Escrito por Frank
Svensson e Newton Narciso Gomes Junior
Sexta, 22 de Maio de
2009
Democracia
plena consiste em poder popular exercido por representantes eleitos pelo povo,
não implica somente em eleições livres, mas na prática quotidiana em todos os
setores e níveis da sociedade.
Em Brasília ainda é
proibida a existência de fábricas. Exceção são algumas de alimentos ou de
materiais para a construção civil. Decorre disso não haver um expressivo
proletariado fabril. Em um curso de formação política surgiu a questão:
servidor/funcionário público é proletário? Fica subentendido se estariam
compreendidos na conclamação do Manifesto Comunista de 1848. Que responder?
Moro em Brasília, onde a questão me é especialmente embaraçosa.
Conheci regimes
trabalhistas em que a representatividade considerava sobremodo a centralidade
do fator trabalho, baseando a visão de mundo na vida ativa e produtiva da
sociedade. Já no capitalismo os representantes do povo facilmente declinam de
seu dever transferindo muito do poder de decisão a servidores.
A habilidade
profissional do servidor público é indispensável para fazer cumprir e
concretizar as decisões de dirigentes e políticos eleitos, em defesa dos
interesses e necessidades de quem os elegeu. É freqüente o funcionário
considerar incômoda a participação de outrem na execução dos seus afazeres.
Passa a defender a não-intervenção em seu trabalho, enquanto os representantes
eleitos passam a esquecer de suas verdadeiras obrigações no exercício do poder.
Claro que há normas e regras estabelecidas para ambas as categorias, mas em
tempos de crise são facilmente postas de lado. Acrescente-se a isso que
funcionários não são supervisionados com a mesma intensidade que os seus
representantes. Dificilmente são demitidos ou penalizados, geralmente detêm
estabilidade empregatícia, enquanto que os eleitos têm os olhos de seus eleitores sobre si.
Estamos em 2009. No
início do século XX o movimento trabalhista começou a resolver o impasse da
burocratização da relação entre o povo e seus representantes. Organizações,
partidos, sindicatos e associações passaram a permitir contatos mais diretos
entre eles e o povo ativo e produtivo. Servidores também são trabalhadores e
formam associações em defesa de seus interesses, mas o exemplo histórico é
serem as organizações trabalhistas as que melhor conseguem evitar a
burocratização do serviço público e melhor aproximam o povo de seus dirigentes.
Sou professor
universitário. Sou proletário? A universidade não é um local de produção
material. Nela predomina a produção espiritual e a formação de novos recursos
humanos. Duas faces do mesmo modo de produção. A questão é saber se esta
produção se põe a serviço daquela ou por comodidade só se burocratiza
conservando e reproduzindo o status quo.
O chamamento histórico
da universidade é a produção de conhecimento para a solução dos problemas
candentes da sociedade. Formação e habilitação de recursos humanos para tanto é
atividade necessária, mas subseqüente. Urge empenharmo-nos em garantir o poder
que ao proletariado concerne e não deixar-nos dominar por paragrafólogos
insensíveis às necessidades do povo trabalhador.
Produtores
de conhecimento
A categoria proletário
segue relacionada não só á venda da força de trabalho para o capital, mas à
apropriação indevida
do valor gerado pelo trabalho, garantida pela mediação da exploração.
A construção do
conhecimento é um dos pontos mais complexos na discussão de um tipo peculiar de
trabalho a partir da teoria do valor. Não se trata de um trabalho com
características de geração de valor como de operários, trabalhadores rurais e
afins. O conhecimento fortalece no plano mais geral uma paradoxal situação: por
um lado, se garantido o acesso a ele para a maioria das pessoas contribui para
emancipar o Homem e, logo, o trabalho adquire, ou melhor, retoma seu caráter
emancipador - trabalhar para viver com sentido ao invés de viver para
trabalhar. Por
outro lado, esse conhecimento fortalece, se apropriado pelo capital, as formas
de trabalho morto ao alterar a composição orgânica do capital e desqualificar o
trabalho vivo. É de se notar que mesmo assim a centralidade do trabalho é
mantida.
O papel como servidores
públicos num Estado prisioneiro dos interesses do capital encurta a primeira
possibilidade e expande a segunda, mas, ainda assim, não somos proletários e
sim, parte de um segmento da sociedade salarial que a cada dia se narcotiza na
conveniência dos silêncios e omissões. Como mandatados pelo Estado é nosso
dever trabalhar para todos, guiado no âmbito dos deveres do mesmo pela busca de equidade social.
Frank Svensson,
professor aposentado da Universidade de Brasília, membro do CC do PCB;
Newton
Narciso Gomes Junior é doutor em Políticas Sociais pela UnB e professor
visitante da mesma instituição.
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