THERE IS SOMETHING BEHIND THE DOOR:
THE BRUTALISM IN PERNAMBUCO
Aristóteles de Siqueira
Campos Cantalice II[2]
As décadas do pós-guerra europeu
foram marcadas por uma nova sensibilidade arquitetônica comumente chamada de 'brutalismo'.
A partir da década de 1960 os arquitetos que atuavam em Pernambuco passaram a
utilizar aspectos dessa sensibilidade construtiva sem descartarem as heranças
modernas locais desenvolvidas particularmente por Delfim Amorim e Acácio
Borsoi. Esse trabalho procura demonstrar quais as obras chave dessa nova
sensibilidade pernambucana e apontar quais os principais aspectos absorvidos e
adaptados pela realidade local entre as décadas de 1960-1980.
Palavras-chave:
Brutalismo, nova sensibilidade, arquitetura pernambucana.
The European
postwar decades were marked with a new architectural sensibility commonly
called 'brutalism'. From the 1960s, the architects who worked in Pernambuco
began using aspects of this construction sensibility without discarding the
local modern heritage developed particularly by Delfim Amorim and Acácio
Borsoi. The paper demonstrates the key buildings of this new Pernambuco
sensibility and points the main aspects that were absorbed and adapted for the local
constructive reality between the 1960s and the 1980s.
Key words: Brutalism, new
sensibility, architecture of Pernambuco.
1. INTRODUÇÃO
As décadas do pós-guerra europeu foram marcadas por uma nova sensibilidade arquitetônica que advogava a exposição direta dos materiais, dos elementos tectônicos, do resgate de materiais tradicionais, da preferência por jogos de volumes mais dinâmicos e do uso extensivo do concreto, numa postura comumente chamada de 'brutalismo'.
As décadas do pós-guerra europeu foram marcadas por uma nova sensibilidade arquitetônica que advogava a exposição direta dos materiais, dos elementos tectônicos, do resgate de materiais tradicionais, da preferência por jogos de volumes mais dinâmicos e do uso extensivo do concreto, numa postura comumente chamada de 'brutalismo'.
A expressão 'brutalismo' foi primeiramente utilizada por Hans Asplund
para caracterizar uma casa projetada por dois colegas suecos em concreto
aparente (BANHAM, 1967, p.10), e logo se tornou corrente nos círculos dos
jovens arquitetos ingleses. O brutalismo foi uma tendência arquitetônica que se
desenvolveu entre as décadas de 1950-1970 e que se expressou a partir da
exposição dos materiais, do resgate aos materiais tradicionais e da adoção de
jogos mais expressivos de volumes. Entretanto, hoje está cada vez mais claro
que nunca houve um estilo brutalista fechado e com intenções programáticas, mas
sim, uma 'nova sensibilidade' construtiva que procurava voltar-se para o saber-fazer
de suas regiões, estabelecendo uma maior relação com a cultura de construção local
como forma de se distanciar do internacionalismo do Movimento Moderno (CURTIS,
1997). É essa visão de brutalismo como uma nova sensibilidade que será adotada nesse
artigo.
Essa nova sensibilidade brutalista permeou a arquitetura mundial de
diversas maneiras e intensidades, e apesar dos jovens arquitetos britânicos
terem priorizado uma linguagem mais industrial - empregando materiais como o
aço e o vidro - o brutalismo teria alcançado expressão mundial por meio do
chamado 'brutalismo corbusiano', que explorava a plasticidade e as texturas do
concreto de maneira vasta. Esses arquitetos procuravam explorar o concreto
bruto como um material 'natural' moldado, creditando sua expressão através das
marcas da atividade humana, com todas as possibilidades de falhas e
contingências possíveis, denotando certo primitivismo.
No Brasil, os arquitetos paulistas destacaram-se com obras que
demonstraram essa nova sensibilidade desde a década de 1950. Esse esforço
culminou na 'escola paulista', movimento que procurava reformular a maneira de
projetar a casa paulistana mediante uma nova divisão espacial interna com grande
ênfase nos espaços sociais em detrimento dos íntimos, além disso, a 'escola paulista'
explorava elementos estruturais, materiais aparentes, e usavam extensamente o
concreto aparente (SANVITTO, 1997), características também encontradas na
arquitetura dessa nova sensibilidade brutalista.
É importante apontar que mesmo essa nova sensibilidade estando
profundamente baseada no primitivismo e na questão da 'verdade dos materiais'
resultante de uma visão poética da realidade de reconstrução de um pós-guerra
cru e rude, o caso brasileiro não poderia ser desconsiderado. Stanislaus von
Moos defende em 'L'Europe après la pluie'
ou le brutalisme face à l'histoire (2013) que vários países que não foram
atingidos pelos bombardeios da guerra também passaram a possuir uma
'arquitetura do pós-guerra'. De acordo com von Moos, isso se deu através de
arquitetos que demonstraram aptidão por esse tipo de arquitetura, como também
por aqueles que viveram a realidade da guerra e que seguiram para outros
países. Na ocasião o autor aponta, entre outros, o caso do Brasil.
Em Pernambuco, a arquitetura moderna se consolidou no início da década de 1950 com a chegada do italiano Mario Russo, do carioca Acácio Gil Borsoi e do português Delfim Amorim. Esses arquitetos - nitidamente influenciados pelo movimento da 'escola carioca' - conseguiram consolidar uma arquitetura moderna bastante adaptada às condições locais, o que levou críticos e historiadores a se referirem a uma 'escola pernambucana' (AMORIM, 2001). No entanto, a partir da década de 1960' novas influências são observadas na arquitetura de Borsoi e de Amorim, que passam a experimentar aspectos dessa 'nova sensibilidade' em sua arquitetura. Estava sendo dado, naquele momento, um novo rumo à produção local que - arquitetônica e culturalmente - viria a mudar a arquitetura pernambucana.
2. EXISTE ALGO ATRÁS DA PORTA
Para um melhor entendimento de como a nova sensibilidade brutalista passou a influenciar Borsoi e Amorim, é necessário analisar mais a fundo as circunstâncias que levaram cada um deles a projetar as duas obras chave que são vistas como pioneiras dessa nova sensibilidade em Pernambuco.
Em Pernambuco, a arquitetura moderna se consolidou no início da década de 1950 com a chegada do italiano Mario Russo, do carioca Acácio Gil Borsoi e do português Delfim Amorim. Esses arquitetos - nitidamente influenciados pelo movimento da 'escola carioca' - conseguiram consolidar uma arquitetura moderna bastante adaptada às condições locais, o que levou críticos e historiadores a se referirem a uma 'escola pernambucana' (AMORIM, 2001). No entanto, a partir da década de 1960' novas influências são observadas na arquitetura de Borsoi e de Amorim, que passam a experimentar aspectos dessa 'nova sensibilidade' em sua arquitetura. Estava sendo dado, naquele momento, um novo rumo à produção local que - arquitetônica e culturalmente - viria a mudar a arquitetura pernambucana.
2. EXISTE ALGO ATRÁS DA PORTA
Para um melhor entendimento de como a nova sensibilidade brutalista passou a influenciar Borsoi e Amorim, é necessário analisar mais a fundo as circunstâncias que levaram cada um deles a projetar as duas obras chave que são vistas como pioneiras dessa nova sensibilidade em Pernambuco.
Entre 1959 e 1960 Borsoi foi contemplado com uma bolsa do Itamaraty e foi
a Europa, onde teve contato com obras de arquitetos como Le Corbusier, Arne
Jacobsen, Alvar Aalto e James Stirling, além de visitar países como Inglaterra,
França, Suécia, Dinamarca e Finlândia (BORSOI, 2001). Na viagem ele teve a
oportunidade de contemplar essa arquitetura do revisionismo do pós-guerra que
estava em voga no pós-guerra europeu.
Quando Borsoi retorna dessa viagem, percebe-se que essa nova sensibilidade
passa a ganhar mais espaço em sua obra em detrimento da linguagem mais
influenciada pela 'escola carioca' dos anos 1950'. Borsoi passa a priorizar uma arquitetura mais
relacionada com a questão dos detalhes, dos materiais, e da cultura de
construção local. Além disso, em 1963 Borsoi faz outra viagem, dessa vez para
os Estados Unidos, onde tem contato com a obra de Louis Kahn, Paul Rudolph,
Marcel Breuer, entre outros (NASLAVSKY; AMARAL, 2003, p.11). Essa nova viagem
serve para reforçar ainda mais esses novos princípios que são almejados por ele.
Em 1960 Borsoi
projeta o Edifício Santo Antônio[3]
(finalizado em 1962), onde explora a questão do detalhe com mais afinco já
inspirado nessa 'nova sensibilidade' arquitetônica do período. De fato, o Santo
Antônio é indicado como o projeto que marcou uma fase de mudanças na obra de
Borsoi, pois sua ... produção da década de 1960 apresentou várias características que podem
ser associadas aos princípios da filosofia Estruturalista e do movimento do
Novo Brutalismo (AMARAL, 2004, p.93).
O Santo Antônio é um
pequeno edifício de escritórios com 04 andares e comércio no térreo, construído
nos fundos do terreno de um Convento Franciscano. A fachada frontal do edifício
é poente e exige certos cuidados, fazendo com que o arquiteto desenvolva uma
película de cobogós de concreto solta das esquadrias de vedação, as quais
contem as aberturas, gerando um espaço intermediário para filtragem do sol.
O edifício possui dois aspectos principais
que o apontam como um dos primeiros modelos a adotar características
brutalistas em Pernambuco. O primeiro diz respeito à vestimenta externa do
edifício - confeccionada de cobogó e que descansa na face limítrofe da
edificação, solta das esquadrias principais - que tem a finalidade de proteger
a edificação do forte poente nordestino (Fig.01). Essa vestimenta torna o
prédio fechado e introspectivo, semelhante às soluções da 'escola paulista', e
é confeccionada através de um sistema de cobogós desmontáveis idealizadas por
Borsoi que parte do principio de duas peças tipo macho e fêmea. A peça fêmea
possui dois sistemas de encaixes, um na parte frontal, e outro na parte
posterior, fazendo com que as placas (macho) oscilem entre o plano frontal e
posterior, gerando um interessante jogo de reentrâncias e saliências e
permitindo a melhor entrada da luz e do vento (Fig.02).
Fig. 01: Edifício Santo Antônio, Acácio Gil Borsoi, 1960-62. Foto do autor.
O segundo aspecto diz respeito ao
trato dos materiais internos. O
hall possui os elevadores e as
escadas em volta de um fosso com uma claraboia, e o revestimento de suas
paredes é de tijolo aparente com um trecho contendo um painel artesanal de
tijolos recortados, recuados e salientes, de autoria do próprio Borsoi (Fig.03).
A escada tipo espinha de peixe (Fig.04) é confeccionada levemente solta da
parede lateral, demonstrando individualidade estrutural tanto nessa questão
quanto no trato dos materiais. Esse conjunto denota um sentimento de leveza e
ao mesmo tempo de rusticidade, que demonstra influências de edificações dessa
nova sensibilidade inglesa, principalmente pelo emprego do concreto e do tijolo
aparente.
Fig. 04: Escada do Edifício Santo Antônio. Foto: Ana Cantalice.
Ainda em relação ao segundo aspecto - da questão do trato dos materiais - é possível perceber que nas circulações internas das salas de escritório, quando o arquiteto propõe paredes curvas em tijolo aparente com uma seteira central e com portas pivotantes, o faz com extremo cuidado. A solução do assentamento dos tijolos é pensada a um nível construtivo tal que Borsoi elabora um sistema de pontalete curvo para o passo do tijolo e um sistema de separadores. Esse sistema possibilita o perfeito assentamento do tijolo em uma solução não usual, como da parede curva, em que a mão de obra local poderia fazer cortes indevidos no tijolo caso não recebesse as orientações pertinentes. Essa solução resgata princípios básicos relacionados ao entendimento da feitura da construção pelo arquiteto, que como um artífice desenvolve as próprias ferramentas para a concepção de seus objetos através da compreensão de como a obra deve ser erigida (SENNETT, 2009), fato inclusive explorado por Banham (1967) e Heinle & Bächer (1967) como um dos aspectos do brutalismo.
Assim como Borsoi, Amorim também fez viagens. Em 1957 ele
retornou a Europa, onde, de acordo com Naslavsky (2004, p.180), passa por uma
profunda reflexão arquitetônica, além de ter viajado a São Paulo, para visitar
obras de Artigas e de outros arquitetos da 'escola paulista'. Amorim passou a
demonstrar características desse revisionismo do pós-guerra em sua arquitetura
principalmente a partir do Edifício do Seminário do Nordeste[4]
(1962), que é considerado outro projeto pioneiro na utilização de aspectos
dessa nova sensibilidade brutalista. O projeto foi implantado em uma Gleba com
diversos desníveis que fizeram com que Amorim sugerisse o formato de ‘S’, numa
espécie de implantação que procura se adequar a um platô mais ou menos plano,
mas devido aos declives do terreno, em diversas partes da edificação formam-se
poços semienterrados onde Amorim propõe áreas de prática de esportes e
circulação interna.
O volume da edificação acaba por assemelhar-se a algumas
implantações de conjuntos como o de Pedregulho (1946-52) de A. E. Reidy. Na
extensão da edificação, as salas dos seminaristas são em sentido longitudinal,
alcançados por extensos corredores nas extremidades voltadas para o platô,
deixando as janelas dos compartimentos voltadas para o vale posterior. O acesso
principal à edificação é marcado por um volume vertical em tijolo aparente
maciço e portante, que saca da estrutura principal, e por uma grande malha de
cobogós robustos em concreto, que assentados e amarrados na estrutura de concreto
(Fig.05), guardam semelhanças em proporção com diversos projetos internacionais
do pós-guerra, como o da Saint John
Church (1953), do arquiteto Marcel Breuer e Hamilton Smith.
Fig. 05: Acesso
principal do Edifício do Seminário do Nordeste, Delfim Amorim e equipe, 1962.
Foto do autor.
Fig. 06: Vista da circulação
externa com os
andares e os consoles que sacam da estrutura principal. Foto do autor.
Fig. 07: Detalhe dos
consoles de concreto e das vedações em tijolo do Ham commom flats, James Stirling, 1955. Foto do autor.
3. A NOVA SENSIBILIDADE EM PERNAMBUCO
A partir das duas obras chave de Amorim e Borsoi, o reconhecimento desse novo metier em projetar começava a ebulir em Pernambuco. Além disso, o fato de Amorim e Borsoi lecionarem as disciplinas de 'projeto arquitetônico' na UFPE contribuiu para a experimentação dessa nova sensibilidade em aula, com os futuros arquitetos pernambucanos.
A partir das duas obras chave de Amorim e Borsoi, o reconhecimento desse novo metier em projetar começava a ebulir em Pernambuco. Além disso, o fato de Amorim e Borsoi lecionarem as disciplinas de 'projeto arquitetônico' na UFPE contribuiu para a experimentação dessa nova sensibilidade em aula, com os futuros arquitetos pernambucanos.
Além da influência de Amorim e Borsoi, os arquitetos dessa 'nova geração'
de formados também sofreram influências externas, primeiramente dos recentes
exemplares da 'escola paulista', que não deixaram de influenciar a cena local, principalmente
por meio de publicações e de visitas empreendidas no início da década de 1960, quando
muitos arquitetos dessa segunda geração (ainda estudantes), fazem visitas guiadas
principalmente por Amorim a São Paulo. No entanto, as influências
internacionais foram ainda mais profundas e ocorreram principalmente por meio
das publicações internacionais disponíveis em Pernambuco notadamente a partir
de meados da década de 1960, principalmente de livros da editora Gustavo Gili
como: El brutalismo en arquitectura:
Etica o estética (1967) de Reyner Banham; Construcciones en Hormigon Visto (1967) de Bächer & Heinle; Marcel Breuer: Nuevas Construcciones y
Proyectos (1970) de Tician Papachristou, entre outros[5]. Além
disso, houve as viagens que alguns desses fizeram aos Estados Unidos e Europa
ao longo da década de 1960, demonstrando que a atuação dos arquitetos
pernambucanos estava sintonizada com os temas vivenciados pela arquitetura
internacional naquele momento.
Os arquitetos dessa nova geração pós Borsoi e Amorim foram os que mais demonstraram solidariedade com essa nova sensibilidade na arquitetura pernambucana. Através da busca por uma poética da construção fortemente influenciada pelo saber-fazer local e pela tecnologia acessível, essa geração foi marcada pelo início da difusão mais extensa da arquitetura europeia e da arquitetura paulista no cenário recifense.
Os arquitetos dessa nova geração pós Borsoi e Amorim foram os que mais demonstraram solidariedade com essa nova sensibilidade na arquitetura pernambucana. Através da busca por uma poética da construção fortemente influenciada pelo saber-fazer local e pela tecnologia acessível, essa geração foi marcada pelo início da difusão mais extensa da arquitetura europeia e da arquitetura paulista no cenário recifense.
Dentre os arquitetos locais que se utilizaram dessa nova sensibilidade
durante a década de 1960 e 1970 podemos citar os pioneiros Acácio Borsoi e
Delfim Amorim. Assim como os discípulos de primeira e segunda geração de Amorim
e Borsoi como Heitor Maia Neto, Frank Svensson & Marcos Domingues, Glauco
Campello, Reginaldo Esteves, Mauricio Castro, Dinauro Esteves, Vital Pessoa de
Melo, Armando de Holanda, Wandenkolk Tinoco, Alexandre Castro e Silva, Jerônimo
& Pontual, Roberto Soares, entre outros. Esse subitem tem a finalidade de olhar
de maneira teleférica a obra de cada um deles, demonstrando as principais
contribuições que guardam relação com a nova sensibilidade.
Fig.08: Edf. BANCIPE ao lado da Igreja Matriz de Santo Antônio, Acácio Borsoi e Vital Pessoa de Melo, 1963. Foto do autor.
Fig.09: Edf. BANDEPE, Acácio Borsoi, Gilsom Miranda e Janete
Costa, 1969. Foto do autor.
Fig.10: Vista da varanda com os 'pilares brises' do Fórum de Teresina, Acácio Borsoi, 1972. Foto do autor.
Fig.11: Ministério da Fazenda de Fortaleza, Acácio Borsoi, 1975. Foto do autor.
Fig.12: Casa Alfredo P. Correia, Delfim Amorim &
Heitor Maia Neto, 1969. Foto do Autor.
Fig.13: Casa Miguel Doherty, Delfim Amorim & Heitor
Maia Neto, 1969. Foto do autor.
Fig.14: Residência Paulo
Meirelles, Svensson & Domingues,1968. Foto do autor.
Fig.15: Vista do pátio central da
Sede da Rede Ferroviária, Svensson & Domingues,1970. Foto do autor.
Fig.16: Vista do prédio principal
da Sede da Rede Ferroviária. Foto do autor.
Fig.17: Vista do pátio interno com uma
passarela ao fundo do CAC-UFPE. Reginaldo Esteves, 1973. Foto do autor.
Glauco Campello - nascido na Paraíba e formado em 1959 na Faculdade Nacional de Arquitetura do Rio de Janeiro - foi outro importante arquiteto da cena pernambucana. Campello projetava aliando a expressão dos materiais crus com demais características predominantes da cultura de construção local. Entre os projetos de sua autoria podemos citar: o prédio sede da SUDENE - Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste[10] (1967), onde a pesada base de concreto armado com pilares generosos suporta um volume superior com leve curvatura (Fig.18). Esse volume possui empenas laterais revestidas em cerâmica enquanto a face nascente é vazada por esquadrias e a poente é totalmente vazada em cobogó de placas de concreto que permitem que a edificação respire permanentemente (Fig.19); além do projeto de sua Residência (1967); e do Edifício Oasis (1970).
Fig.18: SUDENE, Glauco Campello, Mauricio
Castro e equipe, 1967. Foto do autor.
Fig.19: Detalhe da fachada de
cobogó. da SUDENE. Foto do autor.
Vital Pessoa de Melo - que no período de faculdade foi aluno tanto de
Amorim quanto de Borsoi - também foi outro arquiteto que produziu obras de
considerável valor na época. Em seu período de estudante Vital fez uma viagem
com Delfim Amorim a São Paulo, onde conheceu a arquitetura da 'escola paulista'.
Logo após sua formação em 1961, desenvolveu uma parceria com Borsoi (Edf.
BANCIPE, 1963), e com Reginaldo Esteves (sede da CELPE, 1972). Entre as obras que
demonstram traços dessa nova sensibilidade podemos citar: o projeto de sua
Residência (1968), que utilizou os elementos construtivos de maneira a gerar
planos marcantes, trabalhando com materiais brutos e ásperos, através de fortes
texturas em variados tons como o do concreto liso, o das placas de concreto
rugosas com acabamento lavado quando em processo de cura, o da laje nervurada
com blocos de cerâmica aparente, e o da parede com chapisco grosso pintada de
branco, que juntamente com o fechamento da casa para a rua conferem um tom
austero e introspectivo que relembra a posição da 'escola paulista' (Fig.20);
além do projeto da CELPE[11]
(1972), onde procurou utilizar a solução do brise-soleil
em peças de concreto aparente como principal elemento de composição de fachada
com a finalidade de proteger a vestimenta de vidro da fachada interna (Fig.21).
Fig.20: Vista frontal
demonstrando os planos em materiais diversos da Casa do Arquiteto, Vital Pessoa
de Melo, 1968. Foto do Autor.
Fig.21: Vista da fachada frontal
com os brises de proteção da CELPE, Vital Pessoa de Melo e Reginaldo Esteves,
1972. Foto do Autor.
Armando de Holanda - que ingressou na Faculdade de Arquitetura de Recife
em 1959 e estagiou com Glauco Campello - logo foi à Brasília fazer
pós-graduação na UnB. Holanda ingressou como professor na Faculdade de
Arquitetura de Recife em 1970, e em 1976 publicou um importante livro para os
arquitetos pernambucanos o Roteiro para
se Construir no Nordeste (HOLANDA, 1976), que condensa as ideias projetuais
já adotadas pelos arquitetos locais para o desenvolvimento de uma arquitetura correta
no clima nordestino. Entre suas obras que guardam congruências com a nova
sensibilidade podemos citar: a do Parque Nacional dos Guararapes (1973-76),
onde trabalhou com finas cobertas de concreto em formato de hiperbólicas
invertidas (Fig.22); a do Edifício Bougainville (1973), que com vedações
verticais em tijolo aparente numa solução bastante espartana propõe varandas
com base em cobogó e peitoris ventilados, com a finalidade de resolver os
problemas de controle climático (Fig.23); além da casa Nilo Coelho (1976).
Fig.22: Bloco das lanchonetes do Parque
Nacional dos Guararapes, Armando de Holanda, 1973-76. Foto: Ana Cantalice.
Fig.23: Detalhe das varandas do Edifício
Boungainville, Armando de Holanda, 1973. Foto: Ana Cantalice.
Entre outros arquitetos que tiveram obras que demonstram certa
solidariedade com os princípios da sensibilidade brutalista, podemos citar: Jerônimo
& Pontual, que projetaram o Edifício da IBM (1970-71) e o Edifício Sparta
(1972), esse ultimo suportado por dois grandes pilares de concreto nas
extremidades e que possui um fechamento superior de forte impacto plástico na
forma de um grande balanço em concreto (Fig.24); Alexandre Castro e Silva, que
projetou a Residência Francisco Pedrosa (1974) e o Edifício Tiberius (1975);
Dinauro Esteves, que projetou a sede da CHESF - Companhia Hidrelétrica do São
Francisco[12] (1975),
que possui imponentes sheds de
iluminação nas circulações verticais que demonstram essa procura pelo
expressivo trabalho das aberturas típico da revisão do pós-guerra (Fig.25);
além de Wandenkolk Tinoco; Roberto Soares; Geraldo Santana, entre outros.
Fig.25: Detalhe dos sheds
de iluminação da circulação vertical da CHESF, Dinauro Esteves e Mauricio
Castro, 1975. Foto do autor.
É importante apontar que as obras exploradas neste artigo não procuram evidenciar
uma postura projetual pernambucana caracterizada somente a partir dessa nova
sensibilidade brutalista, mas sim uma posição solidária a essa arquitetura do
revisionismo do pós-guerra. Ao se analisar as obras dos arquitetos citados é possível
perceber que essa solidariedade aparece principalmente através de três
características: a primeira é uma relação mais expressiva com a plástica da
edificação, que alcança forte expressão através de reentrâncias, saliências e
componentes construtivos (brises, pérgolas, gárgulas, cobogós, volumes de
circulação vertical e de caixas d´água); a segunda é uma posição mais radical
com os materiais e texturas, que passam a ser tratados denotando uma 'verdade
dos materiais' que alcança expressão através de propostas - muitas vezes
pioneiras - de texturas impressas no concreto e do emprego do tijolo aparente e
de outros materiais deixados sem demãos ou revestimentos; e a terceira, que é
representada através do estudo das soluções estruturais, que alcançam expressão
através da evidência da estrutura como componente plástico, e que também
contribuem para a forma final da edificação.
Tais arquitetos absorveram essa sensibilidade brutalista da época, seja através
de imagens de livros internacionais, das viagens, da arquitetura paulista ou dos
pioneiros Borsoi e Amorim, no entanto, o fizeram relacionando-a com uma posição
projetual que procurava a proteção do clima quente e a adequação ao saber-fazer
local, afastando-se de um principio norteador fechado e com intenções
programáticas como acontecia no Movimento Moderno. Os resultados alcançados nas
obras pernambucanas desse período abarcam a pluralidade de visões dos
projetistas locais e aproximam-se da definição de Curtis (1997, p.530-531) de
um realismo que se apoia no desenvolvimento de uma arquitetura frouxa de
amarras sociais e que procura significados culturais mais profundos através da
exposição dos materiais. Ao olharmos essa nova sensibilidade brutalista através
desse caleidoscópio - de poética construtiva, verdade dos materiais, e
identidade local - a produção pernambucana se solidarizava perfeitamente com
ele.
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Aristóteles de Siqueira Campos Cantalice II
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km 19 - Condomínio Haras de Aldeia - Passo fino, Q-F L-02, Paudalho-PE, cep
55825-000
Cel.
(81) 9953.4084 cantalice2@gmail.com
[1] Trabalho
elaborado com base na dissertação de mestrado intitulada Um Brutalismo Suave: Traços da arquitetura em Pernambuco (1965-1980),
defendida pelo autor no MDU-UFPE em 2009.
[2] Arquiteto
pela FAU-PE. Mestre em ambiente construído pelo MDU-UFPE. Doutorando pelo
MDU-UFPE. Pesquisador visitante do dARQ-FCTUC (Portugal). Professor UNIFAVIP e
FBV.
[3] O
projeto e a construção foram feitos em parceria com o arquiteto Wilson Nadruz.
[4]
Delfim Amorim convidou
Marcos Domingues, Florismundo Lins e Carlos Correa Lima para integrar a equipe
de arquitetos (NASLAVSKY, 2004).
[5] Afirmação
do arquiteto e professor Luiz Lacerda que pertenceu a essa segunda geração de
arquitetos formados por Amorim e Borsoi em entrevista ao autor em 22 de
fevereiro de 2008.
[8] Reconhece-se na obra de
Reginaldo Esteves três fases distintas. A primeira sobre influência da Escola
Carioca; a segunda marcada por uma tentativa de aliar tradição e modernidade e
a terceira conhecida como sua fase do concreto (AMORIM, 1999, p.95).
[9] Em
colaboração com Vital Pessoa de Melo.
[10] Em
colaboração com Mauricio Castro e equipe.
[11] Em
colaboração com Reginaldo Esteves.