Galvano Della Volpe - Professor universitário e filósofo italiano (1895 – 1968). Seu trabalho foi visto por muitos como uma alternativa ao marxismo gramsciano.
Creio que
o conceito (e o nome) de vanguarda,
ou seja, de poética de vanguarda, não nos sirva a nós marxistas e não possa
criar senão mal-entendidos e confusões, uma vez que se trata de um termo muito
comprometido historicamente.
O que
significa, efetivamente, poética vanguardista? Todas as vanguardas — nos seus
programas ou manifestos -- tiveram em comum a atitude antiacadêmica, isto é,
urna recusa de formas e técnicas
artísticas tradicionais (fossem elas figurativas, musicais ou literárias) e
portanto dos respectivos conteúdos
retóricos: e até aqui temos o lado historicamente fecundo e positivo das
vanguardas (daí os originais êxitos artísticos, especialmente nas artes
figurativas: de Manet a Van Gogh, a Braque, a Picasso, etc.), mas o que
aconteceu foi que a mutação dos conteúdos
em relação à mutação das formas se
transformou depois, aos poucos, em indiferença e abstração do conteúdo em
geral, do objeto ou realidade, até chegar ao formalismo exasperado do informalismo (ou negação de todas as
formas tradicionais): até às manchas pictóricas dos Pollock etc.
A razão
está no fato de a verdadeira alma do vanguardismo ser a idolatria da
forma-como-sensualidade-pura, que o conduziu, por fim, ao culto da matéria dos informalistas e tachistas:
razão pela qual vanguardismo acabou por significar formalismo por excelência.
Compreende-se
que isto comporta a intenção programática de jogar, por assim dizer, a sorte da
arte unicamente no terreno (idealista) da subjetividade criadora e do
individualismo exasperado: ou seja, da forma-fantasia (sensualidade). Não
creio, por isso, que a vanguarda, mesmo nos seus aspectos melhores, se oponha à
civilização capitalista (como sustenta De Micheli em Contemporâneo, de outubro-novembro de 1959), pois que, sendo estas
em todas as suas manifestações exasperadamente individualista, a vanguarda é um
legítimo produto dela, com o seu aspecto bom e o seu aspecto mau (este último
bem confessado no grito de Picasso, de se ter reduzido, ele e os outros, a
pintar apenas monstros, o que acentua
a desumanidade do formalismo na medida em que ele tende exatamente a abstrair o
mais possível dos conteúdos e portanto também dos valores humanos, sociais).
Em
outros termos, as antíteses representadas pela vanguarda são sempre internas à
cultura e civilização capitalista, individualista: familiar se não típica a
costumeira entre o conformista-tradicionalista e o boêmio ou artista-anarquista. E o que há de mais
romantica-mente individualista que a rebelião-evasão (exótica) de um Gauguin? O
que há de mais historicamente burguês do que estas atitudes? Mas a pintura de
Gauguin permanece, tal como a de Van Gogh e assim por diante, e permanecem
ainda para serem utilizadas numa nova poética figurativa, realista, algumas de
suas conquistas técnicas.
O sentido
anti-renascentista do espaço pictórico; como já o apontam as obras do Picasso
comunista, de Léger e do primeiro Pignon e de Guttuso. Mas -- concluindo -- a nós
materialistas marxistas o termo e conceito de vanguarda já não nos pode mais
servir em virtude dos muitos sentidos históricos e consequentes equívocos
atuais que ele comporta (não sem razão Lukács chamou a atenção para as
estreitas relações entre decadentismo e vanguardas: uma advertência que talvez
De Micheli não tenha levado suficientemente em conta): e temos de substituí-lo -- na nossa luta por uma nova poética -- pelo de realismo socialista, ou seja,
por uma poética que por princípio (já transparente na sua própria denominação)
tem em mira evitar o formalismo e todos os desequilíbrios de forma e conteúdo,
e portanto restaurar a plena humanidade da arte (que é sentido e razão), a
plenitude da própria arte, e encorajar, por fim, a vocação para o clássico que
é própria da obra de arte autêntica.
Assim,
para fecharmos com a literatura, já nos damos conta da plenitude clássica de
certa poesia democrática e socialista de Maiakovski e de Brecht, ilustrativa da
poética do realismo socialista, surgida contra as vanguardas literárias
(burguesas) que foram o naturalismo ou verismo, o simbolismo, o expressionismo,
o surrealis-mo e o hermetismo.
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OBS. Frank Svensson: Válido também para a
arquitetura?
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ResponderExcluirKramar Roddan.