sexta-feira, 26 de abril de 2013

LE DROIT À LA VILLE – Intervenção apresentada por Claude Schnaidt -- Colóquio: Traces de futurs – Henri Lefebvre -- St. Denis, 4 de junho de 1994.



Tradução: Frank Svensson

Não quero vos impor a leitura do texto que encaminhei a este Colóquio. Trata-se de um modesto adendo a l’Introduction a la modernité e é uma homenagem que devo a Lefebvre, uma questão entre mim e ele. É ainda uma referência para situar o porquê que o quero dizer: Nem sempre entendi o que ele como marxista pensa sobre o Direito à Cidade, e  não cesso de me opor  à quem insiste nesse tão raso enunciado. 

Henri Lefebvre
Devo, em parte, a Lefebvre haver aprendido que, por Marx e Engels, a cidade não tem futuro. Pelos pais fundadores, cuja audácia inibe muitos marxistas em cima do muro, a separação entre a cidade e o campo mutila e bloqueia a totalidade social. 

Ela é a projeção sobre o território, da divisão social do trabalho. Ela leva à divisão da população em classes. Com que resultado? A alienação geral. Subordinado à divisão do trabalho o individuo é submetido a situações e atividades que interrompem sua humanização. De um lado o campo invadido, do outro a imagem urbana degradada se dissociam. Além disso, a grande indústria, as exigências de mercado e de produtividade ajudam a dissociar o econômico e o social. Como sair desse impasse? 

Certamente eliminando a propriedade privada, constituindo uma economia em comum sobre base associativa na prática, que faça desaparecer as instituições políticas, mas principalmente ultrapassar a divisão do trabalho. Tal revolução supõe a supressão da cidade e do campo. Qualquer coisa difícil de se imaginar que não será nem cidade nem campo. Utopia de intelectuais assustados por Manchester e pela miséria dos camponeses de Macklenburg ? Esse não foi o enfoque de Lefebvre. Então porque sua luta pelo direito à cidade? Um direito que lhe veio ao espírito pensando nas populações suburbanas, na segregação, na solidão.

Pois sim Dionisíacos, surpreender-vos-ei por constatar que aos olhos do filósofo da rua Rambuteau1  não sois vistos como cidadãos plenos, e que haja inspirado arquitetos durante décadas a vos prometer: Agora vos proporcionaremos uma cidade de verdade.

O direito à cidade, Lefebvre definiu da seguinte maneira: ... significa o direito dos cidadãos urbanos, e dos grupos que constituem, participar de todas as redes e circuitos de comunicação, de informação, de intercâmbios. O que não depende nem de uma ideologia urbanística nem de alguma intervenção arquitetônica, mas de uma qualidade ou propriedade essencial do espaço urbano: “a centralidade”. Nenhuma realidade urbana, afirmamos aqui e alhures, sem um centro: sem a reunião de tudo que possa nascer e se produzir no espaço, sem a reunião atual ou possível de todos os objetos e sujeitos. O direito à cidade estipula igualmente que o encontro e acumulação dos lugares e objetos devem corresponder a certas necessidades geralmente desconsi-deradas, a certas funções transfuncionais: a necessidade de vida social e do outrem, a necessidade de funções lúdicas, a função simbólica do espaço ... .

O único meio concreto invocado por Lefebvre para fazer avançar o direito à cidade consiste em interferir nos interstícios entre o imóvel e o conjunto urbano, ao nível macro arquitetural e micro urbanístico. Nesse nível, afirma ele, se situam as pesquisas de alguns dos mais eminentes arquitetos da época.4  

E qual nome menciona? Ricardo Bofill o maior mistificador de toda a história da arquitetura. Evidentemente Lefebvre teria feito melhor em se abster sobre o assunto. Ocultou o que há de fulgurante nos fundadores do socialismo científico sobre a questão urbana. Somou uma questão moral a uma política urbanística retrógrada. Perdeu-se numa visão anacrônica de centralidade urbana quando as cidades se interligam umas às outras, fundindo-se em regiões urbanizadas, quando os centros se diluem perdendo sua funcionalidade de origem. Um direito à cidade em névoas urbanas nas quais as cidades se transformam em pseudo-cidades.

 R. Bofill. Quartier de la Sourderie; Saint-Quentin en Ivelines, 1980.  

Sinto-me particularmente atingido por ser um pouco responsável. Fui, com a camarada Anne Marie Karlen de Genebra, um dos primeiros a encorajarem Lefebvre a tomar a questão urbana em consideração. Houve, em seguida a exclusão, maio 68, um outro Lefebvre, e o direito à cidade já era. Um encadeamento que talvez não seja tão estranho que se me tornou um sério problema. Ajudai-me a vê-lo com clareza. Agradeço penhoradamente.

N o t a s :

1 – Lefebvre, Henri: Espace et politique – Le droit à la ville II. Paris. Anthropos 1972. P.144.

2 – Domicile de Henri Lefebvre au coeur de  Paris.

3 – Op. cit. 1, pp. 21-22.

4 – Op. cit. 1, p, 158. 

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