuncia uma das mais conhecidas estrofes de Tieck.


Na França, com as suas atividades e tradições revolucionárias, o romantismo em parte teve outro caráter. Em Victor Hugo -- que com relação á França e com certa razão podia afirmar: o que o liberalismo é para a política, o romantismo é para a literatura --, unem-se romantismo político e estético num poderoso fermento revolucionário. No famoso prefácio de Cromwell, é verdade que o cristianismo -- mesmo se sublimado sob forma de romântica melancolia -- desempenha um papel proeminente.15 Mas o que surge de novo e o realismo. Victor Hugo descobre para a literatura que o feio existe junto com o belo, o disforme junto com o agradável, o mau junto com o bom, a sombra junto com a luz.16

Em Victor Hugo, o romantismo conduz dialeticamente ao realismo. É verdade que tal processo completa-se por meio de Balzac, mas já aparece de forma embrionária em Victor Hugo. A dissolução da forma e a experimentação com a língua tornam-se para ele um meio de introdução a uma nova realidade, que não e mais a do neoclássico, de introdução à vida forçando-a a entregar a sua verdade. Vejamos em Reponse à un acte d'accusation:

Quand je soitis du college, du theme ... l’idiome,                                                                peuple ou noblesse,était l'image du royome,                                                                               la poesie était la monarchie um mot                                                                                       etait un duc ou pair, on n'etait qu'un grimaud;                                                                          la langue etait l'état avant quatre-vingt-neuf;                                                                          les mots, bien ou mal uses, vivait parqués en castes;                                                               les uns, nobles...montant à Versailles aux carosses du Roi;                                                     les autres, pas de gueux, drõles paiticulaires,                                                                  habitant les patois; quelques-uns aux galeres                                                                       dans l'argot; devoues à tous les genres bas;                                                                              ... populace du Style au fond de l'ombre éparse;                                                                vilains, rustiques, croquants, que Vaugelas, leur chef,                                                          dans le bagne Léxique avait marques d'une F                                                                           Je mis un bonnet rouge aux vieux dictionnaires.                                                                     Plus de mot, senateur! plus de mot, routier!                                                                                ... J'ai mis tout en branle, et, morose,                                                                                       j'ai jete le vers noble aux chiens noirs de la prose.17

II -- Romantismo e realismo

Edward Engel acha que as correntes românticas emergem de conflitos entre gerações 
  
O romantismo e antes de tudo a poesia de uma nova mocidade, que primeiro atua junto com os clássicos, mas logo passa a combatê-los. Busca, com o seu bom direito juvenil, novo conteúdo e novas formas, assim como os clássicos um dia fizeram, quando ainda pertenceram ao Sturm und Drang (Titanismo). Juventude é a palavra gravada na bandeira dos românticos, e só como jovem expressão de vida a literatura romântica poderá ser humanamente compreendida. 18

Engel não percebe, dada a limitação de seu método idealista, que a contradição entre classicismo e romantismo não foi um conflito de gerações, mas uma contradição entre duas fases do desenvolvimento da sociedade burguesa, divididas entre si pela grande revolução francesa. A busca da literatura romântica por novas formas artísticas só pode ser entendida através de uni enfoque como esse. Do ponto de vista formal metodológico, a literatura após a revolução francesa, caracteriza-se por uma ação dialética reciproca de ambos os gêneros literários. Essa ação reciproca baseia-se no caráter cada vez mais contraditório e complexo da vida moderna, impossível de ser domado literariamente com o método e os instrumentos do sistema formal do classicismo. Desse ponto de vista, o romantismo surge como expressão necessária das novas formas de vida. O romantismo levou, no entanto, tal dialética das formas até à dissolução das mesmas, à mistura, sim, até mesmo à anulação dos gêneros. Essa mistura dos gêneros teve grande importância na teoria literária do romantismo. Encontramo-la como um momento fundamental na conceituação, por Fredrich Schlegel, da poesia romântica:

A poesia romântica é uma poesia universal progressista. Sua determinação não se limita a reunir as diferentes formas de poesia e a relacioná-la com a filosofia e a retórica. Pretende e deve misturar, fundir, poesia e prosa, genialidade e crítica, poesia artística e poesia natural, tomar a poesia viva tomando a vida e a sociedade poéticas, poetizando a vivacidade e preenchendo todas as formas da arte com conteúdo cultural de toda sorte, e marcando a sua alma com todas as oscilações do humor.19

Na França, a dissolução dos gêneros e da síntese formal ganha um papel proeminente na estética de Victor Hugo. Segundo o prefácio de Cromwell, a poesia tem três idades: a poesia lírica, a poesia épica, e a poesia dramática, em correspondência às três idades dos homens: a juventude, a idade adulta e a velhice. O drama seria a poesia plena pelo fato de -- conforme Victor Hugo -- compreender e resumir o lírico e o épico. Como exemplo, Victor Hugo cita os dramas de Shakespeare, Atala de Chateaubriand,  O paraíso perdido de Milton e A divina comédia de Dante. A teoria de Victor Hugo é manifestamente uma tentativa de justificar historicamente a dissolução dos gêneros.2O

Os grandes escritores pós-revolucionários incorporaram essa tendência de mistura, dissolução e síntese de géneros em seus métodos, como modelo para a nova forma literária. Victor Hugo via claramente que a estética romântica, ao esmagar o sistema de regras do classicismo, acercava-se do realismo: Eu abandonei o nobre verso em favor dos cães da prosa. Mas ele não entendeu que, para atingir um verdadeiro realismo, era necessária a superação do romantismo. Balzac assumiu as consequências de seu rompimento com o romantismo, tornando-se o criador do moderno romance burguês-realista . No prefácio de A comédia humana, lembra a grande importância que o romantismo de Walter Scott teve para o seu trabalho, mas salienta que para alcançar um profundo realismo crítico-social é necessário abandonar o romantismo, extinguindo as suas tendências dialeticamente.21

Em: Études sur M. Beyle, ele afirma categoricamente que, juntamente com o romantismo e o classicismo, existe uma terceira tendência literária que busca a síntese entre as duas primeiras:

Não creio que uma representação da moderna sociedade seja possível com o rígido método dos séculos dezessete e dezoito. Parece-me incondicionalmente necessário introduzir os elementos dramáticos, a analogia, a imagem, a descrição e o diálogo, na literatura moderna. 22
Pontos de vista semelhantes ele deixa Étienne Lousteau apresentar em Ilusões perdidas. A forma adequada para a literatura moderna é o romance., que impiedosamente configura a problemática sem recuar ante a sua feiura não artística e que em si é expressão dessa problemática. O romance é, afirma Balzac, em 1839:

 ... a imensurável criação moderna. É o sucessor da comédia, a qual, com as suas velhas leis, não é mais viável sob as modernas condições culturais. Incorpora fato e ideia em suas invenções, exigindo o sentido e a moral de La Bruyere, o tratamento de caráter de Shakespeare e a descrição das nuances mais sutis da paixão.23

O romance supera a literatura fria e matemática do século XVIII. Não é somente análise, é também síntese. O século XVIII pôs tudo em questão. A tarefa do século XIX é a de chegar a uma conclusão: busca-a através de realidades, mas de realidades que vivem e se movem.24

A esse novo sentido do romance, Balzac o chama de scene, o que insinua uma síntese no sentido do romance de dois gêneros, romance e drama. O elemento dramático é surpreendente também nos romances de Balzac: reproduzem toda a dinâmica da vida social. São realidades com vida e movimento


III -- L'art pour l'art e a ironia romântica.

A estética do romance, assim como o movimento romântico, é ambíguo. Na Alemanha, tal ambiguidade, decorrente da miséria alemã, é expressa na contraditória teoria kantiana de l'art pour l'art. Em Kritik der Urteilskraft, o problema é a superação da velha contradição filosófica entre natureza e liberdade. Introduzindo na natureza a ideia de um motivo, Kant acha que submetemos a natureza à liberdade. O princípio da motivação, ele o fundamenta na sensação de prazer ou de desgosto que experimentamos ao contemplar as coisas. Todas as suposições, oriundas de tais sentimentos, classifica-as de estéticas. E o sentido do belo é simplesmente aquele prazer, destituído de qualquer interesse, ligado à forma perfeita. Essa teoria estética de Kant é preciso lembrar -- não é outra coisa senão uma aguda síntese, altamente frutífera para a práxis artística, aplicada por vários escritores pioneiros, os quais juntos provocaram um período áureo da história da literatura burguesa: Lessing, Herder, Goethe, Schiller, Holderlin, toda a Sturm und Drang ... Em outras palavras: A estética de Kant foi a estética da emergente burguesia alemã, mas nas condições especificamente atrasadas daquela Alemanha, onde o capitalismo estava atrasado em seu desenvolvimento cerca de cem anos em relação à França e duzentos em relação à Inglaterra.25

Enquanto os franceses tomaram a Bastilha e consolidaram a o domínio da classe média, os alemães fizeram a sua revolução no mundo das ideias e da literatura. O elemento capitalista ainda era pouco desenvolvido, a indústria jazia em seu berço, e a burguesia alemã, dada a sua debilidade, era forçada a trilhar o caminho da conciliação. A estética de Kant é, no campo da teoria artística, a expressão de tal conciliação: por um lado implica em opor a urna arte que apregoa a moral feudal, a visão de vida feudal -- e a arte como um folguedo desinteressado não pode ter tais motivos! Mas, por outro lado, quebra a oposição burguesa, negando a função da arte como instrumento dessa classe social. Ao mesmo tempo em que a estética kantiana libera a burguesia dos ideais feudais para a arte e a literatura, prende ideologicamente os seus anseios de emancipação, isolando-os da luta social da classe burguesa. Essa ambiguidade torna a arte pela arte uma teoria de dois gumes. Nos países onde as tradições advindas da revolução francesa eram vivas, a teoria d a arte como jogo desinteressado, ainda em sua específica forma romântica, podia desempenhar um papel progressista como teoria de oposição aos novos detentores do poder capitalista que haviam traído a democracia: a arte não queria deixar-se prostituir pela burguesia. Alguns românticos lutaram pela causa da classe trabalhadora e da burguesia liberal nas barricadas em 1830 e 1848. Na França, l’art pour l’art passou para um extremo reacionário após a decisiva derrota da revolução democrática. Na Alemanha, onde o romantismo desde o início havia passado para a direita, a estética kantiana degenerou num instrumento de alienação reacionária e subjetivismo. A ironia do romantismo alemão é a primeira teoria da arte do período decadente. A literatura deve, segundo Schlegel

... entre o apresentado e o apresentador, livre de qualquer interesse real e ideal, voar nas asas da reflexão poética, animando-a continuamente e multiplicando-a como numa infinita série de espelhos.26

Essa irônica atitude do escritor implica em que ele deve estar livre em relação a sua obra, em que deve estar acima dela e estar pronto a romper com a ilusão a qualquer momento. A literatura romântica está repleta desse tipo de ironia. No romance Godwill, de Brentano surgem as mais curiosas surpresas quando o escritor de pseudônimo Maria finalmente encontra os personagens de seu conto: quando finalmente encontra o herói titular, surpreende-se com o fato de ele, sobre quem tanto escrevera, ser tão diferente do que havia imaginado. A certa altura deixa Godwi se explicar que isto aqui é uma represa na qual cai na página 266 do primeiro volume E como se não bastasse, finalmente Brentano tira a vida do escritor Maria bem no meio de sua criação: Ele morreu de tédio durante a composição da segunda parte, o que quase não surpreende nenhum dos leitores atuais.27

A ironia romântica dá início à tendência ao subjetivismo, que caracteriza o desenvolvimento da literatura moderna durante o período da decadência ideológica.     A subjetividade artística é aceita como algo absoluto em si, e degenera num arbitrário jogo com figuras autoconcebidas (Lukács). O subjetivista escolhe arbitrariamente o seu assunto. O subjetivismo pode, ao transgredir os limites naturais de sua função estética -- incorporar e criar de forma artística original o sentido da realidade --, penetrar num tema qualquer, mesmo que a matéria não tenha nada a ver com as experiências subjetivas do escritor. O escritor realista recebe o seu tema do próprio desenvolvimento histórico dado, da dialética própria do movimento cultural, para usar urna expressão de Gottfried Keller. Essa subjetividade é de um tipo diferente da ironia romântica. Consiste na capacidade de descobrir e executar um ato verdadeiro. Esse tipo de subjetividade aproxima o escritor da vida, desperta o seu amor pelo homem e sua existência. Esse humanismo é naturalmente tanto mais paradoxal quanto mais a sociedade capitalista desenvolve os seus lados negativos. Mas sem isso nenhum realismo é possível.


N o t a s :
1 - Ver, entre outros Marx/Engels: Ueber Kunst lind Literatur; Franz Mehring: Zur Literaturgeschichte I, Berlim, 1929, e Zur- Geschichte der Philosophie; Harald Rue: Literatur og Sarnfund; Gyõrgy Lulcács: Goethe und seine Zeit, Bem, 1947; Der junge Hegel, Zürich/Wien, 1948; Heine und die Vorbereitung der 48er Revolution'; Kommunistische Internationale 3:1941; Paul Reinman: Legendbildung und Geschichitsfálschung in der deutschen Literaturgeschichte, Unter dem Banner des Marxismus 2-3:1930; Herder und die dialektische Methode, Unter dem Banner des Marxismus 1:1929". Comparar com a interessante enquete Ueber Romantik und Heroik Intemationale Literatur 2:1935.

2 - Ver resumo de Folke Leander: Nya synpurikter pa romantiken (Novos enfoques quanto ao romantismo). Estocolmo, 1944; de R. Bonz, Die deutsche Romantik, Leipzig, 1940; de Erik Blomberg Tidens romantik (O romantismo do tempo). Estocolmo, 1931; de Ricarda Huch, Die Romantik, Stuttgart, 1951; de Walzel, O. F., O romantismo alemão, Estocolmo, 1917; de Mario Praz The romantic agony, New York, 1956; de Johannes Mittenzwei e outros, Erlâuterungen zur deutschen Literatur - Romantik, Berlim, 1967. Muito representativo da critica católica é o texto de Jacques Maritain sobre Rousseau, em Trois reformateurs, Paris, 1937. Ver também de Irving Babbitt, Rousseau and romanticism, New York, 1955.

3 - A industrialização arruina a fruição da Natureza pelos românticos. Quando Tieck foi à Inglaterra, não pôde alegrar-se com a natureza inglesa, pois com a indústria, tinha perdido o seu aroma natural.
4 - O diário dos irmãos Goncourt, Estocolmo, 1927, p. 123.

5 - Citação segundo Eduard Engel: Geschichte der deutschen Literatur von den Antãngen bis in die Gegenwart, Wien/Leipzig, 1918, vol 11, p. 25.

6 - Novalis, Hyinnen an die Nacht e Die Christenheit oder Europa, em Werke und Briefe Ansbach, 1968. pp. 403-404.

7 - Ver, de Henri See, Les origines du Capitalisme moderne; de Jacques Pirenne, Les grands courants de l'histoire universelle, vol Neuchâtel, 1945.

8 - Friedrich Kõppen Die Berliner Historiker. Internattonale Literatur, vol 6/7, p. 109.

9 - Loc. cit.

10 - W. H. Wackenroder Herzensergiessungen eines kunstliebenden Klosterbruders. Leipzig, 1904, p. 81.

11- Ver pp. 79-80.

12 - De J. Tegnner, Cartas escolhidas, Estocolmo, 1947, p. 39.

13 - Ver, de Franz Mehring, Deutsche Geschichte vom Ausgange des Mittelalters, Berlim, 1947, p. 86. De Ph. Dengel, ver a análise de como a revolução francesa influenciou a vida cultural alemã: Die grosse bürgerliche Revolution in Frankreich und das deutsche Geistleben. Kommunistische Intemationale, vol 7, 1939. Ver também Hedwig Voegt: Die deutsche jakobinische Literatur und Publizistik 1789 - 1800 Berlim, 1955.

14 - Citação segundo O. F. Walzel, O romantismo alemão". Estocolmo, 1917, p. 115.

15 - De Victor Hugo: Le christianisme améne la poésie à la vérité.

16 - De Victor Hugo: Les Contemplations, Londres, Edimburgo e Nova York, 1930.

17- Ver p. 30.

18 - Eduard Erigel, Geschichte der deutschen Literatur, vol II, p.23.

19 - Citação segundo Eduard Engel, obra acima, p. 25 -- Diferentes definições do que seja romantismo em contradição com o classicismo: de Sismonde Sismondi, em Litterature du Midi de l'Europe: “Independente de cada povo ter seu gosto quanto a literatura dramática, e suas regras próprias, essas se agrupam sob duas bandeiras, e são somente dois sistemas que estão em contradição em toda a Europa. Esses sistemas foram caracterizados como o clássico e o romântico, os quais, no entanto, não estão bem determinados quanto ao significado. Franceses e italianos chamam os escritores antigos de clássicos, invocando a autoridade deles, valendo-se de seus padrões e gosto para si mesmos. Alemães, ingleses e espanhóis, que levam em conta a memória da Idade Média, acham haver mais poesia na memória do passsado de seus próprios povos."     (IIp. 295)   Sismondi acha que os alemães denominam essa poesia de romântica em ligação ao românico. Ampere define o classicismo como cópia, e o romantismo como originalidade. Um escritor do jornal  Le Globe -- que primeiro assumiu uma postura conciliatória, mas depois de Sainte-Beuve assumir a redação do jornal se tornou romântico -- acha que o romantismo é o gênero de literatura que expressa uma fiel imagem da civilização moderna -- o que equivaleria a afirmar que o romantismo é         o espiritualismo da literatura.

20 - Victor Hugo: Cromwell. Paris, p. 9.

21 - Sobre o papel do romance histórico no surgimento do realismo sócio-crítico, ver Gyõrgy Lukács: Der historische Roman, Berlim, 1955. (Werke 6, Neuwied und Berlin, 1965)

22 - Balzac: "Etudes sur M. Beyle, Analyse de la Chartreuse de Panne. Geneve, 1943. p. 16.

23 - Citação segundo Emst Robert Curtius: Balzac, p. 426-427.

24 - Ibidem, p. 427.

25 - Ver Franz Mehring: Zur Literaturgeschichte. Berlim, 1929, vol II, p. 229.

26 - Schlegel : Schriften. Augsburg.

27 - Walzel observa muito bem que a ironia romântica implica uma tentativa de, através da maior liberdade de movimento, aproximar-se daquela harmonia, que o classicismo buscava, mas que no entender romântico não consegue alcançar. Essa situação confirma ainda mais a interpretação do romantismo alemão como uma fuga da miséria. Ver O. F. Walzel: Romantismo alemão, pp. 42-43.