Per G. Råberg - PhD e
livre-docente em Ciência da Arte na Universidade de Estocolmo.
Tradução:
Frank Svensson
São
vários os resumos históricos, entre os mais conhecidos, que fornecem uma imagem
desconcertante do triunfo internacional da arquitetura funcionalista — com
escritores corno Pevsner, Giedion, Hitchcock, Whittick c Benévolo — mas também
com alguns críticos de tendência mais teórica corno Banham e Collins. O
material escolhido revela que o funcionalismo é encarado como um estilo
arquitetônico entre outros, um estilo subsequente ao barroco, ao classicismo e
ao ecletismo estilístico, mas inspirado em novas fontes e refletindo novas
relações sociais. As obras representativas do desenvolvimento são alinhadas em
série, e coleções de fotografias mostram como o desenvolvimento de suas formas
se dá, como as experiências menos bem-sucedidas de um reduzido grupo de mestres
são seguidas de outras mais bem-sucedidas.
Além
disso, dá-se grande espaço aos programas teóricos do funcionalismo, nos quais
são minuciosamente descritas a oposição às características da configuração
artística do meio ambiente da época e o negativo enfoque de questões de
configuração em geral. A estética é vista como expressão de um individualismo
inoportuno para a época, exigindo-se que a expressão Baukunst (arte de construir) seja substituída por Bauen (construir). Aprendemos que a
moderna arquitetura e a produção artística querem submeter-se à função, ao
processo industrial de produção, aos rígidos condicionamentos econômicos de
uma produção social, ao invés de formas exclusivas, coisas belas. Para o novo
tipo de arquiteto que aparece nos anos 1920, o técnico racionalmente calculista
constitui um ideal e um modelo a seguir.
Toda a
formação teórica racionalista é apresentada, no entanto, sem que os escritores
abandonem os princípios estético-estilísticos de avaliação do material que é ao
mesmo tempo por eles apresentado. Curiosamente não encontram nenhum motivo para
refletir sobre a contradição existente entre as obras descritas e as teorias de
apoio às mesmas, ou entre o enfoque formalista próprio e o programa
parcialmente antiestético do funcionalismo. O programa antiformal, é pelo
contrário, entendido como uma fonte de novas tendências formais.
Reyner
Banham está entre aqueles que observaram a existência nos primórdios do
funcionalismo de um hiato entre o enfoque teórico e a prática, mas seu único
comentário é o de que a linguagem formal dos vanguardistas dos anos 1920 não
expressa um racionalismo autêntico; as formas de Buckminster Fuller seriam
muito mais funcionais. Se, no entanto, queremos tomar o discurso dos
funcionalistas ao pé da letra, como o fez Banham, o triunfo do funcionalismo é
muito mais a derrocada do enfoque formalista da configuração do meio ambiente.
Uma análise do desenvolvimento da arquitetura moderna, a partir de teorias,
deve tratar do sucessivo desmonte da configuração do meio ambiente do ponto de
vista da história da arte. E se ai os anseios de racionalização quanto ao meio
ambiente devem ser seriamente discutidos, não há naturalmente nenhum motivo
para isolar ou dar prioridade justamente às iniciativas dos arquitetos funcionalistas
em detrimento do sério trabalho de desenvolvimento que ocorre concomitantemente
em outros grupos profissionais, ou para aguçar o discurso antes desenvolvido
por arquitetos com um outro enfoque estilístico.
Há um
dualismo embutido no desenvolvimento do radicalismo dos anos 1920, cujo
significado ainda não parece devidamente esclarecido, uma crescente dialética
entre os anseios de uma nova forma e uma forte tendência de um enfoque
puramente técnico quanto à configuração ambiental. Parece residir na tensão
entre esses pólos a originalidade da iniciativa do movimento dos anos 1920,
podendo a tônica situar-se tanto num polo como no outro. Com isso quero pedir
uma certa compreensão às dificuldades de, num breve resumo, fornecer uma imagem
inequívoca do fato. Pode ser problemático precisar onde situar a tônica, como
decidir o que seja o verdadeiro intuito de uma séria intervenção no debate
técnico-econômico e o que seja utopismo poético.
Depois
dessa minha reserva quanto ao conteúdo do radicalismo dos anos 1920, é
necessário admitir que o funcionalismo, com seus líderes, de qualquer forma se
apresenta nitidamente delineado no tempo; nunca, superficialmente visto, foi
mais fácil distinguir e delimitar um movimento histórico da arquitetura. Nunca
houve tampouco, dentro da arte ambiental, uma tendência para a qual a
denominação radical fosse tão
adequada. Os funcionalistas provocam uma revolução estética total, mas o
programa dos mesmos é muito mais amplo do que isso. Em seus propósitos estão
incluídas a reformulação do planejamento urbano, a industrialização das
habitações e de seu equipamento, a introdução de uma cultura sem diferenças de
classe, tudo em substituição a urna cultura de hierarquizada
representatividade. Os arquitetos funcio-nalistas defendem um programa
intencionalmente provocativo, mas é menos do que se possa pensar a expressão de
um idealismo utópico. Os funcionalistas são realistas, têm plena consciência da
revolução que a industrialização e o processo de democratização implicam e
reconhecem que a nova situação exige uma nova mentalidade, assim corno novas
condições ambientais.
Tal
radicalismo pode ser encontrado durante os primeiros anos após a Primeira
Grande Guerra em vários lugares da Europa; os principais agrupamentos são de Stijl, na Holanda, der Sturm, em Berlim, o construtivismo, na União Soviética, Le
Corbusier, em Paris, Bauhaus, em
Weimar. Todos os grupos têm caráter específico e características locais, mas
apresentam, já nos anos 1920, traços em comum. Que existe uma relação entre
esses centros — tão atentos para o que acontece em outras partes da Europa — é
nítido, basta mencionar as viagens de van Doesburg ou de El Lissitky, mas
trata-se de relações e de origens afins mal esclarecidas. Qual a importância
para a nova arquitetura que teriam as discussões profissionais desenvolvidas
junto a Peter Behrens, 1910-1911? Durante esses anos, três dos grandes mestres
da arquitetura moderna passaram por seu escritório: Gropius, Mies van der Rohe
e Le Corbusier.
O
radicalismo do início dos anos 1920 tem uma evidente ancoragem
romântico-estética, talvez mais clara nas variantes alemã e russa, mas presente
também em de Stijl, onde ao lado de
van Doesburg Mondrian exerceria um papel dominante. Oud o confessa. Por meio de
Mondrian, a nova arquitetura é ligada ao cubismo na pintura; o radicalismo
encontra-se nos três elos da cadeia.
De Stijl por
certo significou muito para a vanguarda da arte ambiental dos anos 1920, tanto
para Le Corbusier (por exemplo por meio da exposição em Paris, em 1923) quanto
para o desenvolvimento da Bauhaus, evoluindo de idealismo artesanal carregado
de misticismo para uma concepção bem mais moderna. Já em 1921 van Doesburg
atuava em Weimar em Berlim, e a partir de 1922 pode-se perceber uma mudança
formal na produção da Bauhaus rumo a um purismo no espírito de de Stijl.
Em L'esprit nouveau Le Corbusier divulga
durante esses primeiros anos as novas ideias concernentes à construção
habitacional, ao urbanismo e à arquitetura de interiores. Também ele é
romântico, ou, se assim quisermos, um visionário, mas sua visão tem uma
conotação mais básica que a de de Stijl;
a sua ousadia é fortemente ancorada na realidade e nas problemáticas concretas.
Onde de Stijl prevê a concretização
de princípios eternos quanto ao universal e ao elementar, Le Corbusier fala do
funcional e do técnico. É um grande admirador das espetaculares invenções da
moderna ciência e da técnica de engenharia — o automóvel, o transatlântico e o
avião — e compartilha generosamente suas descobertas intelectuais e visuais no
campo da cultura técnica.
Le
Corbusier opõe-se aos ornamentos e aos princípios das formas de representação
defendendo a visão de uma arquitetura em consonância com a objetiva visão de
realidade da moderna ciência e da técnica de engenharia. Não se limita ao
estético ou ao construtivo, encarando de urna forma não dogmática para o seu
tempo a conformação ambiental num contexto social e socioeconômico. Na Maison
Citroen, em 1919-1922, apresenta o tipo de urna moradia unifamiliar
pré-fabricada, e em seu Plan Voisin,
numa primeira versão (intitulada Une
ville contemporaine) exposta no Salão de Outono, em Paris, em 1922, e
demonstra uma solução radicalmente nova para o centro de Paris, a qual
considera as crescentes necessidades de espaço do tráfego, bem como uma maior
densidade de superfícies construídas, ao mesmo tempo em que a natureza é melhor
integrada à imagem da cidade. Seus projetos em distintas áreas, num novo e
radical espirito, são bem conhecidos; ganham enorme divulgação por meio dos
livros que publica a partir de 1923, Vers
une architecture, Urbanisme, etc.
Com esses
textos Le Corbusier apresenta-se como a personalidade que lidera o radicalismo
dos anos 1920 e torna-se a principal referência para toda uma geração de jovens
arquitetos. O contagiante entusiasmo, a ousadia, a imaginação, mas sempre
apoiada numa considerável objetividade intelectual, dão às suas ideias uma
enorme repercussão. Nesse contexto podemos lembrar que o pavilhão de Le
Corbusier na exposição de Paris, em 1925, foi o primeiro ponto de contato com
sua obra para inúmeros arquitetos de todo o mundo.
Nesse
mesmo ano Gropius publicou seu livro Internationale
Architektur, no qual o movimento moderno é apresentado como um fato
histórico. Toda uma série de arquitetos de diferentes países comparece, e uma
mesma tendência ressalta de suas obras. Esse livro consegue, a partir dos mais
distintos anseios, dar a ilusão de uma frente unida, e um movimento moderno
fica patente, uma impressão reforçada pelo livro de Adolf Behne Der moderne Zweck-bau (A moderna
arquitetura funcional), publicado no ano seguinte. É nessa época que a Bauhaus
passa a ser vista como expoente do vanguardismo na Europa. Após uma série de
experimentos surge a famosa cadeira de tubos de Marcel Breur, e com ela muitos
produtos desenhados para produção industrial em massa. Elaboram-se protótipos
de novos serviços funcionais de porcelana, simplificam-se as artes gráficas e
uma nova arquitetura é experimentada; os primeiros e mais conhecidos exemplos
são desde cedo os prédios da Bauhaus e as moradias de seus professores. A
Bauhaus sabe também divulgar a si e as suas ideias, por meio de um periódico
próprio — só publicado durante alguns anos — e por meio dos Bau-hausbücher ("livros da
Bauhaus"), produzidos com a colaboração de personalidades da arte e da
arquitetura radical; Oud, Moholy-Nagy, Mondrian, Kandinsky, Malevitj são alguns
deles. O programa pedagógico da escola, corno por exemplo os Vorkurs (cursos de iniciação), segundo
orientação de Johannes Itten, contribui para tornar a Bauhaus conhecida em toda
a Europa como um centro de reforma de ensino.
A
exposição de Stuttgart, em 1927, pode ser vista como o triunfo dos princípios
do movimento funcionalista. A exposição consegue reunir as principais forças do
radicalismo europeu. Arquitetos corno Le Corbusier, Gropius, Oud, Bruno Taut,
Mart Stam e Josef Frank tomam parte. A exposição marca o momento em que foram
sintetizados os distintos anseios; os líderes uniram-se numa mesma atitude,
numa mesma forma de se expressar; um novo estilo viu a luz. Para os jovens
arquitetos do mundo, que a distância e com cética curiosidade haviam seguido as
radicais tendências, a exposição de Stuttgart foi uma experiência de fortes
emoções.
Mies van
der Rohe apresenta-se aqui pela primeira vez num grande papel: é o organizador
da exposição realizada sob a égide da Deutscher
Werkbund. Participa ainda com um de seus mais interessantes prédios, urna
casa com estrutura independente e paredes internas removíveis. Quanto à forma,
consegue, tomando como ponto de partida seus projetos expressionistas de casas
de vidro de 1919-1921, alcançar os demais pioneiros.
O
significado da exposição de Stuttgart reside entre outras coisas no programa
"social" da arquitetura apresentada, onde residências exclusivas para
as elites cedem lugar às moradias para amplos segmentos da sociedade. Isso
implica salientar problemas econômicos e técnicos antes não considerados. Em
Stuttgart apresenta-se um programa mais ideal do que prático, as casas expostas
apresentam muitas falhas do ponto de vista técnico, e cálculos mais precisos
dos custos não são apresentados. Mas a própria reunião de grandes nomes, a nova
forma e os problemas da moradia moderna são uma nova faísca incendiária. O
funcionalismo, não mais uma utopia estética ou uma objetiva arquitetura de
fábricas, começa a penetrar na
realidade social. Mas isso não implica que faltem objetivos culturais, basta
estudar o programa de Mies van der Rohe para compreendê-lo: Das Problem der neuen Wohnung ist im Grunde
ein geistiges Problem ("O problema da nova moradia é fundamentalmente
um gigantesco problema"). Trata-se de um combate por um novo estilo de
vida, por novas formas de viver.
Stuttgart,
em 1927, é o ingresso a toda uma série de exposições de habitações e de desenho
industrial onde são propagados novos tipos de casas e equipamentos
habitacionais: Bauen und Wohnen, em
Berlim, Der Sthul, em Stuttgart, Pressa; em Colônia, onde triunfam as
novas artes gráficas, Das neue Heim,
em Zurique, todos em 1928; em 1929 surge Das
neue Haus, em Brühn, CIAM II, em Frankfurt, e uma nova exposição Werkbund em Breslau, Wohnung und Werkraum. Em 1930 segue a
exposição Werkbund em Paris, a
exposição habitacional na Basiléia, CIAM III e a exposição de Estocolmo. Em
1931 continua a série, entre outras com a enorme exposição da construção em
Berlim, isso para mencionar só algumas das mais consideradas mostras
internacionais.
Nessas
exposições manifesta-se o novo estilo como a expressão adequada da época, e é
sugerida a visão de um inundo moderno de cubos brancos e abstratas superfícies,
talvez de forma mais nítida do que por meio das poucas construções que ao mesmo
tempo são erigidas em diferentes locais. O estilo difunde-se, e grupos radicais
aparecem em países corno Checoslováquia, Itália, Dinamarca e Suécia. Adotam o
programa, as novas formas e também o radicalismo, atacando os bastiões do
tradicionalismo em periódicos, em exposições e em panfletos. Rapidamente o
radicalismo se torna a óbvia forma de expressão da nova geração. Ao mesmo tempo
cresce a penetração da nova arquitetura na sociedade, em parte nas áreas
centrais das cidades, com palácios do comércio e outros prédios de serviços,
mas principalmente em seus entornos, com áreas habita-cionais unitárias . São
os alemães que se posicionam primeiro durante a segunda metade dos anos 1920. O
grande nome é Ernst May, urbanista chefe em Frankfurt sobre o Meno e criador da
série da famosa Siedlungen, no
entorno da cidade em expansão. Nele se reúnem o audacioso radicalismo de Le
Corbusier e uma genialidade posta em prática e canalizada para edificações de
interesse social de qualidade. Os novos projetos são demonstrados com
entusiasmo no periódico Das neue
Frankfurt (A nova Frankfurt), no qual Ernst May, inicialmente, é o redator
chefe e divulga o movimento livremente de maneira favorável. Também aqui a área
considerada ultrapassa a da técnica da construção; o radicalismo é apresentado
corno uma mudança social que abrange a maioria das atividades humanas,
incluindo ai a cultura; aqui se discutem as novas artes gráficas (que o próprio
periódico apresenta em seu lay-out),
técnica fotográfica, teatro, dança e educação física com emotivo e voluntarioso
pathos. Mas mesmo em outras partes da Alemanha crescem bairros semelhantes,
como, por exemplo, os grandes assentamentos projetados por Bruno Taut e Walter
Gropius, em Berlim; um dos mais mencionados e visitados é Siedlung Dammerstock, em Karlsruhe, projetado por Gropius com casas
de painéis (1929).
O
próximo passo na história do radicalismo é marcado pelos CIAMs (Congres Internationaux d' Architecture
Moderne), fundados em 1928, em Sarraz. O novo movimento ampliou-se e
começou a se organizar. Enquanto os primeiros grupos tiveram um caráter local
ou nacional, o CIAM foi um órgão internacional, uma asso-ciação pelo radicalismo
mundo afora. O CIAM implica também uma mudança em favor de questões mais
técnicas e econômicas, mesmo se a nova linguagem formal é sempre o denominador
comum óbvio. Nos congressos seguintes em Frankfurt, em 1929, e em Bruxelas, em
1930, são discutidos problemas habitacionais e a racionalização das técnicas de
construção. Problemas práticos de urbanismo tornam-se frequentes, sendo
tratados inclusive pelo CIAM IV (o cruzeiro Marselha—Atenas).
A essa
altura do desenvolvimento o funcionalismo começa a ser aceito pela velha
geração de arquitetos detentores dos postos estratégicos na sociedade, bem como
pelo público em geral. Evidencia-se que é para esse movimento que as jovens
competências são atraídas, e o respeito pelo caráter objetivo do funcionalismo só
faz aumentar. O radicalismo é rapidamente assimilado pela sociedade, e os
postos públicos passam a ser ocupados por seus adeptos, mesmo nos países
periféricos em relação a esse vanguardismo. O nazismo na Alemanha e o fascismo
na Itália (em menor grau) interrompem por alguns anos o desenvolvimento nesses
países, mas na maioria dos outros países o funcionalismo passa cedo a ser a
forma oficial de se construir. O radicalismo, como atitude cultural, esvazia
rapidamente a sua função, e nos anos 1930 é substituído por um engajamento cada
vez mais político. O que resta são entretanto as grandes tarefas de trabalho,
nas quais a arquitetura irá demonstrar sua força e revelar suas fraquezas. Mas
isso está fora dos limites do presente trabalho.
É
possível surpreender-se com a velocidade com que o radicalismo consegue
expandir-se e dentro de alguns anos transformar-se num grande ideal para a
configuração ambiental de grandes partes do mundo. Os motivos são vários. É
evidente que o novo movimento, em muitos lugares, já vinha sendo preparado, por
meio de trabalhos anteriores à Segunda Grande Guerra, por homens corno Behrens,
van de Velde, Loos e outros. Deutscher Werkbund é um dos principais
precursores, Tony Garnier em Lyon e sua Cité
Industrielle, uma outra fonte de inspiração. Pode-se afirmar que a geração
triunfante tem uma sólida base na qual se apoiar. A atenção dirigiu-se cedo a
determinadas direções: para a indústria, para o problema social da habitação,
para a nova técnica, mesmo se o interesse inicialmente é passivo e teórico.
Quanto à forma, a velha geração também havia apresentado objetivos edifícios
industriais e prédios de escritórios; a admiração pelos produtos da técnica e a
força de expressão das formas do mundo da técnica são consideravelmente mais
antigas que o funcionalismo. Isso explica de certa forma porque as forças
radicais dos anos 1920 na Europa tão rapidamente se encontram entre si, o que
não implica subestimar as relações estabelecidas no primeiro estágio pelos
próprios membros do movimento.
Mas o
rápido triunfo depende também do acentuado realismo do funcionalismo. Olhando o
movimento mais de perto, principalmente a sua última fase de desenvolvimento,
surpreende-nos quão sóbrio e realista o programa era na realidade. É bem
verdade que havia uma acentuada oposição à velha sociedade, mas em parte
tratava-se do desmoronamento de uma convenção já esvaziada e trôpega. Uma outra
sociedade, com outros problemas, começa a surgir: a do industrialismo, da
democracia, da tecnocracia. Uma sociedade com várias tarefas totalmente novas
para os arquitetos. Ninguém se opõe a essas novas condições, que são aceitas
corno pré-requisitos para o trabalho desses profissionais. O funcionalismo há
que se reconhecer como bem adaptado a essa modificada sociedade e suas
condições.
Um
terceiro fator de caráter técnico para o progresso é a facilidade com que os
contatos são estabelecidos e as ideias são propagadas. Depende naturalmente das
melhores condições de comunicação e do crescente processo de internacionalização
do mundo; viaja-se com facilidade para os centros continentais da arquitetura
radical, mesmo vindo de países periféricos. Importante papel desempenham também
os textos programáticos, pincipalmente os de Le Corbusier, e as muitas
exposições.
Além
disso, é necessário mencionar um fator cujo significado é difícil de avaliar,
mas que por certo é muito importante: as modernas revistas de arquitetura e de
desenho industrial. São por meio de publicações corno L'Esprit Nouveau e de Stijl
que as novas ideias e as novas formas primeiro se difundem além do apertado
círculo de afins; outras publicações pioneiras dos anos 1920 são: L'Architecture Vivante, ABC-Beitrage zur Baukunst, Kritisk revy, bauhaus, Das neue Frankfurt,
Die Form, Das Werk. Mesmo revistas fora do debate crítico mostram forte
interesse (Cahiers d'Art, L'Architeture d'aujourd'hui e uma série de revistas alemães), mesmo se muitas
vezes é uni interesse negativo e crítico. De qualquer forma o radicalismo é
discutido, e aos poucos as opiniões tornam-se moderadas e positivas. Depois de
1925 não tarda muito para que outras revistas alemãs de arquitetura mudem seu
curso, substituindo sua composição gráfica e tornando-se radicais. Por meio dessas revistas cria-se evidentemente uma forte
ilusão de que o funcionalismo seja realmente um movimento cultural irresistível,
a caminho de eliminar toda construção tradicional — aqui já temos o novo mundo
todo pronto. O fato de tratar-se na realidade de uma ilusão fica evidente ao
estudarmos alguns dos periódicos mais preocupados com a tradição. A imagem ali
apresentada difere de forma surpreendente da propaganda radical, e é por certo
mais realista nos anos 1927-1930, quando a construção tradicional na realidade
deve ter sido a dominante.
Mas o
fator mais importante de uma rápida difusão é o fator comum de que o movimento
dispõe em sua linguagem formal diferente. O novo entendimento das formas
introduzido pelo funcionalismo, principalmente na arquitetura, baseia-se numa
inversão da apreensão do espaço e dos volumes: as aberturas — as janelas de
grande superfície — passam a ser as partes mais substanciais e expressivas do
prédio, enquanto elementos de alvenaria têm seu peso aliviado por meio de
artifícios de ilusão de ótica; a casa ganha um caráter abstrato, de levitação.
Essa nova expressão formal talvez seja a principal conquista da nova geração de
arquitetos — há uma considerável diferença entre a arquitetura dos anos 1920 de
Le Corbusier e o estilo mais de coisa
encontrado em Loos, Hoffman ou Behrens; os antigos entendem ainda a parede como
muro com aberturas. Só na concepção criada pela geração de Le Corbusier o
ornamento de todo o aparelho estilístico da história da arquitetura torna-se
algo totalmente supérfluo, não uma impossibilidade, o que vale também para o
espaço e o equipamento dos interiores. É impossível não se perceber o
sentimento de libertação que essa descoberta desperta na jovem geração de
arquitetos dos anos 1920.
É essa
nova linguagem das formas que mais facilmente distingue o funcionalismo do
período anterior e de outros movimentos contemporâneos seus e que congrega o
radicalismo num movimento coeso e unitário quando teorias e posições diferem.
É, também, o estudo de uma nova linguagem da forma arquitetônica, a qual passa
a ser o ponto de partida natural para quem queira analisar o complexo fenômeno
que foi o funcionalismo dos anos 1920. E isso não é o ponto final.
Damn Daniel
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