sábado, 28 de dezembro de 2013

NOVAS VILAS PARA O BRASIL COLÓNIA Planejamento espacial e social no século XVIII Parte IV

Roberta Marx Delson

Tradução: Fernando de Vasconcelos Pinto

Roberta Marx Delson, nascida na cidade de Nova York, recebeu o seu MA (Master of Arts, mestrado em Ciências Humanas) e o seu PHD (Philosophy Doctor, doutorado) em Estudos Latino-Americanos e História na Universidade de Colúmbia. Lecionou na Universidade Estadual de Rutgers (em New Brunswick, estado de Nova Jersey) e na Universidade de Princeton (em Nova Jersey), e tem trabalhado como consultora em programas de estudos latino-americanos e também para o Serviço do Patrimônio Histórico do Estado de Nova Jersey. Atualmente é lente da Academia da Marinha Mercante dos Estados Unidos. Suas obras publicadas compreendem o presente livro, cuja edição original em inglês, data de 1979, Readings on Caribbean History and Economics (Conferências sobre a História e a Economia do Caribe, 1980) e Industrialization in Brazil: 1700-1830 (1991), esta em coautoria com John Dickenson, bem como muitos artigos especializados. Presentemente está elaborando The Sword of Hunger: A Latin-American History (A Espada da Fome: Uma História da América Latina), conjuntamente com o eminente brasilianista Robert M. Levine.


A expansão da autoridade: Novas Vilas no Centro e no Oeste

Sem dúvida, o maior desafio enfrentado pelos portugueses foi implantar os novos padrões urbanos nas regiões de mineração do Centro e na fronteira do extremo Oeste do País. Ali, os bandeirantes e outros mineradores tinham tomado a iniciativa na formação de comunidades, juncando os distritos de mineração de acampamentos construídos atabalhoadamente. O historiador da arquitetura Sylvio de Vasconcellos, que estudou a fundo as origens dos centros urbanos de Minas Gerais, descreve esses primeiros aglomerados de barracos como de configuração linear, com elementos dispersos, sem nenhum centro de polarização definido.1  Em geral as ruas desses vilarejos eram simplesmente as estradas que passavam pela região, e não pistas especialmente construídas. As suas casas normalmente eram do tipo improvisado, muitas vezes não passando de barracos levantados para ocupação provisória. Tais casas, como Cassiano Ricardo observou com humor, estavam comprometidas com o movimento; a única coisa que as cabanas não faziam era caminharem junto com seus moradores.2

O arraial de Sumidouro, fundado pelo chefe de bandeira Fernão Dias Pais Leme, é um ótimo exemplo dos acampamentos de mineradores dispersos em Minas Gerais. Ocupado originariamente em 1675, Sumidouro futuramente desempenharia o papel de ponto de arrancada para a exploração ulterior dos planaltos colinosos auríferos. Todavia, um mapa do arraial de 1732 3  mostra claramente que Pais Leme não construiu o seu campo com vistas a permanecer (Figura 3). Conquanto esse mapa represente visivelmente um estágio mais avançado do desenvolvimento da povoação, ele realmente demonstra que as linhas gerais do crescimento de Sumidouro resultaram da sua fundação fortuita. Por exemplo, o terreno em que o acampamento se situava é mostrado no mapa como ondulado e cheio de arbustos, e, consequentemente, as edificações parecem dispostas em níveis diferentes; observam-se vários lotes cultivados localizados em áreas mais elevadas que o resto da comunidade. A povoação compõe-se de umas poucas edifica-ções de dimensões variadas enfileiradas ao longo da única rua do arraial, sem nenhuma preocupação perceptível de alinhamento ou disposição sistemática. Apenas a praça da igreja mostra alguma unidade arquitetural, e assim mesmo porque esse prédio importante é o único a ocupar um espaço amplo e não definido por alguma outra circunstância.

Contudo, seria errôneo concluir, como geralmente se crê, que se permitiu que todas as povoações interioranas dessa região se desenvolvessem desordenadamente como Sumidouro. Quando a descoberta de ouro no interior abriu os olhos dos portugueses para a riqueza potencial do sertão, houve uma tentativa quase imediata de controlar o crescimento urbano. Poderosos chefes de bandeiras eram persuadidos a servir de exemplo para seus homens mediante a promessa de nomeação para o posto de alcaide-mor (prefeito) da comunidade onde eles resolvessem estabelecer-se. Além desse apelo à vaidade, a Coroa também esperava fixar os antigos desbravadores erradios pela garantia de que os bandeirantes que estabelecessem residência nas povoações seriam dispensados de pagar foros (impostos).

Essa mesma legislação que oferecia vantagens inéditas aos bandeirantes também continha algumas diretrizes para a criação de futuras aldeias na região. Os fundadores dessas comunidades deveriam procurar sítios saudáveis, próximos de rios e de fontes de água boa, com terreno propício e a pouca distância das minas de ouro.5 A localização das futuras povoações já não podia ser deixada à discrição dos colonos; a Coroa era favorável à escolha judiciosa de lugares que apresentassem claras potencialidades de evoluírem para comunidades permanentes. Ademais, Lisboa estipulava que esses novos centros deveriam localizar-se perto de achados de ouro recentes, porque a proximidade das escavações significava que se poderia exercer uma fiscalização rigorosa sobre o ouro extraído.
Estranhamente, nessa ordem inicial não se fez nenhuma referência a um traçado urbano, o que dá a entender que a preocupação primordial nessa região era literalmente fixar os errantes, e não criar comunidades ordenadas. Poucos mineradores se davam ao trabalho de pedir permissão oficial para fundar novos arraiais. Em todo caso, seguir os trâmites burocráticos muitas vezes revelava-se um procedimento demorado e complicado. Um caso que ilustra bem isso foi o requerimento de Garcia Ruiz Paes para fundar uma povoação à margem do rio Paraíba do Sul, em retribuição aos seus serviços por ter aberto a estrada entre o Rio de Janeiro e os Campos Gerais. A permissão foi concedida a título precário em 1711,6 porém quatro anos depois o Conselho Ultramarino ainda não se havia decidido a permitir .a Paes dar início às obras.7  Indiscutivelmente, essas delongas administrativas tinham um efeito negativo, desencorajando outros a buscarem o aval da Coroa para iniciarem novas comunidades.

Em face disso, compreende-se facilmente por que, apesar das intenções em contrário da Coroa, a maioria das comunidades que foram oficialmente reconhecidas e tituladas como vilas na segunda década do século XVIII deveram a sua origem, não ao patrocínio oficial de arraiais, mas sim ao crescimento natural de acampamentos de mineração não planificados que já haviam proliferado na região. Conquanto oito dos primitivos acampamentos de bandeirantes fossem promovidos à categoria de vila entre os anos de 1711 e 1718, nenhum deles teve o privilégio de ser fundado por iniciativa do governo.8

Todas essas novas vilas, sem exceção, obedeciam às características gerais dos arraiais de Minas Gerais supra descritos: agrupamentos lineares de casas dispersas. Mesmo assim, a criação de oito novas vilas era parte integrante do programa do governo de levar administradores oficiais às áreas de mineração. Exigia-se que cada nova vila subvencionasse, por intermédio da tesouraria da câmara municipal, a construção de uma cadeia segura e do prédio da intendência municipal.9  Posteriormente, as vilas assim constituídas sediariam casas de fundição, escritórios de contabilidade e residências oficiais de coletores de impostos do governo. Desse modo, as novas vilas funcionavam como pontos de irradiação dos serviços de supervisão governamentais.

Apesar do surgimento da planificação estatal no Nordeste, o crescimento dessas comunidades foi deixado sem controle nessa fase. A responsabilidade pelos melhoramentos urbanos em Minas Gerais era exclusivamente da alçada dos governos locais, e alguns deles conheciam perfeitamente as novas normas urbanas. Assim foi que, em 1714, aproveitando a oportunidade da destruição de Ouro Preto por um incêndio, a câmara local determinou que, no futuro, as casas das ruas que dessem na praça principal seriam medidas e alinhadas, a fim de criar uma vista de conjunto mais regular na parte central da vila.10  Dois anos antes, a câmara tinha decretado que todos os que quisessem construir dentro do perímetro da vila tinham de obter uma permissão prévia do governo municipal, de modo que as novas ruas pudessem ser construídas em alinhamento reto.11 Entretanto, como observou o historiador mineiro Sylvio de Vasconcellos, a câmara estava travando uma batalha árdua, pois a topografia acidentada e cheia de morros de Ouro Preto impossibilitava o traçado de ruas retas, tornando assim o planejamento global extremamente difícil.12

Enquanto a região sul-central de Minas Gerais começou assim a assumir um caráter quase urbano, a geração seguinte de exploradores bandeirantes penetrou para o oeste, em direção a Goiás e Mato Grosso, na busca contínua de riquezas minerais. Embora em 1682 13  já houvesse indícios de ricos filões de minerais na zona do rio Vermelho, o verdadeiro estímulo para o povoamento dessa vasta região só veio na segunda década do século XVIII, quando finalmente a expedição de Pascoal Moreira Cabral descobriu ouro na proximidade do ribeirão do Coxipo. Entre 1716 e 1719, os descobridores dessa nova zona aurífera erigiram uma capela e iniciaram uma modesta povoação que constituiu o núcleo do que uma década depois viria a ser a vila de Cuiabá.14  A maioria das trilhas que serpeavam pela aldeia seguiam em direção ao rio Cuiabá, junto ao qual a povoação cresceu; a configuração da comunidade apenas acompanhava as irregularidades da topografia. As casas espalhavam-se a touxe-mouxe, e mesmo a igreja paroquial não passava de uma simples cabana com um teto de palha precário.15

Apesar de tudo isso, em 1727 essa aglomeração miserável de simples casas foi agraciada, na devida forma, com o título de vila portuguesa, sob a auspiciosa denominação de Bom Jesus de Cuiabá (Figura 4).16   O princípio que norteou aquilo que à primeira vista parece uma medida prematura e incorreta baseava-se numa circunstância decisiva: Cuiabá era a única aglomeração urbana de toda a região Oeste. Nessas condições, os portugueses enfrentavam um dilema complicado: ou a diminuta aglomeração de Cuiabá deveria ser reconhecida como centro administrativo, ou então seria preciso construir uma nova vila. Como a Coroa estava desejosa de controlar o fluxo de ouro dessa zona recém-aberta, e como o custo da constituição e aparelhamento de uma equipe para construir uma nova comunidade nessa região remota teria sido exorbitante, os portugueses viram-se obrigados a aceitar a urbanização nas condições dos bandeirantes, finalmente elevando devidamente o povoado à condição de vila.
Planta básica de Cuiabá, Mato Grosso, 1777.

Porém havia sido atingido um ponto crítico, porquanto a criação da vila de Cuiabá demonstrava o compromisso sério da Coroa com o desenvolvimento planejado do Oeste. A partir de 1727, exigiu-se que os administradores tomassem todas as providências possíveis para reter a escassa população,17 mesmo em zonas não produtoras de ouro, ao passo que Lisboa, além disso, ordenou que se estabelecessem registros de censos, a fim de obter dados sobre as zonas em que existissem vazios demográficos.18  As futuras povoações teriam de se submeter às exigências de planejamento, agora aceitas naturalmente no Nordeste. Em nenhum outro caso essa mudança de atitude foi mais evidente do que no processo de criação da localidade real destinada a ser a capital da capitania de Goiás.

Até os anos 1730, Goiás ainda não havia sido explorado sistematicamente. O interesse pela região só foi despertado quando o bandeirante Bartolomeu Bueno da Silva, o Anhangüera (diabo velho, em tupi) regressou a São Paulo em 1725, espalhando histórias de achados fabulosos de ouro na região situada entre Minas Gerais e Mato Grosso.19  Pelo ano de 1736 havia sido aberta uma trilha por terra entre Cuiabá e Goiás, a qual finalmente se ligava ao Rio de Janeiro, e os portugueses receavam que ela se transformasse numa importante estrada do contrabando.20  Diante de mais uma situação potencialmente incontrolável, as autoridades, incontinenti, ordenaram o governador de São Paulo, o Conde de Sarzedas (sob cuja jurisdição estava o território recém-aberto), a seguir imediatamente para o interior de Goiás.21  O superintendente da região resumiu o ponto de vista oficial ao proclamar que

unicamente por meio da fundação de vilas e do estabelecimento nelas da administração governamental, esses homens que perambulam sem destino através desses campos auríferos podem ser controlados, sendo inconveniente deixá-los vaguearem sem vigilância, por causa das desordens que podem cometer.22

Movido por essas convicções, em 1736 Sarzedas partiu para as minas do rio Vermelho (afluente do Araguaia), munido de cópias da legislação de planejamento urbano que o orientariam na criação eficiente de uma nova vila. Cópias das ordens para a formação da vila de Goiás haviam sido enviadas antecipadamente tanto a Sarzedas como ao superintendente.23  Provavelmente o governador teria agido com toda presteza, se a sua viagem não tivesse sido interrompida pela sua morte inopinada em Meia Ponte, em fevereiro de 1737.24

A administração interina que se seguiu ao falecimento de Sarzedas fez poucos progressos no sentido de criar a vila de Goiás. Só quando Dom Luís de Mascarenhas assumiu o governo é que as ordens foram finalmente cumpridas. Chegando ao território problemático em julho de 173925, Mascarenhas decidiu estabelecer a nova capital no arraial de Santa Ana, embora o de Meia Ponte, próximo, tivesse pleiteado a sede da vila,25  e em dezembro de 1739 a recém-organizada Câmara de Vila Boa de Goiás pôde declarar oficialmente que a vila havia sido inaugurada.27

Como o seu antecessor falecido, Mascarenhas sem dúvida levou consigo uma cópia da legislação, de planejamento urbano. As ordens de 1736 requeriam a criação de uma comunidade segundo o modelo retilíneo prescrito. Elas diferiam das ordens para a fundação de Icó, do mesmo ano, apenas no destaque à uniformidade das fachadas das edificações e na prescrição de que, trilai raio de seis léguas da vila, os habitantes só podiam receber meia légua quadrada de terra.28 Essas duas diferenças são compreensíveis em face da função específica de cada uma das duas comunidades. Vila Bela destinava-se a ser uma capital regional e, por isso, devia ter uma aparência consentânea com o seu papel. Icó, por sua vez, era apenas uma estação de parada na estrada comercial cearense. Assim sendo, por um lado, não era imperativo que essa vila se sujeitasse estritamente ao ideal de simetria predominante; por outro lado, certamente era possível atribuir mais terra aos colonos icoenses, menos numerosos, que aos da nova vila goiana, considerando-se ainda que a região de Goiás era particularmente mais lucrativa.

Pela documentação existente, percebe-se que Mascarenhas seguiu as ordens referentes à construção dos prédios públicos necessários, mas foi negligente em exigir o cumprimento do padrão reticular no traçado das ruas.29  Dessa forma, compreende-se por que muito depois, na década de 1770, foram expedidas ordens recomendando que fosse estabelecido um plano diretor para Vila Boa a fim de futuramente evitar   a mesma irregularidade... com que os fundadores da Capital haviam construído os prédios, estragados pela falta de alinhamento.30 Uma planta da cidade em 1783 indica que, enquanto o núcleo central apresentava uma falta de ordem, os lotes de edificações recém-delineados seguiam estritamente um padrão de malha ortogonal (Figuras 5A e 5B).31
Planta básica de Villa Boa - Goiás, 1782

As leis de planificação urbana foram postas em prática com maior fidelidade na construção de Vila Bela da Santíssima Trindade, na capitania de Mato Grosso. A história dessa região está intimamente ligada à luta de Portugal para proteger a fronteira despovoada contra as intrusões espanholas. Acresce que, quando se comprovou que a área a oeste e ao norte de Cuiabá encerrava preciosas jazidas de ouro, a Coroa decidiu defender os seus interesses, ordenando nos anos 1740 a construção de uma vila nas suas imediações para cumprir duas funções: desencorajar os espanhóis e evitar as atividades ilícitas de bandeirantes mineradores. Essa nova vila seria a sede lógica da capital da nova capitania de Mato Grosso, cuja criação foi recomendada pelo Conselho Ultra-marino em 1748. Depois de construída, a nova vila poderia imediatamente acomodar o quadro habitual de funcionários e militares da Coroa: O capitão-geral residiria a maior parte do ano na nova vila a ser construída em Mato Grosso para

tornar a colônia de Mato Grosso tão poderosa que seja respeitada pelos seus vizinhos [os espanhóis] e que sirva de baluarte de todo o interior do Brasil. Não só a presença de um oficial de alta patente e de tropas reais contribuiria para a defesa como a nova capitania-geral simbolizaria a ocupação permanente pela Coroa do extremo Oeste, proporcionando uma base firme para a aplicação do utipossidetis.32

A criação de uma vila em Mato Grosso foi proposta no começo dos anos 1740, pouco depois da fundação de Vila Boa em Goiás. Em março de 1741, o Conselho Ultramarino respondeu à informação prestada pelo ouvidor da Comarca de Cuiabá autorizando a criação de uma comunidade para ocupar a terra compreendida entre o território dominado pelos espanhóis e os limites exteriores da vila de Cuiabá. Tal vila, consoante esse documento, podia ser construída emitindo-se uma ordem semelhante à de Vila Boa de Goiás (sic).33
Planta de Villa Boa mostrando o realinhamento, aproximadamente 1782.

Cinco anos depois, em 1746, uma versão quase idêntica do código de planejamento de Vila Boa foi enviada ao governador de São Paulo (sob cuja jurisdição o território de Mato Grosso estava), instruindo-o sobre os procedimentos para projetar uma nova vila. Aqui também a ênfase recaía na ordem e na simetria: as ruas deveriam ser desenhadas com uma largura uniforme e em linhas retas; as casas tinham de ser construídas com uma fachada uniforme, e todos os esforços deveriam ser envidados para preservar a formozura da terra (sic). Em virtude, antes de tudo, da localização remota dessa futura capital administrativa, as ordens prescreviam ainda que os fundadores exigissem que todos os funcionários da comunidade fossem casados e residissem dentro dela. O intuito era criar uma população permanente; como um incentivo a mais ao povoamento, os novos habitantes ficavam isentos de todos os impostos por 12 anos a contar da fundação da vila. Além disso, exigia-se dos mineradores o pagamento de apenas um décimo do ouro que extraíssem, em vez do quinto habitualmente reservado à Coroa.34
Detalhe de Vila Bela , 1773.

Em 1750 as engrenagens tinham sido postas em movimento, e o capitão-geral da capitania recém-criada, Antônio Rolim de Moura, foi despachado para executar as ordens reais. As comunicações ulteriores entre Lisboa e Rolim reforçaram as instruções da ordem de 1746: o governador deveria escolher um sítio saudável, providenciando que as ruas da nova vila fossem largas e retas, e tomar quaisquer outras providências que julgasse necessárias para que a dita vila fosse construída desde o início com boa orientação.35  A localização da nova vila seria próxima do rio Guaporé e de preferência perto do povoado de Santana ou do de São Francisco Xavier, os quais já contavam um pequeno número de habitantes. Sobre esta última comunidade, Rolim observaria que ela tinha sido construída sem nenhuma ordem nem formação de ruas,36   um comentário que logo o identifica como propugnador da ordem e organização que constituíam a. essência do novo urbanismo.

A opção por um local próximo do rio Guaporé foi ditada por razões geopolíticas. Não só esse sítio era uma atalaia para vigiar as atividades das missões espanholas como, o que talvez fosse mais importante, o rio Guaporé era a conexão imprescindível no quadro de um sistema integrado de comunicações projetado que finalmente estabeleceria uma ligação entre Belém do Pará e o extremo Oeste. Em 1750 a importância dessa rota havia sido reconhecida:

O alto custo do transporte nas estradas do Sul elevou os preços acima das possibilidades dos colonos, impediu um fluxo constante de importações abundantes e baratas, reduziu a compra de escravos e a acumulação de capital e, em consequência disso, contribuiu para o declínio da produção de ouro. Porém se o Pará abastecesse Mato Grosso,... o Oeste receberia um número maior de escravos mais baratos, maiores quantidades de bens manufaturados e gêneros alimentícios, a produção de ouro receberia um novo alento, Belém regurgitaria de ouro do Oeste, o tesouro real do Pará finalmente sanaria o seu déficit crônico, e o Amazonas poderia sair da sua pobreza secular.

A criação de uma nova comunidade que pudesse servir de ponto de observação governamental dessa rota era claramente impositiva.
Planta básica de Vila Bela, 1780.

Mas, apesar de tudo, o progresso na nova vila era muito lento, mesmo com todas as vantagens comerciais em jogo. O local finalmente escolhido pelo capitão-geral oferecia o atrativo da proximidade do rio, mas com frequência era assolado por doenças, afugentando possíveis colonos. Nem a insistência de Rolim de Moura em que as casas fossem construídas com presteza, nem as vantagens do programa de isenção de impostos conseguiram atrair um grande número de voluntários para essa fortaleza do interior. Três anos depois da sua fundação oficial em 1752, Vila Bela tinha apenas cerca de 500 habitantes.38  Sem se intimidar com esses reveses, Rolim de Moura persistiu na sua obra, criando uma cidade tão fiel quanto possível ao modelo recomendado no código de 1746.
As provas documentais relativas à construção dessa vila são tão ricas que o andamento das obras pode ser acompanhado praticamente dia a dia. Grande parte desse material está contido nos Anais de Vila Bela39, mas a correspondência de Rolim de Moura, bem como um material cartográfico de excelente qualidade, está igualmente disponível. Consoante os Anais, a edificação da cidade começou pouco depois da sua criação oficial em 1752. Primeiramente a praça principal foi demarcada em terreno elevado, premunindo-se as inundações pelas cheias do rio. Esse largo central era um quadrado com 408 palmos de lado, contorneado por ruas de 60 palmos de largura (1 palmo -- 22cm). O lado sul era ocupado pelo quartel de uma companhia de dragões; a fachada oeste, pela casa da câmara; a parte leste, pela igreja paroquial; e todo o lado norte foi reservado para a residência do governador.40  Uma vez que o código de 1746 não especificava as medidas para a cidade do rio Guaporé, é provável que as dimensões utilizadas tenham sido estabelecidas pelo próprio capitão-geral. O que lhe interessava era que a nova vila oferecesse uma representação gráfica e visual de ordem e tivesse uma escala suficientemente grande para merecer atenção.

Entretanto, o bom senso induziu o capitão-geral Moura a desobedecer à ordem de 1746 com e das fachadas das edificações. Como o capitão-geral explicou, era importante que nenhum prédio ultrapassasse o alinhamento da rua. Porém, quanto à simetria das fachadas, Moura achou que isso constituiria um gravame a mais para os pobres, que, assim, seriam obrigados a construir frontispícios tão suntuosos quanto os das casas dos ricos; ora, isso inibiria a migração voluntária de muitos colonos para a nova comunidade.41  Porém, para ele próprio, uma moradia luxuosa era imprescindível, e tanto a residência do governador como os alojamentos dos soldados foram construídos conforme os desenhos trazidos do Rio de Janeiro. A residência foi custeada pelo próprio Moura,42  pois os fundos reais, no dizer do historiador matogrossense Virgílio Correa Filho, estavam sofrendo de anemia incurável;43  portanto, o estilo monumental da residência provavelmente foi um reflexo do gosto pessoal de Moura. Conforme um documento cartográfico posterior,44 ela ocupava pelo menos dois quarteirões inteiros do traçado de Vila Bela. Os aposentos davam para a praça central; atrás da residência foi deixado uma área para um pomar racionalmente plantado, que possivelmente foi o primeiro do seu gênero no Brasil, pois os primeiros pomares pro-priamente ditos das cidades costeiras tradicionais só surgiram no final do século.45  
   
Os visitantes a Vila Bela devem ter se sentido surpresos com o porte do empreendimento naquele rincão remoto da colônia. Vila Bela foi um exemplo notável de como a política urbana portuguesa podia transformar o interior: certamente a planta básica de Vila Bela traduziu o desejo da metrópole de implantar ordem e autoridade na selva remota.46 A sua criação foi o produto da evolução de um código de planejamento urbano cada vez mais complexo, e representou a perseverança de um administrador competente com visão suficiente para ver o seu intento concretizado. A nova vila mato-grossense constituiu um triunfo para os portugueses, que se propunham a instaurar a ordem e o progresso, especialmente em relação a Cuiabá, mais antiga e não planificada.

A última das comunidades do Centro e do Oeste patrocinadas oficialmente nas décadas de 1730 e 1740 foi Mariana, ou Ribeirão do Carmo. Mariana foi um dos primeiros arraiais surgidos na zona aurífera de Minas Gerais. Situava-se cerca de 12 milhas (19,312km) a nordeste de Vila Rica e seguiu o mesmo tipo de desenvolvimento aleatório desta. A comunidade era sulcada de trilhas, e as casas, na sua maior parte, eram construídas sem nenhuma noção corrente de ordem. O próprio local escolhido para o primitivo acampamento de mineração foi infeliz: em 1742 o rio ao longo do qual Carmo havia sido construída transbordou, inundando e arruinando a maior parte das edificações da então vila.

Contudo, a destruição da povoação redundou em proveito da Coroa, e os administradores prontamente aproveitaram a catástrofe para requerer a reconstrução da comunidade num terreno próximo, mas mais elevado. As autoridades da Câmara de Mariana argumentaram que se deveria dar prioridade à reconstrução das casas destruídas na enchente,47  porém Lisboa pressionou no sentido da criação de uma vila inteiramente nova. Surgia a oportunidade não só para um: corrigir os equívocos urbanísticos das vilas via mineiras como para -- e isto era o mais importante -- construir uma bela sede para a recém-criada diocese de Minas Gerais. Mariana seria elevada à categoria de cidade (para grande consternação da sua rival vizinha, Vila Rica) e receberia uma aparência condizente com a sua nova função.
Planta de Mariana, em Minas Gerais, depois da reconstrução de 1746-1747, sem data.

Ordenou-se proceder a construção da nova cidade com toda a brevidade, enquanto os fundadores da cidade foram exortados a apoiar uma planta básica previamente traçada, que previa o crescimento futuro da cidade.48  Por sorte dos marianenses, Jose Fernandes Pinto Alpoim (1695-1765), coordenador da Aula de Fortificação e Artilharia no Rio (uma espécie de escola de engenharia informal; ver o Capitulo V), estava trabalhando num projeto em Vila Rica49 e pôde ser despachado para Mariana a fim de  supervisionar a construção da cidade. O local  escolhido para a nova urbe situava-se do outro c lado do rio, em oposição direta ao núcleo original. Nessa área seria construída a cadeia, a casa da câmara, novas habitações alfim, o palácio .diocesano.

As autoridades de Mariana receberam instruções sobre o modelo da nova cidade em 1746. Seguindo a mesma política urbana adotada em outras localidades do interior, os administra- r dores portugueses ordenaram a construção de uma aglomeração urbana retilínea, não importando os prejuízos que pudessem resultar para as edificações mais antigas da área. Dever-se-ia envidar todos os esforços para manter as ruas largas e ladeadas por casas de desenho semelhante. Os pomares foram relegados para os fundos das casas, fazendo-se com que o lado da rua formasse uma fachada contínua sólida e uniforme.50 Hoje em dia, todos os que visitam a cidade podem observar que seus fundadores cumpriram essas ordens: com apenas leves diferenças, as casas coloniais de dois pavimentos (sobrados) contíguas mais parecem um único prédio enorme que casas distintas. Houve alguns somenos embaraços ao programa de construção: em 1748 um mineiro reivindicou direitos sobre o novo local escolhido para a cidade,51  inutilmente;  e muitos anos depois da urbanização, em 1795, os edis da Câmara local ordenaram a demolição de uma casa que impedia a regularidade e o embelezamento da praça.52 Não obstante, a imagem geral dessa cidade setecentista (Figura 7)53 evidencia uniformidade e a obediência ao princípio de ordem e regularidade.

Como ficou demonstrado acima, em meados do século XVIII os portugueses haviam criado, com êxito, várias novas comunidades no Centro-Oeste em conformidade com os ideais de ordem estabelecidos. Com a ajuda de engenheiros militares, que com-partilhavam do entusiasmo do governo pela regularidade e precisão, os portugueses conseguiram projetar uma imagem de .solidez e autoridade em regiões que até então permaneceram fora da supervisão real. As vilas não tinham apenas um significado simbólico: em conjunto, elas deveriam ser encaradas como prova tangível do controle crescente da Coroa sobre a hinterlândia. Nenhuma dessas comunidades era singular; cada uma delas era uma parte de uma sucessão lógica no desenvolvimento progressivo de um código de construção de vilas padronizado. Nos 30 anos que se seguiriam, esse código seria racionalizado, aperfeiçoado e finalmente apregoado como o mecanismo correto para civilizar o Brasil, demonstrando irrefragavelmente a impaciência da Coroa com o desenvolvimento aleatório.


N o t a s :

(1) Sylvio de Vasconcellos, Arquitetura no Brasil, Pintura Mineira e Outros Temas (Edições Escola de Arquitetura da Universidade de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1959), p. 4.

(2) Cassiano Ricardo, Marcha para o Oeste: A Influência da Bandeira na Formação Social e Política do Brasil (José Olympio, Rio de janeiro, 4a edição, 1970), vol. II, p. 505.

(3) "Planta da Aldeia de Sumidouro", 1732. AHU-Iria, nº 277.

(4) "Parecer do Conselho Ultramarino sobre... as minas...", Lisboa, 17 de julho de 1709. AHU, Códice 232, fl. 259.

(5) Ibidem. Charles Boxer, op. cit., p. 147, declara que já em 1693 a Coroa tentou transferir a responsabilidade da construção de vilas para as autoridades do governo brasileiro (ver o capí-tulo final, mais adiante). Estas, principalmente os governadores-gerais, foram instruídas a incentivar a criação de novas comunidades no interior, contanto que os habitantes locais arcassem com as despesas de construção da câmara, da cadeia e dos prédios municipais. Embora eu não tenha conseguido encontrar essa legislação, penso que ela quadra muito exatamente aos objetivos do governo nos anos1690. Não obstante, é significativo que mais tarde, no século XVIII, o governo real assumiu os ônus da criação de novas comunidades, com todos os prédios públicos, a fim de assegurar a ocupação definitiva em regiões remotas.

(6) Correspondência do Rei ao Governador da Capitania do Rio de Janeiro, de Lisboa, 14 de agosto de 1711. AHU, Códice 235

(7) Carta ao Governador do Rio de Janeiro, de Lisboa, 16 de agosto de 1715. AHU, Códice 235.

(8) A lista a seguir é baseada num cotejo de relações de vilas estabelecidas por Reis Filho, op. cit., Mário Leite, op. cit., e Aroldo Azevedo, Vilas e Cidades: 1711, Sabará; 1711, Nossa Se-nhora do Carmo, também chamada Ribeirão do Carmo, mais tarde Cidade de Mariana; 1711, Vila Rica, mais tarde Ouro Preto; 1712, São João del Rei; 1714, Vila do Príncipe, Serra do Frio; 1714, Vila Nova da Rainha do Caeté; 1715, Vila Nova do Infante, Pitangui; e 1718, São José del Rei, depois Tiradentes.

(9) Correspondência do Rei ao Governador de Minas Gerais, Lisboa, 3 de janeiro de 1721. AHU, Códice 226, fls. 68-69. Essa determinação reedita a legisIação de 1693, citada em Charles Boxer op cit., p. 147.

(10) "Atas da Câmara de Vila Rica", AB.NRJ (1927), p. 319. Essa ordem é citada também em Sylvio de Vasconcellos, Vila Rica: Formação e Desenvolvimento — Residências (Instituto Nacional do Livro, Rio de Janeiro, 1956), pp. 103-105.

(11) Para que desta forma se vão endireitando as ruas..., tal como citado em Sylvio de Vascon-cellos, op. cit., p. 133.

(12) Sylvio de Vasconcellos, op. cit., p. 137.

(13) A expedição de Bartolomeu Bueno da Silva chegou à zona do rio Vermelho por volta de 1682 e fez uma descoberta preliminar de ouro. Cf. a análise em Ernani Silva Bruno, Grande Oeste, vol. VI, op. cit., p. 22.
(14) Ibidem, pp. 28-29.

(15) Virgílio Correa Filho, História de Mato Grosso (Instituto Nacional do Livro, Rio de Janeiro, 1969), p. 207.

(16) Essa planta de Cuiabá encontra-se numa coleção de reproduções fotográficas de mapas da Casa da Insua conservada no Agrupamento de Cartografia Antiga do Ministério de Ultramar, MU-CI, nº 27, 1777. Como prova de que essa região não fora mapeada, David M. Davidson, Rivers and Empire: The Madeira Route and the Incorporation of the Brasilian Far West, 1737-1808 (University Microfilms, Ann Arbor, Michigan, 1970), p. 30, relata que em 1737 os espanhóis ainda estavam em grande dificuldade até mesmo para localizar Cuiabá num mapa.

(17) Ver a resposta da Câmara de Cuiabá à Coroa, datada de 4 de setembro de 1738, explicando as dificuldades de reter a população onde não existia ouro. AHU, Mato Grosso, Caixa 2.

(18) AHU, Códice 241, fl. 101.

(19) Para obter informações sobre Bartolomeu Bueno da Silva, ver Charles Boxer, op. cit., pp. 267-268, e Caio Prado Júnior, op. cit., p. 289. O presente texto não tem relação direta com as lutas entre os paulistas e os emboabas (portugueses e brasileiros procedentes de outras regiões que também estavam à cata de ouro e pedras preciosas); todavia, a desordem resultante das constantes contendas em São Paulo de fato apressou os programas do governo para o interior. Ver David M. Davidson, How the Brazilian West Was Won: Freelance and State on the Mato Grosso Frontier, 1737-1752", in Dauril Alden (editor), Colonial Roots of Modern Brazil (University of California Press, Berkeley, 1973), pp. 61-106.

(20) Ernani Silva Bruno, op. cit., p. 40.

(21) Carta Régia ao Conde de Sarzedas, de 11 de fevereiro de 1736. AHU, Códice 236, fls. 163, 163v e 164. Uma cópia dessa ordem encontra-se no AHU, Goiás, Caixa 2.

(22) Esse excerto é citado no Parecer do Conselho Ultramarino de 25 de janeiro de 1736. AHU, Códice 239, fl. 66.

(23) As ordens recebidas pelo superintendente da Sylva são idênticas às da Carta Régia enviada ao Conde de Sarzedas.

(24) Sarzedas morreu ali, segundo a narrativa de José de Barbosa e Sá, Memória sobre o descobrimento, governo e população e cousas mais notáveis da Capitania de Goyas. BNRJ, n2 1.2-2-13. Essa Memória foi reeditada na RIHGB, vol. XII (1849).

(25) Ibidem, fl. 14.

(26) Essa questão é mencionada na Provisão de 31 de abril de 1739, contida no Documento n2 1, BNRJ, n2 13-4-10: "Descripção da Capitania de Goyás e tudo o que nella he notavel te o anno de 1783, começa pela Villa Boa".

(27) Relatório da Câmara de Villa Boa de 19 de dezembro de 1739. AHT, Goiás, Caixa 1.

(28) Ver o estudo do caso de Icó no Capítulo III.

(29) BNRJ, n2 12-2-13. Barbosa refere que a igreja, a casa da câmara, a cadeia e outros prédios  públicos foram construídos naquele tempo.

(30) Instruções para realinhar Vila Boa emitidas pelo governador Luís da Cunha Menezes. BNRJ, n2 13-4-10, Documento n2 4. Essa ordem é apreciada mais detalhadamente mais adiante.

(31) "Planta de Vila Boa, Capital da Capitania Geral de Goyás, levantada no ano de 1762...". AHU-Iria, n2 85. A planta da Figura 5B faz parte do MU-CI e recebeu o n2 31. Data de cerca de 1782.

(32) David M. Davidson, op. cit., p. 55.

(33) Resposta da consulta ao Conselho Ultramarino de 12 de março de 1741. AHU, Códice 259, pp. 83-85.

(34) A planta completa estava incorporada à Provisão Régia de 5 de agosto de 1746, pela qual foram concedidos diversos privilegios, e prerogativas...

(35) ANRJ, Caixa 748, Recomendações da Coroa a Rolim de Moura, de 19 de janeiro de 1749. Esse documento também é citado em Correa Filho, op. cit., pp. 319-320.

(36) Tal como citado em Correa Filho, op. cit., p. 322.

(37) David M. Davidson, op. cit., p. 63.

(38) Alfredo-Maria Adriano d'Escragnolle, Visconde de Taunay, A Cidade de Matto-Grosso (Antiga Villa Bella): O Rio Guaporé e a Sua Mais 1/lustre Victima (Typographia Universal de Laeminert, Rio de Janeiro, 1891), p. 55. Em vez de obrigar casais europeus a se fixarem na nova localidade, que ele pessoalmente preferia, Rolim de Moura recomendou que a população inicial fosse constituída de voluntários da própria área, que já estavam afeitos às perspectivas de doença e isolamento a que estariam sujeitos na nova comunidade. Ver relatório de Moura à Coroa, de 12 de outubro de 1754. AHU, Códice 239.

(39) "Annal de Vila Bela des o primeiro descobrimento deste çertão do Matto Grosso, no anno 1734". Datado de 1754 e encontrado na BNL-AP, 629, fls.29-39v.

(40) Relatório do andamento das obras de Rollin de Moura à Coroa, de 12 de outubro de 1754, citado em AHU, Códice 239, fl. 188.

(41) Ibidem.

(42) Essa particularidade é mencionada na carta de Moura à Coroa de 29 de junho de 1756, Vila Bela, AHT, Lata 266, Maço 7, Pasta 10.

(43) Virgílio Correa Filho, op. cit., p. 330.

(44) Figura 6A - Novo Projecto para a continuação do plano priinitivo..., 1773, MU-CI, ri2 14. Figura 613 - Plano da Villa Bella..., 1780, MIGE, n2 1177.

(45) Ver o Capítulo IX.
 .
(46) David M. Davidson, op. cit., p. 99. Esse autor cita (nota de rodapé nQ 68, p. 283) uma carta do governador de Mato Grosso, Luís de Albuquerque, a M. Melo e Castro, Vila Bela, 29 de dezembro de 1779, a qual indica que estava sendo dada uma atenção ininterrupta ao desen-volvimento de Vila Bela. Nessa carta, o governador escreveu que a vila havia sido ampliada e compreendia cinco ruas principais e cinco ruas transversais. Para conhecer outra descrição de Vila Bela e sua fundação, ver Henrique de Campos Ferreira Lima, Vila Bela da Santíssima Trindade de Mato Grosso: o seu fundador e a sua fundação, Congresso do Mundo Português,vol. X (1940), pp. 291-301.

(47) APM, Atas da Câmara de Mariana, 17 de outubro de 1744. Livro 15 (1739-1746).

(48) Recomendação do Conselho Ultramarino às autoridades da Câmara de Mariana, Lisboa, 25 de setembro de 1745. AHU, Códice 241, fls. 296v-297.

(49) APM, Códice 81 (Ordens Régias 1743-1744), Carta 9. Ver também a exposição dos currículos de engenharia no Capítulo V.

(50) Instruções do Conselho Ultramarino às autoridades da Câmara de Mariana, Lisboa, 2 de maio de 1746. AHU, Códice 241, fls. 301-301v.

(51) Esse pleito, devidamente registrado pela Câmara de Mariana e comunicado a Lisboa, é mencionado numa carta do Conselho Ultramarino a Gomes Freire de Andrade datada de Lisboa, 22 de julho de 1748. AHU, Códice 241, fl. 325.

(52) Atas da Câmara de Mariana, 13 de julho de 1795.


(53) Planta da cidade de Mariana, sem data, século XVIII. MIGE, n2 1093.    

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

NOVAS VILAS PARA O BRASIL COLÓNIA Planejamento espacial e social no século XVIII - Parte III

Roberta Marx Delson

Tradução Fernando de Vasconcelos Pinto


Roberta Marx Delson, nascida na cidade de Nova York, recebeu o seu MA (Master of Arts, mestrado em Ciências Humanas) e o seu PHD (Philosophy Doctor, doutorado) em Estudos Latino-Americanos e História na Universidade de Colúmbia. Lecionou na Universidade Estadual de Rutgers (em New Brunswick, estado de Nova Jersey) e na Universidade de Princeton (em Nova Jersey), e tem trabalhado como consultora em programas de estudos latino-americanos e também para o Serviço do Patrimônio Histórico do Estado de Nova Jersey. Atualmente é lente da Academia da Marinha Mercante dos Estados Unidos. Suas obras publicadas compreendem o presente livro, cuja edição original em inglês data de 1979, Readings on Caribbean History and Economics (Conferências sobre a História e a Economia do Caribe, 1980) e Industrialization in Brazil: 1700-1830 (1991), esta em co-autoria com John Dickenson, bem como muitos artigos especializados. Presentemente está elaborando The Sword of Hunger: A Latin-American History (A Espada da Fome: Uma História da América Latina), conjuntamente com o eminente brasilianista Robert M. Levine.


Aplicando o modelo: primórdios experimentais no Nordeste

Empenhada no desenvolvimento da hinterlândia por meio de uma série de comunidades planificadas e supervisionadas, a Coroa concentrou os seus primeiros esforços no Nordeste do Brasil, onde, no final do século XVII, as dificuldades criadas por sesmeiros excessivamente poderosos haviam se tornado cruciais. Por sua vez, o abrimento de diversas linhas de comunicação através da região aumentou a preocupação das autoridades nas duas unidades administrativas do Brasil, o estado do Maranhão e o estado do Brasil, que abrangiam cada um uma parte do Nordeste. A comunicação entre a cidade litorânea de São Luis, no Maranhão, e Salvador, capital do estado do Brasil, era inçada de dificuldades. Os ventos predominantes tornavam uma viagem marítima contornando o cabo São Roque muito arriscada, enquanto a alternativa de acompanhar a linha da costa resultava numa viagem demorada e árdua. A solução lógica do problema era abrir caminho através do sertão do Piauí, pois assim a distância seria encurtada, tornando a viagem muito mais direta. Contudo, era preciso lutar contra os poderosos do sertão; para que a segurança da estrada pudesse ser assegurada, cumpria pacificar esses barões agrários. Assim sendo, o Piauí estava fadado a ser uma das primeiras regiões onde os administradores portugueses e os temíveis senhores do sertão entrariam em desavença. O sertão piauiense já havia sido escassamente povoado por aventureiros baianos, agora dispersos em povoados fragmentários ao longo das margens dos rios.1

 Esses intrépidos andarilhos haviam aberto as primeiras trilhas através do interior. Partindo de São Luís, eles avançaram ao longo da costa até o rio Parnaíba; dali, voltaram-se para o interior, subindo o grande rio, e finalmente se espalharam em diversos pontos ao longo dele, atravessando o território do Piauí pelos afluentes. A trilha terminava em Juazeiro, uma povoação da capitania da Bahia, e dali o acesso à capital era relativamente fáci1.2

A Coroa imaginava que esses duros desbravadores, que haviam corajosamente aberto uma trilha .através da caatinga bravia, seriam o material humano ideal para formar o núcleo de uma comunidade patrocinada pelo governo; além disso, essa aglomeração assegurava a aceitação da autoridade real.
Com esse fito em mente, a Coroa encarregou D. Francisco Lima, bispo de Pernambuco, de criar a primeira paróquia do Piauí.3

Pouco depois de o bispo receber essa incumbência, em 1697, houve uma reunião em que representantes de vários grupos estabelecidos ao longo do rio Parnaíba deliberaram sobre a localização da igreja matriz. O local escolhido na reunião para a nova congregação de Nossa Senhora da Victoria era uma área aproximadamente equidistante de todos os assentamentos e facilmente acessível pelos meios de comunicação existentes.4

A Coroa esperava que a nova igreja atraísse futuros colonos e, com base nessa suposição, previa-se um futuro pacífico para o Piauí.

Hoje, decorridos 300 anos, pode parecer que, ou os portugueses eram excessivamente otimistas quanto à tranquilidade do Piauí, ou eles estavam decididos a fazer pouco caso da ameaça dos poderosos sesmeiros, que já haviam demarcado vastas áreas na região como feudos pessoais. Caso esses indivíduos continuassem praticando a apropriação indébita de terras, os colonos da nova comunidade teriam pouca possibilidade de adquirir glebas por iniciativa própria. Embora as leis gerais relativas às sesmarias da década de 1690 fossem plenamente aplicáveis à região do Piauí, a ameaça dos poderosos do sertão ali era tão esmagadora que a Coroa foi forçada a emitir uma série de disposições especiais para tratar do problema. Assim, em 1699 o rei declarou que os sesmeiros que possuíssem terras no Piauí e não as cultivassem, nem pessoalmente nem por intermédio de outrem, corriam o risco de perde-las para quem quer que os denunciasse às autoridades.5
  
Essa disposição real (talvez visando expressamente a isto) precipitou uma revolta no sertão. A despeito da contenda que se seguiu, o governo continuou a pressionar no sentido de uma demarcação efetiva da terra, na esperança de que a diminuição legal da extensão das sesmarias finalmente obrigasse os poderosos a entregarem áreas consideráveis.

Duas disposições complementares decretadas pela Coroa nesse estágio inicial atiçaram ainda mais a ira dos grandes proprietários. A primeira delas, uma lei promulgada em 1699, que impunha .a presença de um juiz, um capitão-mor e outros funcionários do governo em cada uma das paróquias recém-criadas,6  foi acertadamente interpretada pelos poderosos como um desafio ao seu poder irrestrito no sertão. Da mesma maneira, a decisão de anexar o Piauí ao vizinho estado do Maranhão7 também decretada na mesma época, foi encarada pelos barões da terra como uma tentativa de aumentar o controle do governo. A animosidade dos sesmeiros permaneceu contida por 13 anos, até que as medidas imprudentes do ouvidor (juiz adjunto da administração central) do Maranhão precipitou uma crise. Em 1714 o ouvidor, sem autorização, declarou que de então em diante todas as terras do Piauí eram consideradas devolutas, ou seja, legalmente sem dono.8  

Para apaziguar o tumulto desencadeado no sertão por essa decisão oficial, a Coroa foi obrigada a retroagir, determinando em 1715 que as velhas sesmarias, outorgadas no tempo em que o Piauí era administrado pela Bahia e Pernambuco, ainda eram legais, embora o território agora estivesse sob a jurisdição do Maranhão.9

Com isso, os sesmeiros foram pacificados, e a Coroa, no essencial, perdeu o primeiro embate. Por infelicidade, os índios do Piauí escolheram exatamente esses anos tumultuados para rebelar-se contra os portugueses. Em 1712 e 1713 os tapuias do norte revoltaram-se ao longo da fronteira do Maranhão com o Piauí, ameaçando a segurança de toda a estrada Maranhão-Piauí-Bahia. Liderados pelo ex-convertido pelos jesuítas Mando Ladino, os índios, durante quase quatro anos, atacaram as fazendas dos colonos da região. Quando a revolta foi finalmente debelada em 1716,10 a paciência da metrópole estava quase esgotada. O único recurso da Coroa foi estabelecer imediatamente a autoridade real mediante a criação de vilas no sertão do Piauí e a sua provisão com muitos funcionários portugueses confiáveis.11

No mesmo ano em que se conseguiu estabelecer um pouco de paz, em 1716, chegaram ao Piauí ordens para a criação de duas novas vilas. Uma delas se localizaria na paróquia de Nossa Senhora da Victoria, já existente, enquanto a outra reuniria colonos da área do rio Longá (afluente do Parnaíba), precisamente na sua confluência com o rio Piracuruca.12  As leis de planejamento recebidas pelas autoridades locais em 1716 forneceriam as instruções metodológicas para a fundação das duas novas vilas.

Primeiramente a Coroa ordenou que se reunissem todos os moradores das redondezas para decidirem conjuntamente sobre a localização mais apropriada para a praça central da nova comunidade, no meio da qual seria erigido o clássico pelourinho, símbolo da autoridade portuguesa. A segunda providência era indicar uma área para uma igreja que, depois de terminada, pudesse abrigar todos os futuros paroquianos atraídos pela comunidade. Além disso, deveriam ser escolhidos locais para a câmara, a cadeia e outras edificações públicas. Em seguida, as instruções insistiam em que os lotes destinados a residências nos âmbitos das vilas fossem demarcados em linha reta, ou a régua, garantindo assim uma disposição ordenada e em alinhamento das moradias.13  Finalmente, dever-se-ia procurar exigir que todas as casas tivessem o mesmo estilo de fachada, obtendo-se assim uma impressão de uniformidade e uma vista de conjunto harmoniosa.14

Com referência a essas duas cidades piauienses, duas indagações imediatamente vêm à mente: primeira, as ordens foram cumpridas tais quais exaradas na legislação de 1716?; e segunda, qual a razão do empenho tão grande da Coroa de conferir a essas novas comunidades uma aparência harmoniosa, quando o Piauí em si estava tão afastado dos núcleos de civilização mais próximos? A resposta para a primeira pergunta parece ser afirmativa: consoante a pesquisa do historiador da arquitetura Paulo Barreto, as ordens de 1716 foram ignoradas unicamente no tocante à determinação de as igrejas serem suficientemente espaçosas para acomodarem as comunidades em crescimento. Barreto afirma que em 1733 a igreja de Victoria (topônimo mudado depois para Mocha) ainda estava em obras, ao passo que o templo de Piracuruca só foi terminado dez anos depois.15

Uma prova mais convincente é o relato de João da Maia da Gama, que esteve em Mocha em 1728 e descreveu a vila.  Naquela época a cidade evidentemente tinha um número considerável de habitantes; haviam sido construídas cerca de 90 casas dentro da vila, e mais algumas dúzias estavam distribuídas pelos distritos exteriores, perfazendo perto de 120 moradias. Além disso, João da Gama observou que os habitantes estavam ocupados na construção de uma vistosa cadeia pública de pedra e cascalho e cumprindo a exigência de edificar uma Casa da câmara.16  Infelizmente, o relato de Gama não faz nenhuma referência à disposição das casas, embora provavelmente ela também tenha obedecido ao modelo prescrito pela Coroa.

Não é fácil responder à segunda pergunta, mas é evidente que, pelo menos no caso de Mocha, os portugueses estavam decididos a supervisionar inteiramente o desenvolvi-mento da comunidade, inclusive o seu traçado físico. Visto que uma situação de crise havia se manifestado ao longo da via fluvial tão rapidamente depois da promulgação das leis de sesmarias, e que a necessidade de congregar os poderosos e subjugar os índios rebeldes era tão aflitivamente premente, a criação de uma nova vila, provida de funcionários reais, era ditada pela necessidade, bem como pela possibilidade de escolha. Se tal comunidade fosse construída solidamente, de conformidade com os princípios barrocos em voga de uniformidade e retilineidade, teria mais possibilidade de suportar um ataque violento de elementos dissidentes. Ademais, um emprego largo de dinheiro e competência como esse continuaria a receber a atenção do governo. Por uma equação simples, uma cidade permanente necessariamente atrairia colonos permanentes. Conquanto a ordem de 1716 não prescrevesse uma extensão definida para a praça central nem a largura específica das ruas (como algumas das legislações ulteriores prescreveriam), o objetivo era criar uma comunidade de aparência ordenada que logo à primeira vista desse a impressão de que havia uma autoridade estabelecida. Se a continuidade pode ser considerada um índice de êxito em planejamento urbano, a experiência de Mocha satisfez todas as expectativas. Em 1761 a vila foi elevada à categoria de cidade (e teve seu nome mudado para Oeiras), a única do Piauí na época. Além disso, a meta importante de criar uma estrada tranquila e segura para a comunicação entre o Maranhão e a Bahia havia sido atingida. Pouco depois da construção da cidade nos anos 1720, os colonos tiveram toda liberdade de retornar à região (principalmente ao longo da fronteira com o Maranhão) para reconstruir as fazendas de gado destruídas durante a revolta dos tapuias. Finalmente, a nova vila favoreceu a formação de outros centros urbanos na região, o que se traduziu numa proliferação de comunidades, algumas das quais alcançaram um porte considerável. Esses novos centros -- como Parnaíba (Figura 1), fundada em 1761 -- obedecem ao modelo traçado em 1716, apesar de posteriormente ter sido elaborada uma legislação especial para a sua criação.17

-Fig. 1 - Planta básica de São João de Parnaíba, 1798

A contrapartida negativa da criação de Mocha foi que ela não possibilitou uma solução efetiva do problema de controlar os sesmeiros, que continuaram a apoquentar as autoridades até o meio do século.18  Contudo, a Coroa havia mostrado que uma Vila construída numa das áreas mais remotas da colônia podia prosperar se fosse corretamente administrada. As autoridades devem ter gostado imensamente dos resultados da experiência de Mocha, que foi a primeira vez que as novas leis de planificação em plena escala foram postas em prática. A partir de 1716, a Coroa repetidamente assumiu os encargos de experiências urbanas no interior, num esforço contínuo de impor ordem onde o caos havia predominado. Mocha havia sido uma primeira tentativa de implantar a política de controle esboçada na década de 1690.

Contudo, a pacificação do Piauí não havia absolutamente garantido a segurança no Nordeste. Em seguida, a Coroa voltou a sua atenção para o sul, para a regulamentação de centros urbanos no Ceará. Como no Piauí, o problema de importância capital para os portugueses ali era a segurança, pois duas importantes estradas atravessavam o território do Ceará. A primeira estrada ladeava a costa, estendendo-se do norte de Pernambuco até pelo menos Fortaleza, no Ceará, enquanto a outra estrada fazia uma conexão por terra entre Fortaleza e a Bahia.19

Não havia muitos colonos na região do Ceará. A maior concentração localizava-se à beira-mar, no ponto em que hoje fica a capital do estado, Fortaleza. No século XVII, os portugueses haviam construído um forte -- daí o nome da metrópole --, porém a expansão urbana não havia sido promovida. Foi visando a aumentar o número de colonos na região e a assegurar o domínio das duas estradas de penetração que os portugueses resolveram, em 1699, fundar a vila do Ceará e conceder-lhe o título real. A vila deveria situar-se no local da velha fortificação.

A instalação da nova vila, que deveria ter sido uma questão pacífica, gerou uma controvérsia que só cessou na década de 1720. Pela lógica, o sítio da nova vila deveria ter sido a antiga povoação à sombra do forte, porém o conselho municipal decidiu que a cidade ficaria melhor localizada a pouca distância dali, em Iguape. A Coroa imediatamente se opôs, fazendo saber aos moradores da povoação que ela considerava o forte como o local mais adequado para a instalação da sede do governo municipal. De nada adiantaram as discussões ásperas entre os cearenses e o governo local. Os portugueses não se demoveram, apesar do argumento da população de que a zona de Iguape oferecia um clima mais saudável; terras férteis em abundância, água boa, fartura de peixe e um porto mais acessível que Fortaleza. No final das contas, a Coroa indeferiu as objeções locais, e uma vila oficial foi criada em 1706 no local do antigo forte. 20 *

* Fico muito agradecida ao tradutor pela informação seguinte: O forte junto ao qual a vila de Fortaleza foi fundada, em 13/4/1726, foi construído pelos invasores holandeses, e não pelos portugueses. É certo que, a cerca de uma légua dali, na barra do rio Ceará, Martim Soares Moreno havia erigido o Forte de São Sebastião em janeiro de 1612. Porém em 6/4/1644, quando a expedição holandesa de 298 homens comandada por Matthias Beck aportou na enseada do Mucuripe, na atual Fortaleza, desse forte português só restavam ruínas. O comandante Beck mandou transportar as suas telhas e velhas peças de artilharia, que encontrou semi-soterradas nas dunas, para o outeiro Marajaitiba, perto do riacho Marajaik (o córrego Pajeú, que atravessa o centro de Fortaleza). Nesse local foi construído o Forte Schoonenborch, de forma pentagonal. A Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, que deu nome à capital do Ceará, só foi edificada em 1816, no mesmo local do forte holandês. As muralhas desse terceiro forte subsistem até hoje. Confira-se em Pequena História do Ceará, de Raimundo Girão.

Nem assim a oposição dos habitantes ao local determinado por Lisboa foi aplacada, e em 1713 os obstinados cearenses foram recompensados com a decisão da Coroa de relocalizar a comunidade em Aquiraz, uma zona adjacente ao porto de Iguape. A despeito das suas propaladas virtudes, infelizmente Aquiraz revelou-se uma vitória infausta. Tão logo os colonos se mudaram para a nova localização, os índios da região começaram a hostilizar a nascente comunidade. O capitão-mor expressou as suas obje-ções ao novo lugar, mas a Coroa obstinou-se, e logo foram construídas uma casa da câmara, uma cadeia e uma igreja na comunidade, a essa altura completamente desmoralizada. Ademais, para certificar-se de que ninguém permanecesse em Fortaleza, deu-se um prazo de quatro meses aos comerciantes para transferirem suas mercadorias para Aquiraz.

Nessas circunstâncias, a polêmica sobre a escolha da localização adequada continuou nos anos 1720, uma parte considerável da população optando agora pelo retorno ao sítio de Fortaleza. Para resolver o problema, a Coroa deu permissão às autoridades locais para instalarem uma vila alternativa no sítio da velha fortificação, embora mantendo a capital oficial em Aquiraz." Com a implantação de Fortaleza a 13 de abril de 1726, a capitania do Ceará ficou na situação absurda de ter duas vilas fundadas oficialmente em áreas praticamente vizinhas, enquanto o resto da região não podia reivindicar nem mes-mo uma única comunidade oficial. A proximidade entre Fortaleza e Aquiraz não só era pouco prática do ponto de vista econômico (pois duplicava as expensas oficiais) como criava rivalidades entre os dois núcleos demográficos incipientes. Diante de outra situação potencialmente explosiva como a do Piauí na década anterior, a Coroa sub-repticiamente subvencionou Fortaleza, financiando a construção da futura urbe com fundos do erário real.
Fig. 2 Croqui de Fortaleza, Ceará aproximadamente 1710
  
O mapa mais antigo existente da vila (cerca de 1730) ilustra até que ponto o governo real subsidiou a nova comunidade (Figura 2). As primeiras moradas são representadas como simples casas cobertas de palha; as edificações posteriores, de tetos de telhas, são comparativamente luxuosas.22  Numa carta de prestação de contas 23 datada de 23 de abril de 1731, o capitão-mor Manuel Francês, encarregado das operações, explica que deixou a nova vila aumentada de 26 casas com cobertura de telhas, todas habitadas, e que ajudou a construir a Câmara com 5 mil reis. Embora não exista nenhuma prova documental que confirme a aplicação de uma legislação de planejamento urbano, um exame minucioso do croqui revela uma certa premeditação no traçado da nova comunidade. Em face da difícil tarefa de integrar as edificações antigas no desenho, é duvidoso que a nova Fortaleza pudesse ter sido ajustada ao traçado preferido de ruas retilíneos. Por outro lado, é perfeitamente visível que a área central da comunidade foi deixada vaga, servindo assim como praça principal, impressão confirmada pela presença da igreja matriz na sua cabeceira. Ademais, as casas do quarteirão paralelo à praça apresentam todas a mesma disposição de portas e janelas, o que indica uma tentativa de uniformização do desenho. No meio desse quarteirão está a nova Casa da Câmara, e uma legenda no pé do desenho salienta que o quartel municipal e a nova rua de casas foram criação do capitão-mor.

O fato de não se ter conseguido uma regulamentação completa dos elementos arquitetônicos em Fortaleza decorreu do desenvolvimento a esmo da comunidade nos seus primeiros anos. Inobstante, tanto Aquiraz como Fortaleza ilustram a essência do programa de construção de vilas, porquanto ambas serviram para assegurar o controle português sobre um elo de comunicação imprescindível na colônia. Considerava-se que as duas vilas tinham uma função estabilizadora sobre uma região remotamente administrada, apesar do paradoxo aparente da rivalidade entre Aquiraz e Fortaleza.
Por conseguinte, até os anos 1730, o poder administrativo português no Ceará esteve concentrado nos centros urbanos geminados de Aquiraz e Fortaleza.24

Esses centros garantiam o controle sobre o destino final da estrada Bahia-Ceará. Contudo, pelos anos 1730, parece que os portugueses compreenderam que era preciso aumentar a segurança ao longo dos trechos interioranos dessa artéria de intenso tráfego. Mais uma vez a Coroa resolveu obviar potenciais empecilhos, estabelecendo uma nova comunidade no sertão, a partir da qual os funcionários do governo poderiam manter o tráfego regional sob vigilância. O sítio escolhido em 1736 para a nova vila ficava num ponto intermediário da estrada Fortaleza-Salvador. Partindo de Fortaleza em direção ao sul, a estrada acompanhava a costa até o rio Jaguaribe e dali inflectia para o interior. O viajor acompanhava então o rio Jaguaribe até a foz do rio Salgado, seu afluente. Dali o trajeto seguia através do sertão até o rio São Francisco, no interior da Bahia.25  A confluência do rio Salgado com o rio Jaguaribe, em Icó, afigurava-se uma excelente escolha para um baluarte administrativo.

Essa nova povoação objetivava aumentar a autoridade na zona e contentar os habitantes, que tinham sofrido grandes incômodos, porque a sede de comarca mais próxima, Aquiraz, ficava a 80 léguas de distância.26  Conforme ocorrera no Piauí, a criação da nova vila foi acompanhada de uma legislação de planificação vinda de Lisboa, prescrevendo as ruas retas e o traçado retilíneo usuais. Entretanto, em Icó as autorida-des estavam mais interessadas na configuração geral do que na uniformidade dos elementos arquitetônicos. Assim, cada habitante foi instruído a decorar a fachada do seu imóvel como bem quisesse, sem a preocupação de manter um estilo homogêneo. Uma área de cinco léguas nas cercanias imediatas da povoação deveria ser dividida entre os habitantes, outorgando-se a cada família no máximo uma légua quadrada de terra.27  A fim de impedir o monopólio da terra, as ordens para a criação de Icó estipulavam explicitamente que os lotes não eram concedidos vitaliciamente, mas apenas por um determinado período. Isso evitava que o beneficiário se sentisse com direitos perpétuos sobre a terra.28

Na década de 1740, as autoridades portuguesas resolveram acrescentar mais uma vila às únicas três existentes no Ceará, Aquiraz, Fortaleza e Icó. Essa nova povoação localizar-se-ia à margem do rio Jaguaribe, não longe do mar, consolidando assim, ainda mais, a autoridade sobre a estrada Bahia--Fortaleza. Essa região específica havia sido colonizada nas primeiras décadas do século anterior por pescadores, que deram ao seu povoado o nome de São José.29   Entretanto, o crescimento da comunidade não se devia à atividade pesqueira em si, mas sim ao movimento das boiadas que passavam pela circunvizinhança, cujos boiadeiros eram ávidos pelos produtos de São José. Além disso, na proximidade de São José do Porto dos Barcos foi montada uma instalação de preparo de carne seca por salga e insolação (oficina ou charqueada) antes de 1740, e essa indústria é que era responsável pela prosperidade da comunidade.30

Naturalmente a Coroa estava sequiosa de participar das vantagens comerciais em São José; logo em 1739 houve uma troca de correspondência com os funcionários locais propondo a criação oficial de uma vila no sítio da povoação existente.31  Todavia, as ordens efetivas para a criação da vila de Santa Cruz do Aracaty não foram escritas recebidas pelo ouvidor-geral, José de Faria, senão em 1747.32 Quando as plantas finalmente chegaram, os fundadores da nova vila foram instruídos a escolher um lugar que estivesse topograficamente acima do nível das enxurradas do rio Jaguaribe, mas que, concomitantemente, fosse acessível aos barcos que chegassem ao rio com fins comerciais. As recomendações para o traçado da cidade obedeciam às diretrizes de retilineidade, agora de praxe, porém também levavam em conta as dificuldades espe-cíficas do local de Aracaty. Por exemplo, as ordens de 1747 recomendavam que as novas casas da vila fossem construídas com uma aparência uniforme; entretanto,

no caso de a nova vila ser localizada junto à povoação que já existe,... quando um morador de uma casa [antiga] tiver de reconstruí-la por motivo de ruína, deve-se avisá-lo de que a casa deverá ser reconstruída de forma a dar-lhe um contorno e aparência equivalente aos das novas casas.

As novas ordens recomendavam o modelo ideal, mas, ao que parece, as autoridades podiam aceitar uma solução conciliatória.

Essa sensibilidade à necessidade de flexibilizar os padrões de urbanização foi da mesma forma evidente na advertência dirigida a José de Faria para construir a praça da vila suficientemente ampla, de modo a não padecer do defeito de ficar exígua quando a villa tiver o desenvolvimento que se espera. Além disso, os consultores em Lisboa recomendavam que o curral e o matadouro fossem construídos em terreno público, a uma distância tal da cidade que o mau-cheiro não incomodasse os habitantes. Essa no-va filosofia urbana era um evidente refinamento em relação à mentalidade que havia aceitado as moradias superlotadas das famílias dos negociantes anexas às suas lojas da cidade medieval portuguesa tradicional, onde as famílias e os comerciantes conviviam intimamente com miasmas fétidos e doenças. Ou em relação ao caso de Salvador naquela mesma época, onde os depósitos de lixo diários, situados embaixo dos grandes edifícios da cidade, ameaçavam a própria vida dos seus habitantes.33

Outras características da planta básica de Aracaty eram semelhantes às determinações das leis de planificação para as comunidades analisadas anteriormente, reservando-se localizações destacadas na praça para os prédios importantes, bem como um terreno de extensão considerável para uso coletivo da comunidade.

As indicações mostram que as obras da vila começaram imediatamente, pois no início de 1748 carnaubeiras existentes no local já serviam de marcos temporários na praça recém-demarcada.34  O relatório de um engenheiro militar que visitou a vila em 1799 confirma a obediência dos seus fundadores ao decreto de 1747. Ele observou que ela tinha uma certa distinção e polidez, a par com uma arquitetura das casas agradável e regular.35

A fórmula de Aracaty logrou tanto êxito que as autoridades recomendavam-na como modelo para a construção de outras cidades. Por exemplo, quando o Conselho Ultramarino instruiu o governador Gomes Freire de Andrade a criar oficialmente uma vila na localidade de Rio Grande, no extremo Sul do Brasil, recomendou a utilização do modelo de Aracaty. A carta recebida pelo governador em 1747 declarava que

...a fim de o dito Ouvidor ordenar melhor as ruas dessa cidade, sua praça, e a Igreja, a Casa da Câmara e a Cadeia, estou determinando a instrução inclusa..., que foi remetida ao Ouvidor do Ceará para criar a nova vila na localidade de Aracaty.36

Como se pode ver, no decurso de 30 anos os portugueses haviam desenvolvido um modelo padronizado para o traçado de novas vilas no interior. Essencialmente um aperfeiçoamento das ordens de 1716 para a criação de Mocha (mais tarde Oeiras), no Piauí, a fórmula de Aracaty revelava claramente um conhecimento das injunções do local, a conveniência de flexibilidade ao fazer cumprir as exigências de uniformidade e um desejo de padrões sanitários elevados. Para a mentalidade portuguesa, uma cidade bem construída com certeza deveria gerar habitantes satisfeitos. Foi assim que Aracati se tornou o protótipo para o desenvolvimento urbano sancionado pela Coroa; os administradores desejosos de implantar ordem nos rincões incultos que eles governavam iam aderir ao plano por todo o resto do século XVIII.

N o t a s :

-Fig. 1 - Planta básica de São João de Parnaíba, 1798

(1) Ernáni Silva Bruno, Nordeste, vol. II: História do Brasil: Geral e Regional (Cultrix Ltda., São Paulo, 1967), p. 83. A bandeira de Domingos Jorge Velho penetrou na região em 1662-1663. Um contingente de baianos alcançou-a por volta de 1674. Ver também a exposição do ca-so do Piauí constante em Capítulos de História Colonial: 1500-1800, de Capistrano de Abreu, revisto e anotado por José Horário Rodrigues (5 edição, Sociedade Capistrano de Abreu, Rio de Janeiro, 1969), p. 160.

(2) Essa análise das vias fluviais é baseada em Caio Prado Júnior, o. cit., p. 282.

(3) Consulta do Conselho Ultramarino sobre a carta do bispo de Pernambuco, datada de 20 de novembro de 1697, tal como citada em Ernesto Ennes, As Guerras nos Palmares (Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1938), pp. 360-361.

(4) Isso é evidente no Termo de eleição que fizerão os moradores do certão do Piauhi: do lugar para se fazer a Igreja de Nossa Senhora da Victoria, tal como citado em Ennes, op. cit., p. 364.

(5) Carta Régia de 20 de janeiro de 1699, tal como citada em Carlos Eugênio Porto, Roteiro do Piauí (Ministério da Educação e Cultura, Rio de Janeiro, 1955), p. 66.

(6) Carta Régia de 20 de janeiro de 1699 (trechos posteriores), tal como citada em Capistrano de Abreu, Capítulos..., p. 166.

(7) Carta Régia de 3 de março de 1701, tal como citada em Porto, op. cit., p. 67.

(8) A ação do ouvidor Antônio José da Fonseca Lemos é examinada em Porto , op. cit., pp. 66 et seq.

(9) Ibidem.

(10) Essa revolta dos índios foi tratada em Boxer, op. cit., p. 236.

(11) Essa foi a recomendação do Conselho Ultramarino em 13 de março de 1717 (Lisboa). IHGB-CU, vol. X, Maranhão e Grão-Pará, 1678-1803.

(12) Silva Bruno, op. cit., p. 84, observa o rápido crescimento da população nessa área de 1720 a 1724. Paulo T. Barreto, em O Piauí e sua arquitetura (RSPHAN n2 2, 1938, pp. 187- 223), indica que tanto o povoado de Piracuruca como o de Victoria seriam submetidos à legislação de 1716.

(13) A ênfase na uniformidade é um aspecto característico da nova construção de vilas no Brasil setecentista.

(14) A Carta Régia de 1716 está reproduzida na íntegra em Barreto, op. cit.

(15) Barreto, op. cit., p. 221. Enquanto a povoação de Mocha foi criada por volta de 1716, a de Piracuruca não foi concretizada senão muitos anos depois, conforme um consenso baseado em Reis Filho, op. cit., Silva Bruno, op. cit., e Aroldo Azevedo, Vilas e Cidades do Brasil Colo-nial. Esse fato pode ter sido responsável pela aparente demora na construção de um templo em Piracuruca.

(16) Diário da viagem de regresso para o Reino, de João da Maia da Gama, e de inspecção das barras dos rios de Maranhão e das capitanias do Norte, en 1728, tal como citado em E A. Oliveira Martins, Um Herói Esquecido: João da Gama, vol. II (Agência Geral das Colônias, Lisboa, 1944), pp. 22-23.

(17) . Carta Régia ao Governador José Pereira Caldas, 1761, tal como citada em Barreto, op. cit., pp. 189-190. A planta de Parnaíba intitula-se Mapa exacto da vila de S. João da Parnaíba, 1798. Ela faz parte da mapoteca do Arquivo Histórico Ultramarino, em Lisboa. Todos os mapas do AHU referentes ao Brasil foram catalogados e numerados por Alberto Iria em Inventário Geral da Cartografia Brasileira Existente no Arquivo Histórico Ultramarino (Elementos para a Publicação da Brasil Monumenta Cartographica), IV Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros, reeditado em Studia n217, abril de 1966. Esse mapa tem o número de referência AHU-Iria n2 68.

(18) Ver explanação em Porto, op. cit., pp. 68-73 (19) Caio Prado Júnior, op. cit., p. 183.

(19) Caio Prado Junior, op. cit. P. 183.

(20) Dois estudos históricos dos primórdios de Fortaleza podem ser encontrados em: Raimundo Girão, Pequena História do Ceará (Editora Instituto do Ceará, Fortaleza, 2 edição, 1962), pp. 138-149; e Tristão de Alencar Araripe, História da Província do Ceará: Desde os Tempos Primitivos até 1850, vol. 1 (Editora Instituto do Ceará, Fortaleza, 2a edição anotada, 1958), pp. 150- 153.

(21) Ibidem, p. 152.

(22) Mapa da Villa Nova da Fortaleza de Nossa Senhora da Assunpsão da Capitania do Ciara Grande, que S. Mag.de que Deos guarde foy cervido mandar criar, aproximadamente 1730, AHU-Iria, n2 69.

(23) Carta do Capitão-Mor Manuel Francês ao Rei, de 6 de julho de 1730. Essa carta está inclusa numa coleção de cartas relativas a Fortaleza; recebeu o número 15 no catálogo de Anêmona Xavier de Basto Ferrer, intitulado Segunda Relação de Documentos Existentes no Arquivo Histórico Ultramarino, Respeitantes a Fortalezas, Igrejas e Outros Monumentos Antigos-, Civis, Religiosos e Militares, Construídos pelos Portugueses no Brasil (Lisboa, 1.960). Daqui por diante, essa fonte será citada como Basto Ferrer.
(24) Ver Carta de D. João em resposta a outra do Governador do Maranhão-Pará em que este lembrava a conveniência de se colonizarem. certos pontos extremos da Amazônia com 
casais Açorianos", de 18 de março de 1750. Iii Cortesão, op. cit., pp. 475-476.

(25) Caio Prado Júnior, op. cit., p. 283.

(26) Ver a ordem real de 20 de outubro de 1736 na RIC, vol. IX (1895), p. 356.

(27) Ibidem, p. 357.

(28) Ibidem, p. 358.

(29) Ernâni Silva Bruno, Nordeste, vol.II, op. cit., p. 60.

(30) Raimundo Girão, op. cit., pp. 121-122.

(31) Carta de 1739 na RIC, vol. IX (1895), p. 360.

(32) A exposição que se segue é baseada na Carta Régia recebida por José de Faria, ouvidor-geral, datada de 17 de julho de 1747, ANRJ, Códice 952, vol. 34, fls. 19-20.

(33) A. J. R. Russell-Wood, op. cit.

(34) Isso é constatado no Auto da Criação da vila de Aracaty, de 10 de fevereiro de 1748, RIC, vol. IX (1895), pp. 395-397.

(35) Carta do Chefe de Esquadra Bernardo Manuel de Vasconcelos, tal como citada em Raimundo Girão, op. cit., p. 152.


(36) Carta Régia a Gomes Freire de Andrade de 17 de julho de 1747. ANRJ, Códice, vol. 34, fl.