Thiago de Andrade é arquiteto formado pela UnB, foi diretor cultural do IAB-DF e atualmente integra o Conselho Superior desse mesmo Instituto.
Oscar nos ensinou que a beleza é um ato político, talvez o
maior deles. Bem aprendido com os gregos, é na beleza da Pólis que se consolida
e se exerce a cidadania. E ele nos deu o sentido espacial da cidadania.
Aprendeu no palácio dos Doges em Veneza, obra do século
XIV-XV, que a modernidade anunciava suas questões invertendo lógicas,
concebendo o novo por meio do espanto. Percebeu que vencer o vão, para além do
desafio técnico, é uma experiência estética.
O arquiteto da intuição plena fez arquitetura erudita.
Pensava profundamente sobre o espaço. Escreveu, editou revistas, fez
esculturas. No fim da vida sintetizou tudo que aprendeu em poucas frases
poéticas que buscavam nos ensinar a complexidade da convivência na sociedade em
que tudo virou objeto, com preço antes de valor.
Desde a contribuição ao Ministério da Educação e Saúde
Pública no Centro do Rio de Janeiro e o projeto da Pampulha em Belo Horizonte
às suas obras internacionais, Oscar colocou a questão da função da beleza,
sempre questionada como fato cosmético e desnecessário, elitista, uma sobra
indesejada num país pobre. Fez ver que não seria a beleza uma decoração de
qualquer ordem, acoplada à arquitetura, e explorou o concreto, reverteu a
geometria mais convencional a novas pesquisas sobre a forma.
Mesmo os edifícios privados, ordinários em sua localização e
programa ganham contornos de sua responsabilidade na forja de um espaço
inusitado e questionador, seja nas curvas do Copan em São Paulo, seja no
contido e modesto edifício da OAB nacional em Brasília. Por onde andou levou a
marca indelével de sua crença no ser humano, na capacidade de mudança social.
No auge de sua contestação e esquecimento voluntário no
Brasil, durante os anos 70 e 80, dedicou-se com mais afinco à prancheta, talvez
ciente de que estava inserido, desde sua vida estudantil, em um constante e
frutífero debate intelectual.
Acompanhado por muitas outras cabeças privilegiadas, esperou
o dia em que as questões colocadas até a construção de Brasília fossem de novo
reverberar na sociedade. Hoje, reflete-se criticamente sobre o movimento
moderno, sintetizando-o em novas proposições contemporâneas. A partir daí,
Oscar Niemeyer atinge o ápice de sua importância internacional quando vira o
arquiteto dos arquitetos. É citado por Zaha Hadid, por Kazuyo Sejima, por
Alvaro Siza, etc., para ficar entre os ganhadores do Prêmio Pritzker, o
equivalente ao Nobel da arquitetura, recebido por Oscar em 1988. Prêmio que
voltamos a ganhar com Paulo Mendes da Rocha em 2006.
Como ele dizia, arquitetura é intuição, e no campo artístico
da intuição arquitetônica somos referência e agora, mais do que nunca, temos
lastro.
O arquiteto ateu nunca temeu a morte, disse que a vida era
um sopro e que somos insignificantes no Universo, mas soube como ninguém que a
morte é o motor da criação, o que nos impele à frente. É uma vida sem criar que
nos mata, Oscar soube que viver seria não parar de criar, nunca.
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